Pular para o conteúdo
EDITORIAL

A força e a crise do lulismo 

Editorial de 20 de outubro,

Resiliência, em sentido figurado, é a capacidade de superar, de recuperar de adversidades. Em termos físicos, é a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica.

Observando por esse prisma, a capacidade de recuperação de Lula é notável. Apesar da abertura de inúmeros processos criminais e da condenação em primeira instância por Moro, mesmo com os violentos ataques da grande mídia e a campanha de difamação permanente da direita, o ex-metalúrgico se mantém como a principal liderança popular do país.

A um ano da eleição de 2018, o ex-presidente está à frente na corrida presidencial, com expressiva vantagem sobre os principais adversários. O petista tem pelo menos 35% das intenções de voto nos cenários testados, de acordo com a última pesquisa Datafolha. Venceria, inclusive, no segundo turno.

O índice de rejeição do ex-presidente é bastante alto (42%), mas vem numa trajetória de queda – em março de 2016, a taxa de desaprovação do petista era de 57%. Em realidade, há um quadro de polarização em torno de sua figura. Enquanto cerca de metade da população prefere que o petista retorne à presidência, a outra metade deseja vê-lo atrás das grades.

Assim, o destino político de Lula revela-se com um fator determinante no cenário político nacional.

O que explica a recuperação de Lula? 

A vida do povo trabalhador piorou muito no último período. Os salários caíram, o desemprego disparou e o consumo da famílias desabou. O acesso e a qualidade dos serviços públicos – saúde, educação, transporte público etc. –  deterioraram sensivelmente. A violência urbana alcançou patamares inacreditáveis, vitimando particularmente a população pobre e negra. Com tudo isso, a desigualdade social e a pobreza aumentaram dramaticamente.

Ao quadro de aguda crise social e econômica se somaram a retirada de direitos sociais e os cortes brutais das verbas destinadas às áreas sociais.

Diante desse furação reacionário e da ausência de uma nova alternativa pela esquerda, os olhos se voltaram ao passado. Os trabalhadores começaram a comparar a situação atual com os tempos dos governos Lula,  momento em que a vida havia melhorado. A conclusão, para muita gente do povo, é a seguinte: “ainda que Lula seja corrupto, melhor com ele porque se preocupa com os mais pobres”.

Por outro lado, há um aumento na percepção de que existe uma perseguição em curso. Enquanto Aécio Neves é protegido pelo sistema, Temer se mantém no governo e Alckmin segue blindado, Lula recebe uma implacável ofensiva judicial. Frente a isso, muitos se perguntam: “se todos roubam, por que querem pegar só o Lula?”.

Excluir Lula das próximas eleições faz parte do golpe

A imposição de um governo ilegítimo, com condições de realizar a pilhagem de direitos sociais sem depender de respaldo popular, foi o objetivo principal do golpe parlamentar que levou Michel Temer (PMDB) à presidência.

A continuidade do golpe requer, por consequência, a eleição de um novo governo submetido a esse programa de espoliação. Nesse sentido, a eleição de Lula não é conveniente à burguesia neste momento, uma vez que o petista subiria a rampa do Planalto em base à expectativa popular de reversão do panorama atual.

A classe dominante sabe que Lula não contrariaria seus interesses fundamentais se fosse eleito novamente, afinal, os governos petistas garantiram um patamar de enriquecimento aos grandes empresários e banqueiros como nunca antes na história do país. Mas o pacto conciliatório inscrito no lulismo, as pequenas concessões sociais combinadas com a preservação da estrutura de dominação burguesa, não é desejável à classe dominante agora, que prefere um governo “puro sangue” para dar prosseguimento ao extermínio de direitos. No atual contexto econômico, não é mais possível a política do “ganha-ganha”, os capitalistas querem o bolo inteiro.

Lula e a resistência dos trabalhadores

A direção do PT atua quase que exclusivamente para garantir a candidatura de Lula em 2018, que se encontra ameaçada pela provável condenação em segunda instância do ex-presidente.

Ao invés de jogar esforços na mobilização social para derrotar Temer e as reformas, a cúpula petista se concentra nos mesquinhos cálculos eleitorais. As negociatas em que está engajada incluem, por exemplo, a costura de acordos com antigos aliados da direta, como Renan Calheiros, José Sarney, Kátia Abreu, entre outros.

O objetivo, portanto, não é impedir as reformas com a luta dos trabalhadores, mas sim deixar Temer se desgastar mais e mais para, assim, impulsionar a candidatura de Lula junto ao povo.

A luta pela preservação dos direitos sociais não pode esperar as próximas eleições. Até lá, boa parte das conquistas históricas dos trabalhadores terá desaparecido. São as condições de vida do povo trabalhador que estão em jogo. Nesse sentido, é necessário que o conjunto dos movimentos sociais e da esquerda cobrem de Lula e do PT o compromisso com a luta efetiva hoje, para que coloquem seu peso político e social a serviço da resistência. Nas ruas, podemos vencer o golpe!

A importância de uma nova alternativa de esquerda 

O lulismo é incapaz de oferecer sentido de futuro. Não há qualquer perspectiva transformadora em seu programa. Lula recobra força perante a devastação do presente. Sobrevive pelo medo, não mais pela esperança que evocou um dia. O pacto conciliatório com a burguesia foi soterrado pelo golpe, mas o PT insiste em tentar ressuscitar a aliança que nos levou à tragédia Temer.

É tempo de apresentar uma nova alternativa de esquerda, ainda que esta seja muito minoritária por ora. É hora de apostar no futuro, de relançar o sentido de transformação perdido. Uma candidatura radical, nascida das lutas do povo, sem medo de confrontar os poderosos, abrirá uma ponte para o amanhã. Reconstruir os laços com a classe trabalhadora e os mais oprimidos, encantar novamente a juventude com o sonho da mudança socialista. A aposta da esquerda radical nas próximas eleições deve ser, em nossa opinião, norteada por esta estratégia.

Nesse sentido, consideramos fundamental o lançamento de uma candidatura pelo PSOL. Uma candidatura que seja abraçada e conduzida por uma frente formada pelos movimentos sociais (MTST, Povo Sem Medo), outros partidos e organizações de esquerda (PCB, PSTU), os sindicatos combativos (CSP-Conlutas, Intersindicais), os artistas, os milhares de ativistas de esquerda independentes etc. Vamos por uma nova esquerda, de luta e socialista!