Por: Maurício Moreira, de Natal, RN
Leonardo Sinedino é professor da Rede Pública do Rio Grande do Norte, militante do MAIS e atuante na causa antiproibicionista e da mobilidade urbana. Em 2016, participou da fundação do Com.cannabis, coletivo que reúne quatro amigos que buscam fomentar o tema da regulamentação da maconha, e que esse ano foi responsável pela construção do I Fórum Delta 9 para discutir esse assunto. O evento foi realizado na cidade do Natal, no dia 10 de junho e contou com palestrantes de referência no tema, além da participação de mais de 200 pessoas. O Esquerda Online conversou com Leonardo sobre o evento e os assuntos correlatos, como a política proibicionista em vigor no Brasil.
EO – Há aproximadamente 100 anos o Brasil adota uma política proibicionista para alguns tipos de Drogas. Qual o resultado disso?
Leonardo – Resulta numa política higienista, de guerra e encarceramento aos negros e pobres, inimiga do usuário de drogas, do morador da periferia, do policial e do pequeno traficante, beneficiando apenas a alta burguesia, representada pelos banqueiros, que lavam o dinheiro do tráfico, da indústria bélica que fornece o armamento para o conflito, e da indústria farmacêutica, que lucra vendendo medicamentos, que poderiam ser plantados em casa por qualquer pessoa.
EO – Há alguns anos o tema da legalização das Drogas era um tabu no país. Os defensores da legalização viviam uma situação de quase isolamento. Nos últimos anos, vemos que o debate ganhou as ruas, praças e locais de trabalho e moradia. A cada dia cresce o número de pessoas que questionam os resultados da política proibicionista e as Marchas da Maconha ganharam força em muitos lugares. Qual a causa dessa mudança?
Leonardo – Houve um avanço no entendimento de que a política de repressão às drogas falhou completamente, uma vez que o consumo de entorpecentes e a violência em torno do mercado não param de crescer. Além disso, com o avanço da ciência e dos debates já realizados, foi possível perceber que as ricas propriedades medicinais da maconha, que combatem uma gama ampla de problemas de saúde, são vetadas à população em função da atual política de combate às drogas.
EO – Em que estágio se encontra o movimento antiproibicionista no país?
Leonardo – Num estágio avançado, e em crescente. Consegue fomentar o debate na sociedade, e reunir setores amplos para levantar a bandeira do antiproibicionismo.
EO – E no Rio Grande do Norte?
Leonardo – Após as primeiras marchas, que foram grandes e repercutiram positivamente, ocorreu um refluxo, que vem resultando num esvaziamento nos últimos três anos. Entretanto, há um entendimento das causas e do que deve ser feito daqui para a frente para rearticular o movimento e realizar grandes marchas novamente.
EO – Partiu dessa constatação a ideia de realizar o Fórum Delta 9?
Leonardo – Sim, apesar de ocorrer anualmente o Ciclo de Debates Antiproibicionistas na UFRN, entendemos que era necessário abrir uma nova trincheira. A professora Leilane Assunção, que organiza o ciclo de debates, esteve presente para debater no Fórum, e sua palestra, que fez um resgate da atuação do movimento antiproibicionista, numa esfera local e nacional, ajudou a gerar um entendimento dos desafios postos ao movimento daqui pra frente.
EO – Como foi o formato do evento? Que debates e convidados estiveram presentes?
Leonardo – O Fórum foi dividido em dois turnos de palestras. Pela manhã, o debate foi voltado para a perspectiva medicinal, e estiveram presentes Júlio Américo, diretor da Liga Canábica, uma entidade da Paraíba que recebeu autorização judicial para cultivar e medicar pessoas com maconha; Pedro Melo, neuropata que prescreve maconha para o tratamento da dor; Virgínia Martins, professora de Toxicologia da UFRJ que vem desenvolvendo o que será o primeiro medicamento brasileiro à base de maconha, e Sidarta Ribeiro, neurocientista diretor do Instituto do Cérebro, que abordou a relação da maconha com o cérebro humano.
Pela tarde, o enfoque foi mais o lado social, e os debates foram retomados com Ruy Rocha, professor do DECOM da UFRN, que discutiu a abordagem dos meios de comunicação sobre as questões relativas à política de drogas; em seguida a professora da UFRN Leilane Assunção, fez um resgate da trajetória do movimento antiproibicionista Brasileiro e do Estado do Rio Grande do Norte.
Por fim, iríamos concluir o fórum com a participação do professor de direito Fillipe Azevedo e do advogado criminalista Gabriel bulhões, para abordar o impacto da atual política de drogas no sistema carcerário, e as perspectivas que se vislumbram com a mudança na lei, entretanto, Gabriel Bulhões teve que dar assistência jurídica aos cultivadores de maconha presos no dia anterior. Dessa forma, Gabriel Bulhões foi substituído pelo também advogado criminal Rodrigo Martins.
EO – Que avaliação vocês fazem do evento?
Leonardo – Muito positiva, pois alcançou os nossos objetivos de ter uma boa e impactante repercussão, e de fomentar um debate de alto nível, para um público expressivo. Além disso, abriu caminho para novas iniciativas.
Que contribuição a esquerda radical e socialista pode dar às lutas antiproibicionistas no Brasil?
Trabalho de base. De forma até natural, estamos voltando todos os nossos esforços para derrotar o governo ilegítimo do Michel Temer, mas é importante que outras bandeiras continuem hasteadas, e o antiproibicionismo é uma delas. É fundamental seguir fomentando o debate com e para as bases, e contribuindo de forma decisiva para que as Marchas sigam crescendo. Em Natal, temos o desafio de rearticular o movimento e fazer com que a Marcha da Maconha volte a crescer e impactar a cidade.
Foto: Georgia Army National Guard photo by Maj. Will Cox/Released)
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