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BRASIL

Lula na Praça da Estação e os desafios da esquerda socialista

30/10/2017- Ato de encerramento da Caravana Lula por Minas Gerais na Praça da Estação, no Centro de Belo Horizonte. Foto: Ricardo Stuckert

Por: Bernardo Lima, de Belo Horizonte, MG

Na última segunda-feira (30), o ex-presidente Lula fez um ato político na Praça da Estação. O comício era o desfecho da caravana de Minas Gerais, que passou por mais de vinte cidades. Milhares de pessoas participaram da manifestação e lotaram a praça. Ainda que não tenha tido o mesmo apelo que sua caravana pelo Nordeste, foi inegavelmente uma demonstração de força de Lula para as eleições de 2018. O ex-líder sindical lidera as pesquisas e, além disso, é capaz de colocar mais gente nas ruas que qualquer um dos seus concorrentes.

Estratégia eleitoral ou retomar as ruas?
O discurso de Lula na Praça da Estação e na caravana mineira estão coerentes com a estratégia traçada pelo PT desde o golpe parlamentar (impeachment), o de jogar todas as fichas numa vitória eleitoral em 2018. O tom do ex-presidente foi sempre de conciliação. Lula chegou a falar em “perdoar os golpistas”, disse ter “paciência” com os inimigos e alegou que não era mais tempo de gritar “Fora Temer”. Ainda que sua presença tenha demonstrado que tem muita capacidade de mobilização, não convocou seus seguidores a derrotarem as reformas da Previdência e Trabalhista, a construir uma greve geral, ou mesmo de participar da manifestação das centrais no dia 10 de novembro. É verdade que, durante a caravana, ele prometeu em uma entrevista realizar um referendo sobre as reformas. Mas, mesmo isso, é uma promessa que passa por manter uma posição passiva agora e esperar as eleições.

A estratégia da direção do PT e de Lula de priorizar as eleições de 2018 pode ser desastrosa. Michel Temer e o Congresso Nacional corrupto estão desfigurando a Constituição de 1988 a toque de caixa, implementando radicalmente todas as contrarreformas estruturais exigidas pelo capital e devem retornar à pauta a Reforma da Previdência que emperrou no primeiro semestre. O Judiciário segue com sua ofensiva, já condenou Lula na primeira instância e não há motivos para acreditar que deixarão Lula se candidatar. Nada parece justificar a ideia de que a melhor saída seja apostar as fichas em 2018, mesmo para os que acreditam que um Lula reeleito revogaria tudo o que Temer fez e faria um governo mais à esquerda que os 13 anos de gestão dos petistas.

Foto: Brasil de Fato

Conciliação ou luta de classes
Lula fez aniversário durante sua caravana por Minas Gerais. A comemoração foi planejada como um aceno ao empresariado. Ele visitou a fábrica têxtil Cotemig, encontrando com Josué Alencar (PMDB), dono da empresa. Ele é filho de José Alencar, vice de Lula em seus dois mandatos, e é cotado por membros da direção do PT a concorrer ao mesmo cargo que o pai em 2018. A estratégia de Lula passa, portanto, não só por atrair o empresariado para sua campanha como também convencer o PMDB, ou uma parte dele, a compor o seu governo.

A esquerda socialista não pode dar apoio a um novo projeto de conciliação. Nossa tarefa passa por convencer as pessoas de que governar com gente como Josué Alencar, e Renan Calheiros, só pode ser feito em detrimento dos interesses dos trabalhadores. Como é possível que esses grandes empresários concordem em apoiar um governo que irá revogar a Reforma Trabalhista que tanto os beneficia? Como é possível que concordem em “inchar”, para usar o linguajar deles, novamente o estado com programas sociais e investimentos em saúde e educação? Não é possível. Os burgueses sabem bem quais são seus interesses e o custo de tentar um acordo com eles será manter, no mínimo, as coisas como estão. Um verdadeiro desastre para a imensa maioria do povo.

A posição da esquerda socialista
Na própria segunda-feira antes da manifestação, a Executiva Estadual do PSOL MG publicou uma nota concisa explicando o porquê não participaria do comício de Lula na Praça da Estação. Achamos que foi uma posição essencialmente correta. Não cabe ao PSOL e aos militantes socialistas apoiarem Lula e seu projeto eleitoral. Nossa estratégia é diferente da direção petista em 2017; pois acreditamos que é necessário mobilizar intensamente a classe trabalhadora desde já; sem trégua no “Fora Temer” e sem ilusões nas instituições. Mas, também para as eleições em 2018, onde acreditamos que é preciso demonstrar ao conjunto dos trabalhadores que existe um projeto de esquerda que acredita nas lutas, que não vai governar com partidos burgueses como o PMDB e que defende um programa anticapitalista que possa realmente resolver os principais problemas dos trabalhadores e do povo.

Mas, não podemos deixar que nossas diferenças com Lula ofusquem sua defesa numa questão importante; ele tem o direito de candidatar-se às eleições do ano que vem. A tentativa do juiz Sérgio Moro de condenar Lula e impedir, sem provas, que se apresente como presidenciável nas eleições é absurda e autoritária. Visa resolver um problema político com uma manobra judicial. É parte da “nova forma de fazer política” que a Globo e a classe dominante querem impor após o golpe parlamentar. E, após impedir o líder das intenções de votos de concorrer, não resta dúvida que os superpoderes do Judiciário se abaterão contra a esquerda de conjunto, utilizando os mesmos mecanismos para colocar fora do jogo qualquer projeto que ameace realmente seus interesses.

Compreender essa questão é fundamental para explicar nosso posicionamento quanto ao comício de segunda-feira. Nós não participamos porque era um ato de apoio ao pré-candidato Lula e seu programa. Era parte de uma demonstração de força política e eleitoral do ex-presidente e seu partido. Nesse tipo de manifestação, não cabe a esquerda socialista.

Muito diferente deve ser nossa postura nos atos de unidade de ação contra as arbitrariedades do Judiciário e dos golpistas. Em uma manifestação em defesa do direito de Lula a se candidatar, faríamos questão de participar de cabeça erguida, mobilizaríamos nossa militância e nossas bases, sem abrir mão do nosso programa e de nossa candidatura independente no ano que vem. O mesmo vale para as manifestações e greves contra Temer e suas reformas, tarefa mais urgente da atual conjuntura. Participamos de todas elas, e continuaremos a participar, em conjunto com todas as centrais e partidos que estão na oposição ao governo golpista.

30/10/2017- Ato de encerramento da Caravana Lula por Minas Gerais na Praça da Estação, no Centro de Belo Horizonte. Foto: Ricardo Stuckert