Editorial 22 de junho
Esse era o desafio da Esfinge de Tebas. Ela eliminava aqueles que se mostrassem incapazes de responder a um enigma: “Que criatura tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três à tarde?”. Todos os que ensaiaram a resposta haviam sido estrangulados. Édipo acertou: “É o ser humano! Engatinha quando bebê, anda sobre dois pés quando adulto e recorre a uma bengala na velhice”. Existe uma Esfinge de Tebas simbólica a assombrar o futuro do povo trabalhador brasileiro. Teremos um Édipo? Quem o será?
O enigma da sustentação do governo
Como se mantém no cargo o presidente mais odiado da história democrática do Brasil, que chegou a esse posto por meio de um golpe parlamentar, cujos esquemas de corrupção estão gravados em áudios publicados por toda a imprensa há mais de um mês e que está liderando os maiores ataques aos direitos sociais e políticos conquistados pelo povo trabalhador ao longo de décadas? O impasse brasileiro tem sonoridade de enigma. Quem irá decifrá-lo?
O desenvolvimento da crise brasileira parece sem fim. Já são mais de 14 milhões de desempregados. Entre os jovens essa taxa é de 28,7%. A cada dia, novos fatos, sejam do desenvolvimento do drama econômico, ou político.
O impasse brasileiro parecia não ter ponto de curva desde o golpe parlamentar contra o povo trabalhador, passando pelas eleições municipais que fortaleceram os setores tradicionais e novos da direita e a aprovação sem dificuldade da concordata de direitos sociais por vinte anos, conforme a PEC do Teto, até a greve geral do dia 28 de abril e até surgir a figura dos irmãos Batista, Wesley e Joesley.
A entrada em cena da luta organizada da classe trabalhadora foi o elemento decisivo para impedir o avanço da reforma da Previdência, o que já complicou as coisas para o lado do governo. Depois, com as denúncias de Joesley Batista divulgadas no dia 17 e a publicação dos áudios no dia 18. uma esperança rondou a esquerda e o povo trabalhador: “agora ele cai”, esperavam.
Passado pouco mais de um mês desde esse último grande fato, Temer segue sendo o presidente ilegítimo do Brasil. A opinião pública, tão importante enquanto argumento para a aprovação do impeachment de Dilma, hoje é desprezada pela base de sustentação do governo, o que demostra o caráter anti-trabalhador do golpe.
Contudo, a possibilidade do fim de Temer segue vigente. Essa “carreta sem rodas” que se tornou o governo precisa ser confrontada pela força das lutas dos trabalhadores. Só com a mobilização dos de baixo para resolver a “indecisão” dos de cima. A única resposta possível para decifrar o enigma da sustentação do governo é o avanço da luta de classes. A batalha entre capital e trabalho será o definidor do processo. Pois Temer não foi posto pela classe dominante no Planalto para ser um presidente querido pelas massas trabalhadoras, nem mesmo para seguir um mandato de normalidade, ou estabilidade política.
A burguesia o fez com o único propósito: aprovar as contra-reformas e abrir caminho para um novo governo burguês em 2018. Portanto, não está nos planos iniciais do acordo burguês uma substituição do governo sem terminar o mandato, muito menos por vias de eleição direta. Contudo, o matrimônio é com as reformas, são elas que a Esfinge de Tebas tropical guarda.
Hoje, no STF, será definida a validade da delação de Joesley Batista. A manutenção dessa decisão poderá ser chave para o desenvolvimento da crise do governo, reduzindo ainda mais o oxigênio no Palácio do Jaburu.
…ou te devoro com as reformas
O cenário é dramático. Depois da aprovação da PEC do Teto, as reformas da Previdência e Trabalhista seriam a pá de cal sobre os direitos sociais da classe trabalhadora brasileira.
O desprezo das elites brasileiras com os trabalhadores não é de hoje. Isso tem origem no nefasto legado dos quase 400 anos de escravidão no Brasil, o último país das Américas a abolir esse sistema. Apesar de aspectos de formalidade, foram muitas as resistências dos escravagistas à abolição, recorrendo ao argumento de que isso acabaria com a economia do Brasil. Esse pensamento seguiu tendo forte presença durante toda a República Velha, sendo parte do DNA da elite industrial paulista. Essa foi totalmente contra uma legislação garantista. Além do argumento de que geraria custos adicionais à produção, foi comum o argumento de que a concessão de direitos trabalhistas tornaria a classe trabalhadora brasileira “indolente e insubordinada”.
Hoje, os argumentos para a necessidade das reformas vão no mesmo sentido. “Só com a Reforma Trabalhista para reduzir o desemprego”. Também: “Ou aprova uma reforma ou a Previdência vai quebrar”. Mas sabemos que, além disso, o que consta no sentido desses ataques é impor uma derrota histórica sobre a classe trabalhadora. O objetivo é nos humilhar e desmoralizar para que não levantemos mais. Querem inverter o espírito das jornadas de Junho, quando milhões saíram às ruas por direitos.
O recuo no calendário da aprovação da Reforma da Previdência e a derrota sofrida pelo governo no último dia 20 na Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS) devem servir para encorajar os trabalhadores. O grande trunfo desse governo sustentado por cima é sua maioria no Congresso Nacional. Contudo, esse também vive dias de insalubridade.
O grande conflito entre frações da burguesia tem feito baixas e instaurado o pânico em alguns setores do Congresso por meio da operação Lava Jato. Para muitos, a manutenção do mandato parlamentar é a única chance de sobrevivência. Apesar de Temer não se preocupar em ser odiado, esse título para alguns pode ser um passaporte para o xilindró. Isso tem feito fissuras na base do próprio governo.
Por ora, o calendário de aprovação da Reforma Trabalhista está mantido e o mais provável é que assim permaneça. Contudo, a decisão de hoje no STF e, principalmente, a realização da Greve Geral no dia 30 podem ser fatores de impacto. Não podemos perder de vista que a arena em que a batalha se decidirá será nas ruas, greves, ocupações, na ação direta.
Greve Geral, o Édipo dos nossos dias
Para decifrar esse enigma que ameaça o futuro do Brasil é necessário um passo à frente nas lutas do povo trabalhador. A greve geral marcada para o dia 30 de junho não está garantida, é preciso construí-la pela base. Para isso, não pode haver vacilações das centrais sindicais e todos os movimentos sociais devem ser aliados.
A história recente no Brasil mostrou uma apatia e adaptação das centrais sindicais, bem como dos sindicatos. A greve geral do dia 28 de abril e a ocupação de Brasília no dia 24 de maio mostravam que a tarefa dos trabalhadores de sacudir suas centrais e sindicatos é possível e necessária. Devemos, mais uma vez, nos utilizar desses que são os mais tradicionais e importantes patrimônios das lutas sociais no mundo.
Portanto, as centrais sindicais, os movimentos sociais do campo e da cidade, os movimentos políticos das pessoas oprimidas e da juventude têm o futuro do Brasil em suas mãos. Tod@s à construção da Greve Geral do dia 30!
Comentários