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OPRESSÕES

OPRESSÕES | Proposta de programa para a plataforma ‘Vamos! Sem Medo de Mudar o Brasil’

Por: Carine Martins, de Belo Horizonte, MG

Somos milhares de mulheres, negras e negros, LGBTs e trabalhadores no Brasil. Apesar de sermos a maioria da população brasileira, amargamos os piores índices econômicos e sociais. A violência contra a mulher no Brasil atinge níveis epidêmicos. O assédio no transporte público lotado e de péssima qualidade é uma triste realidade. As mulheres negras recebem um salário para cada três salários que um homem branco recebe. Nas periferias, os jovens negros são as principais vítimas da guerra às drogas em um verdadeiro genocídio. As LGBTs continuam sendo perseguidas, sem direito ao casamento civil, vítimas da violência homofóbica, o que nos transforma em um dos países que mais mata LGBTs no mundo. As transgêneros têm uma expectativa de vida de apenas 35 anos, são excluídas do mercado de trabalho porque para as empresas a única coisa que importa é o lucro.

 

Os governos nada fazem ou fizeram para melhorar nossas vidas nos últimos anos. Pelo contrário, Temer e seus amigos do PMDB, PSDB e os partidos burgueses, estão aprovando reformas que atacam ainda mais os nossos direitos como a reforma trabalhista que permite o trabalho insalubre às mulheres grávidas, amplia a terceirização, precariza o trabalho, a reforma da previdência, a reforma do ensino médio. Tramitam com o apoio desses políticos propostas reacionárias como escola sem partido, que defende que o respeito às diferenças não deve ser ensinado nas escolas e mais recentemente a ação popular que ocasionou numa decisão liminar que permite tratamento para a “cura gay”.

Precisamos transformar esta realidade! Desta forma nós militantes do #MAIS propomos à plataforma Vamos 10 pontos para um programa verdadeiramente Negro, Feminista e LGBT.

1- MAIS VERBAS PARA APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA E AMPLIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.

Aprovação da lei 11.340, a Lei Maria da Penha, foi um grande avanço para a luta contra a violência às mulheres. Desde 2006 existe uma legislação específica que criminaliza a violência física, psicológica, sexual ou patrimonial, cometida no ambiente doméstico, contra uma mulher (incluindo as Trans). Mas infelizmente após 11 anos da Lei, a condição da mulher ainda está longe de ser resolvida.

Segundo dados dos IPEIA, de 2006 até hoje houve uma queda de apenas 10% no número médio de casos de violência contra a mulher ocorridos em seu local de moradia. Isso ocorre pelo baixo investimento dado a aplicação da Lei. Para se ter uma ideia, aproximadamente 10% dos municípios brasileiros possuem delegacias de mulheres e casa abrigo, para receber adequadamente uma vítima de violência doméstica. Sem assistências e amparo muitas acabam não denunciando seus agressores, e por isso é fundamental lutar por mais verbas para a efetiva aplicação da Lei Maria da Penha.

Mas só isso não basta. Nem toda violência sofrida pelas mulheres ocorre no ambiente doméstico. As ruas, os transportes públicos e até mesmo o local de trabalho ainda são palco de muitos casos de agressão às mulheres. Como nestes casos a Lei Maria da Penha não se aplica, precisamos defender a ampliação de políticas públicas gerais de combate à violência contra a mulher.

2- #TODAS CONTRA A PEC 181. PELO DIREITO DE DECIDIR! EDUCAÇÃO PARA DECIDIR, ANTICONCEPCIONAIS PARA NÃO ABORTAR, ABORTO LEGAL PARA NÃO MORRER!

A PEC 181/2015 – Proposta de emenda Constitucional – que estava discutindo ampliar a licença maternidade para casos de nascimento prematuro foi transformada em uma PEC para atacar o direito ao aborto em caso de estupro, previsto em lei, e garantido gratuitamente no serviço público.

Trata-se de um retrocesso brutal na luta das mulheres. A manobra, chamada cavalo de tróia, foi proposta pelo redator Jorge TADEU Mudalen (DEM – SP) que já havia se posicionado a favor das reformas trabalhistas, da reforma do ensino médio, redução da maioridade penal, assim como diversos outros projetos que atacam os trabalhadores, a juventude pobre e negra e beneficiam grandes empresas. Dezoito homens votaram favoráveis a enviar essa proposta para votação na câmara dos deputados, nenhum deles vai engravidar vítima de um estupro.

Precisamos falar sobre aborto. Estima-se que cerca de 8,7 milhões de brasileiras entre 18 e 49 anos já fizeram aborto (IBGE). A ilegalidade da prática no país não impede sua realização, mas MATA! A cada 2 dias uma mulher morre por complicações no procedimento que ocorre de forma clandestina devido a sua criminalização. Quanto mais precário for o ambiente de realização do aborto, maiores são os riscos de complicações. Por isso as mulheres pobres acabam sendo as mais prejudicadas. Combinando com o fato que a maioria das mulheres que abortam são negras, de baixa escolaridade e bastante concentradas no nordeste, chegamos a conclusão que este também é o perfil das principais vítimas de morte por causa do aborto!

Para garantir a vida das mulheres é preciso defender o direito ao seu próprio corpo! Isso inclui direito a educação para ter condições de decidir, acesso à anticoncepcionais para não engravidar e aborto legal para não morrer!

3- PELO FIM DA POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA RACISTA QUE ENCARCERA E ASSASSINA A JUVENTUDE NEGRA! FIM DA GUERRA AOS POBRES: LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS JÁ! LIBERDADE DEFINITIVA PARA RAFAEL BRAGA!

Cada vez mais se fala que o Brasil é o país da “impunidade”. Mas hoje temos a 4ª maior população carcerária do mundo. Desta, verifica-se que 62% foram privadas de liberdade por situação de roubo, furto e tráfico de drogas. Enquanto isso políticos que roubam milhões de brasileiros, que realizam operações ilícitas, que operam tráfico de drogas, etc, seguem impunes ou com privilégios exclusivos como os que acompanhamos na operação Lava Jato. Rafael Braga, preso em 2013 e condenado por várias acusações sem provas é mais uma de tantas vítimas deste racismo institucional que pune preto e pobre todo dia. Diante disso precisamos defender o fim desta política de segurança pública racista que encarcera e assassina a juventude negra! E ainda, pela inocência e pela libertação definitiva de Rafael Braga!

Quando o assunto é “combate as drogas”, os investimentos já ultrapassaram a casa dos bilhões. Mas o problema é que toda esta politica é extremamente violenta e completamente ineficaz. A produção e o transporte das drogas é algo muito lucrativo, e os traficantes das favelas não são os principais responsáveis por esta etapa do negócio, apesar de continuar sendo o principal alvo da polícia e da mídia. A política de legalização, regulamentação e controle das drogas é combatida e encarada como um tabu social, que na prática esconde interesses econômicos bastante rentáveis.

Infelizmente a tática de combate às drogas é voltada exclusivamente para o ambiente periférico, de maioria negra, configurando uma verdadeira guerra aos pobres e neste sentido entendemos que a legalização das drogas é uma importante bandeira a ser defendida.

4 – DESMILITARIZAÇÃO DA PM! FIM DA TROPA DE CHOQUE!

A Associação direta da segurança pública com o maior número de efetivos policias, treinados para uma intervenção ostensiva é um erro. A polícia militarizada só causam mais violência e mortes, principalmente nos grandes centros urbanos. Muitos problemas da segurança social seriam minimizados se se investisse mais em educação e na redução da desigualdade de renda. Por isso a militarização das polícias não vai resolver o problema, mas manter uma guerra cuja as principais vítimas são, como sabemos, os pobres e negros de periferia.

Por sua vez a tropa de choque tem um papel especial de combater e dispersar motins e são treinados também para operações como reintegração de posse à interesse do estado ou de grandes proprietários. É o setor da polícia que estamos acostumados a ver em atos e manifestações. Age com truculência, fere e em alguns casos mata, em nome da ordem (dos de cima). Desde 2013 circula na internet inúmeras flagrantes de policiais abusando da força seja contra manifestante ou contra população periférica e que ficaram em sua maioria impunes.

Desta forma, entendemos a necessidade de defender a desmilitarização da PM e o fim da tropa de choque, ou seja, sua desvinculação dos moldes militares, aproximando-se do que hoje é a polícia civil. No lugar de treinamento ostensivo um treinamento humanizado e mais próximo da própria população, bem como trazendo mais jus aos julgamentos de indisciplina e crimes cometidos pelos próprios agentes. Sabemos que só isso não traria o fim do racismo, mas seria o começo do combate à ideologia higienista que aprisiona e mata negros em todo país.

5 – COTAS RACIAIS EM TODAS AS UNIVERSIDADES E SERVIÇOS PÚBLICOS!

Ainda é polêmico, mas a implantação das cotas raciais em universidades e serviços públicos precisa continuar avançando. Em 1997 apenas 2,2% de pardos e 1,8% de negros, entre 18 e 24 anos cursavam ou tinham concluído um curso de graduação no Brasil. A Uerj autorizou, no vestibular de 2002 cotas de 20% para negros, o que abriu precedentes para várias outras universidades a fazer o mesmo. O balanço que se tem hoje é que o rendimento dos alunos cotistas é igual ou superior à dos alunos não cotistas e que o percentual de inclusão aumentou bastante, mas ainda é inferior ao número de brancos com ensino superior. Com menos tradição os serviços públicos também avançaram na implementação de cotas e recentemente o STF reconheceu a Lei 12.990 que reserva 20% de cotas para negros no serviço público federal.

Mas apesar dos vários avanços, ainda estamos muito longe de alcançar uma suposta democracia racial. Uma forma bem simples de comprovar isso é comparar renda com cor da pele. Por exemplo numa empresa, quanto maior o posto de trabalho, menor o percentual de negros (que chega a ser zero) em altos cargos gerenciais, de chefia, ou nos gabinetes e reitorias de universidades, etc. Da forma inversa, quanto mais mal remunerada é uma função, como serviços gerais, telefonia, portaria, segurança… maior a quantidade de negros. Como sabemos que isso não tem nada a ver com capacidade dos indivíduos e sim com falta de oportunidade, devido à herança da escravidão, é necessário defendermos cotas como politicas de reparação.

6 – CRIMINALIZAÇÃO DA LGBTFOBIA!

O Brasil é o país que tem maior número de assassinatos de ódio de LGBTs documentados, chegando a um assassinato por dia. As pessoas Trans, que são vítimas de mais de 40% dos assassinatos, são uma minoria de cerca de 1% na população LGBT.  Muitas mulheres lésbicas, bissexuais e homens trans são vítimas de estupros corretivos, na maioria das vezes por familiares, outras vezes por colegas de estudo, trabalho ou estranhos. Conseguir e manter um emprego também é um desafio. Mas não é só a violência física que precisa ser combatida. É muito comum que uma LGBT, em particular pessoa trans, seja dispensada na entrevista de emprego quando revela sua identidade ou orientação. Isso tem que acabar.

É preciso que haja politicas coerentes para combater e toda forma de atos LGTBfóbicos, desde os mais sutis. A Criminalização da LGBTfobia, precisa ser aprovada para ampliar os meios de combate aos casos de crimes de ódio praticados contra os LGBTs.

7 – APROVAÇÃO DA LEI JOÃO NERY, A LEI DE IDENTIDADE DE GÊNERO, JÁ!

Para que haja igualdade no respeito aos direitos das LGBTs, é preciso que suas necessidades específicas sejam atendidas. O governo deve criar meios de educar as pessoas a respeitar o nome social, à identidade de gênero, aos casais e famílias LGBTs, além de garantir o direito ao casamento igualitário e à adoção por parte destes casais. Neste sentido, é preciso defender a aprovação imediata da Lei João Nery, a lei de identidade de gênero, para que pessoas trans possam gratuitamente realizar seu processo de transição pelo sistema público de saúde, sem necessidade de autorização médica, e também alterar seu nome e sexo no registro civil diretamente num cartório, sem burocracia, sem a necessidade de laudo, autorização médica, judicial ou cirurgia para isso.

8 – COTAS PARA PESSOAS TRANS EM TODAS AS UNIVERSIDADES E SERVIÇOS PÚBLICOS. POR PROGRAMAS DE QUALIFICAÇÃO E INSERÇÃO DE PESSOAS TRANS NO MERCADO DE TRABALHO.

Devido ao preconceito e a baixa escolaridade, grande parte das pessoas trans não consegue uma oportunidade no mercado de trabalho. E, mesmo as graduadas e aptas a exercerem uma profissão de alto desempenho, por vezes são recusadas por sua identidade de gênero, o que não deixa outra opção: muitas acabam na prostituição. Segundo a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), mais de 90% de travestis e transexuais vivendo unicamente da prostituição. Isso precisa mudar!

Um programa contra toda forma de opressão não pode deixar de defender cotas para pessoas trans em todas as universidades e serviços públicos. E ainda por programas de qualificação e inserção de pessoas trans no mercado de trabalho!

9 – ESCOLA SEM OPRESSÃO! ABAIXO O ESCOLA SEM PARTIDO! POR DEBATES DE GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E IDENTIDADE DE GÊNERO NAS ESCOLAS!

A educação é um dos bens mais importante para uma sociedade. O olhar crítico sobre as relações sociais, as concepções não preconceituosas entre os indivíduos, podem ser fortalecidas nas escolas. Porém o projeto de lei 193/2016 que inclui entre as diretrizes e bases da educação nacional o programa Escola sem Partido vem na contra-mão desse ideal de educação. Além disso o Escola sem partido tem intuitos machistas e LGBTfóbicos, pois visa impedir o debate franco e aberto sobre orientação sexual e identidade de gênero ao longo do processo educacional infantil com a absurdo argumento de uma suposta “doutrinação gay” sobre as crianças!

De fundo esse projeto é uma forma de educar uma população inteira para a passividade, conformidade diante dos problemas sociais e ataques a nossos direitos. Junto ao fim do Escola sem partido, precisamos também defender mais invertimentos na educação. Só assim será possível avançar realmente na construção de uma educação plural, livre, de qualidade, que acolhe, inclui a comunidade e os profissionais.

10 – SALÁRIO IGUAL PARA TRABALHO IGUAL!

Nas vésperas do dia da Mulher deste ano a Catho soltou o resultado de sua pesquisa que avaliando 8 funções, de estagiários a gerentes, identificou que empresas pagam menos para as mulheres em todos os cargos. A maior diferença é no cargo de consultor, no qual os homens ganham 62,5% a mais do que as mulheres. Para cargos operacionais, a diferença entre os salários chega a 58%, e para especialista graduado é de 51,4%. Completam o ranking: especialista técnico (47,3%), coordenação, gerência e diretoria (46,7%), supervisor e encarregado (28,1%), analista (20,4%), trainee e estagiário (16,4%) e assistente e auxiliar (9%).

A inserção da mulher no mercado de trabalho infelizmente não garantiu a igualdade salarial. Apesar das mulheres terem mais tempo de estudo do que os homens e ter mais diplomas de ensino superior elas recebem menos. 63% das pessoas mais ricas do Brasil são do sexo masculino. Para piorar, a parcela 1% mais rica do país é 72% formada por homens. Por isso ainda em 2017 é preciso lutar por uma antiga bandeira do movimento feminista: salário igual para trabalho igual.