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EDITORIAL

Eleições argentinas: fortalecimento dos setores neoliberais

 

Por Renato Fernandes, Campinas/SP

Macri discursa na sede de Cambiemos em 2015, após ganhar o segundo turno das eleições presidenciais. Retirado de: http://www.hispantv.com/noticias/argentina/76132/macri-gana-elecciones-presidenciales-argentina-scioli

 

Neste último domingo, 22 de outubro, ocorreram as eleições parciais para o Senado, a Câmara de Deputados nacional e também de algumas províncias e cidades da Argentina. Essa eleição tinha sido precedida pelas PASO de agosto.

As eleições aconteceram no meio de um grande processo de luta democrática: pela aparição de Santiago Maldonado e a punição dos responsáveis. Na última semana, o corpo de Maldonado foi encontrado e reconhecido pela família e pela perícia médica. Apesar de a maioria das pessoas acharem que o Estado tenha sido responsável ou que agiu de maneira ruim no caso, isso não afetou as votações no oficialismo ligado ao presidente Mauricio Macri da coligação Cambiemos.

No momento que estamos escrevendo este artigo, as urnas ainda estão terminando de serem apuradas, apesar de que a maioria dos resultados já são considerados como definitivos. Nacionalmente o grande vitorioso foi Cambiemos com 41,76% dos votos (mais de 10 milhões) que venceu nos cinco principais colégios eleitorais do país. Na oposição peronista, que se dividiu em três coligações, a grande vitoriosa foi a coligação liderada pela ex-presidente Cristina Kirchner com 21,39% (mais de 5 milhões), seguida pelo Partido Justicialista com 14,65% (3,5 milhões) e pela coligação liderada por Sergio Massa com 5,83% (1,4 milhão). A esquerda e a extrema esquerda, unindo todos os votos nas diferentes frentes e candidatos, tiveram uma ótima eleição com 5,57% (1,3 milhões).

Essa vitória do oficialismo consolida as frações políticas mais abertamente neoliberais no controle do país. Nesse sentido, as eleições confirmaram a tendência principal de fortalecimento desses setores na América do Sul. O discurso de vitória do presidente Mauricio Macri foi justamente o da “necessidade de uma ampla coalizão nacional para avançar nas reformas, isto é, para retirar direitos por meio de reformas políticas, tributárias, fiscais, trabalhistas, entre outras, que são muito semelhantes às contrarreformas que estamos passando no Brasil. Com a maioria no legislativo, com a cumplicidade dos setores peronistas e a trégua dada pelas centrais sindicais, a tendência é que Macri avance com seus projetos, ainda que deverá enfrentar uma forte resistência de base, que se expressou, principalmente, nas lutas do primeiro semestre.

Por outro lado, apesar de ter perdido as eleições no Senado para o ex-ministro da Educação de Macri, Esteban Bullrich, por 41,38% a 37,25%, Cristina Kirchner acabou se elegendo na segunda vaga na Província de Buenos Aires. A entrada dela no Senado dá imunidade parlamentar e foro privilegiado para a ex-presidente, assim como a coloca como a principal figura da oposição e candidata a presidente de um movimento peronista altamente dividido.

Esse fortalecimento de Macri deve ser visto com bastante receio pela esquerda e pelos trabalhadores, já que sua vitória servirá para reforçar a ofensiva. Será necessário a mais ampla unidade para impor as centrais sindicais a resistência e o combate ao governo e a suas contrarreformas sociais.

 

Uma grande eleição da Frente de Izquierda y de los Trabajadores (FIT)

 

No marco desse avanço das frações políticas mais neoliberais, a esquerda realizou uma boa eleição. Porém temos que destacar a eleição da FIT. Com um crescimento de cerca de 40% em relação as PASO, a FIT obteve pouco mais de 1,2 milhões de votos (o restante da esquerda obteve cerca de 150 mil) e se demonstrou como a principal força entre a esquerda e a extrema esquerda do país. Com esses resultados, conseguiram alcançar, até o momento, a eleição de dois deputados nacionais, além de dois eleitos para a Legislatura da Cidade de Buenos Aires e alguns eleitos em diversas outras províncias e cidades.

Foram diversos resultados expressivos para a FIT. Na província de Jujuy, por exemplo, foram a segunda força política com 18,34% (quase 60 mil votos) e vão eleger entre 4 a 5 deputados provinciais. Em Mendoza, obtiveram mais de 125 mil votos (11,72%), porém não conseguiram renovar o mandato de deputado nacional que tinham. Na Cidade de Buenos Aires, onde elegeram dois deputados para a Legislatura local, obtiveram cerca de 131 mil votos (6,87%). Apesar desses resultados positivos, a FIT poderá perder uma representação na Câmara de Deputados (atualmente tem 4), pois em Salta não conseguiram reeleger-se, apesar de terem 7,84% (53 mil) dos votos.

O voto de esquerda se concentrou massivamente na FIT e a Izquierda al Frente por el Socialismo, composta pelo MST e o Nuevo MAS, obteve resultados não tão bons e acabaram ficando abaixo do necessário para eleger deputados nacionais ou provinciais.

Esses resultados da FIT demonstram a diferença e a importância que têm a unidade da esquerda socialista e combativa nas eleições. Assim como a possibilidade de que uma esquerda com uma política de independência de classe possa crescer e se fortalecer como alternativa. Como afirmamos em outros artigos, consideramos que a unidade entre todas as frentes desta esquerda, com um programa político de independência de classe e de luta pelo socialismo, seria a melhor política para os revolucionários, pois poderia colocar em outro patamar a disputa com a fragmentação que vive o peronismo. Um pequeno exemplo vem da Cidade de Buenos Aires. Luiz Zamora, cuja organização Autodeterminação e Liberdade se concentra ao redor de sua trajetória como parlamentar combativo, obteve 4,3% dos votos, ao passo que a FIT chegou a 5,8%. Os seus mais de 190 mil votos, se somados, poderiam ter conseguido eleger 1 deputado, mas separados não elegeram nenhum.