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Chavismo vence as eleições regionais na Venezuela. E agora?

Paulo Aguena "Catatau", de São Paulo, SP

No domingo, 15 de outubro, ocorreram eleições para governadores nos 23 estados venezuelanos, menos o Distrito Capital. O chavismo e o Polo patriótico – uma frente que além do PSUV está o PCV, PPT, etc. –   venceram em 18 estados, obtendo 54% dos votos. A MUD, uma frente opositora de direita, venceu em 5 estados, totalizando 45% dos votos. A polarização foi imensa. Todas as demais alternativas, à esquerda e à direita, tiveram juntas, quando muito, 2% dos votos.

O chavismo ganhou nos três estados governados pela oposição, mas perdeu em cinco em que governava. A derrota que o oficialismo sofreu em Zulia e Táchira, estados fronteiriços com Colômbia, foi grave. Mas tiraram das mãos da direita o estado de Miranda – governado por Capriles, líder simbólico da oposição – e Lara. Além disso, derrotou a oposição em seu maior bastião, Carabobo.

Com 11 milhões de votantes, a abstenção foi de 39%. Embora alta, foi a menor de todas as quatro eleições para governadores realizadas sob o chavismo. Esse quadro configura uma derrota da MUD e de Trump. Trata-se também de uma importante recuperação do chavismo, quando há um ano a previsão era que ganharia em apenas 5 dos 23 estados.

O que ocorreu?

O resultado eleitoral expressou a mudança na relação de forças após meses de uma brutal ofensiva da direita. O jogo virou a partir das eleições para a Assembleia Nacional Constituinte (ANC), realizadas em 30 de julho. Apesar do violento boicote da direita – locaute, paralisação dos transportes, cortes de vias através de barricadas (“guarimbas”), etc. -, o fato é que 8 milhões venezuelanos se mobilizaram para chegar às urnas e eleger seus representantes. A Constituinte foi instalada e as guarimbas, derrotadas. Dividida, à MUD só restou participar das atuais eleições regionais.

Muitos analistas, tanto de esquerda quanto de direita, influenciados por fontes de informações das agências internacionais como a Reuters, EFE, etc., ficaram desconcertados diante do resultado. A alguns só resta fazer eco à costumeira campanha de uma parcela da oposição – dessa vez, sequer de toda – de que houve fraude. Não por acaso, os EUA já declararam uma vez mais que as eleições não foram “livres” nem “justas”.

De fato, considerando o aumento do cerco imperialista, a brutal crise econômica que assola o país com uma hiperinflação que na semana anterior às eleições, bateu na casa de 1.500% anualizados; uma especulação cambial que na mesma semana elevou o dólar no paralelo sustentado desde Miami (dólar today) a 25 mil bolívares; considerando tudo isso, a mudança da relação de forças e a própria vitória do chavismo parece um milagre.

Na verdade, são análises superficiais que subestimam a profundidade do processo revolucionário venezuelano. Ela tem suas raízes mais remotas e profundas na vitoriosa guerra da independência liderada por Simon Bolívar (1810-1823), na qual, diga-se de passagem, morreu metade da população. Elas se desenvolveram ao longo da história das lutas de classes no país, cujo último período esteve marcado pela rebelião popular de 89 (Caracazo), pela derrota do golpe da direita que tentou depor Chávez (2002) e, por fim, pela derrota do locaute patronal encabeçado pela antiga direção da PDVSA (2002-2003). Por isso, apesar das imensas dificuldades e sacrifícios, as massas operárias e populares, verdadeiros protagonistas desse processo, demonstraram uma vez mais que não estão dispostas a abrir mãos de suas conquistas e depositam sua esperança em encontrar uma saída socialista para crise.

Encruzilhada

Apesar de ainda gozar da confiança da maioria dos setores mais organizados e combativos da população, existe um enorme descontentamento das bases com os dirigentes chavistas. Não é à toa.

O processo revolucionário permitiu que a Venezuela se tornasse um país politicamente muito mais independente do imperialismo. Entretanto, passados 19 anos, o chavismo não foi capaz de romper com o modelo econômico dependente da renda petrolífera. O país seguiu importando praticamente tudo, ao mesmo tempo em que uma nova burocracia estatal (boliburguesia) desvia uma parte da renda nacional em proveito próprio. Esse modelo pôde se sustentar enquanto o preço do petróleo estava em alta. A queda trouxe seu colapso.

Existe o risco de que o triunfo do chavismo no último dia 15 se transforme em bebedeira eleitoral. Afinal, é a vigésima eleição que o chavismo vence nas 22 ocorridas desde que Chávez chegou ao poder há 19 anos. Mas agora a situação é diferente. Existe um esgotamento do modelo político e econômico chavista. O imperialismo sabe disso, por isso, sua ofensiva, a começar pela guerra econômica, tende a se intensificar. Não haverá paz. Assim, a verdade nua e crua é que o país se encontra numa encruzilhada: ou o processo revolucionário avança de forma decidida rumo ao socialismo ou será derrotado.

O movimento operário e popular, que enfrenta de forma heroica a desesperadora guerra econômica, tem essa intuição. Por isso, exige que o governo abandone os discursos, puna os corruptos e adote urgentemente medidas radicais contra o capital e a direita. O governo e a Constituinte se encontram agora mais do que nunca sob essa justa pressão.  

Um modelo verdadeiramente socialista

A Constituinte é uma oportunidade quase única para tomar essas medidas, substituindo o modelo econômico capitalista dependente da renda petrolífera e das importações por um modelo verdadeiramente socialista. Para isso, ao invés de buscar o controle do mercado através de uma economia mista, o Estado deve concentrar em suas mãos os principais meios de produção e, sob a direção democrática dos trabalhadores, passar à planificação de toda a economia. Somente assim, se poderá construir um parque industrial que alavanque a produção nacional e estruturar uma produção agropecuária com o objetivo de alcançar a soberania alimentar.

Avançar na expropriação das empresas, colocando-as sob controle dos trabalhadores; garantir uma PDVSA 100% estatal que coloque um fim às empresas mistas entre o Estado (51%) e capital estrangeiro (49%); suspender o pagamento da dívida externa e aplicar o montante como parte de um plano de investimentos maciços para reverter o processo de desindustrialização; avançar no controle dos preços através do controle da distribuição por parte do Estado; expropriar os grandes grupos atacadistas como medida de emergência para garantir a oferta de produtos; instituir o monopólio estatal do comércio exterior de forma a proteger os interesses do país e atender às necessidades dos trabalhadores; centralizar e estatizar o conjunto do sistema financeiro, adotando uma rígida política monetária e cambial; instaurar um Governo dos Trabalhadores por meio de um organismo que exerça as funções legislativas e executivas,  em âmbito nacional, estadual e local, a partir de representantes eleitos nos locais de trabalho e nos bairros. Eis alguns dos principais pontos programáticos colocados na ordem do dia para esquerda revolucionária defender junto à Assembleia Nacional Constituinte e às massas venezuelanas. A situação exige firmeza. Definitivamente, não se pode dar mais voltas.

Foto: Guilherme imbassahy – jornalistas livres

Mapa do resultado eleitoral