Por: Bruno Alves, de São Paulo, SP
Na greve geral de 28 de abril de 2017 ocorreram casos de presos políticos, proibição do Direito de greve, manifestações pacíficas encerradas com bombas e manifestantes agredidos violentamente. Há uma ameaça à democracia.
O avanço do Direito de Greve é proporcional ao nível de civilização e democracia do Estado. No início do século XX a greve ainda era tratada expressamente como crime. Então as manifestações ocorriam diretamente contra o Estado. Entretanto, mesmo assim, a força de mobilização dos trabalhadores conseguiu impor conquistas. Como foi o caso da Greve Geral de 1917, que conquistou a jornada de 8 horas diárias.
A história da Democracia no Brasil não é linear ou contínua. Tem avanços e retrocessos. Após o Golpe de 1964 houve um retrocesso de vários direitos trabalhistas, como por exemplo a estabilidade no emprego. Muitos não sabem, mas já houve estabilidade no emprego no Brasil. Foi necessária uma sanguinária ditadura para arrancar este Direito.
As greves operárias dos metalúrgicos do ABC foram declaradas ilegais pelo Poder Judiciário. Mas mesmo assim foram mantidas. Foi em decorrência disto que as direções da greve, inclusive Lula, foram presas, e mesmo assim os operários mantiveram a luta firme. Em decorrência das greves do ABC do fim dos anos de 1970 e início de 1980 a Ditadura ruiu. A Constituição de 1988 expressa, ainda que de forma distorcida, todas as lutas deste período. Inclusive o Direito de Greve.
O fato é que após o Golpe parlamentar de 2016 o Poder Judiciário passou à assumir um maior protagonismo político nacional. De modo que o Direito de Greve e manifestações passou a ser sistematicamente ameaçado pelas decisões do Poder Judiciário. Embaixo das togas se escondem reluzentes coturnos.
Quando o Judiciário determina que a categoria de Correios deve garantir 80% do efetivo, está na prática negando o Direito de greve. A Lei de Greve determina que nos serviços “essenciais” deveria se garantir um efetivo de 30%. Entretanto, o Judiciário impõe percentuais cada vez maiores. Aos metroviários já foi imposto garantir 100%. Ou quando determinam o corte dos salários dos servidores grevistas. Ou seja, os magistrados impõem mais rigores do que o que está previsto na Lei.
Por outro lado, há uma relação complacente com todos os abusos policiais. Mesmo as violências desproporcionais realizadas pela PM de SP, que deram causa ao junho de 2013, não foram punidas. Os comandantes da PM responsáveis por ações de flagrante violência policial não foram punidos. Ao contrário, o Tribunal de Justiça de São Paulo inocentou o Estado por arrancar o olho de um jornalista. Desta forma os juízes abrem as portas para toda a forma de violência. O que resultou no Rio de Janeiro em uma manifestação pacífica atacada violentamente, com granadas de gás químico jogadas no palco. Como em Goiás um jovem foi violentamente agredido, estando internado em estado grave. Quando uma manifestação pacífica é encerrada com violência, como foi no Rio no dia 28 de abril de 2017, quem sofre a violência é o conjunto da democracia.
Em paralelo a tudo isto, com a “Teoria do domínio do fato” (usada de forma distorcida diga-se de passagem), os policiais prendem por que querem. Como diz com cinismo um Capitão de Brasília, “eu fiz por que eu quis”. Os procuradores acusam sem provas, só com “convicção”. Nesta toada os Juízes poderiam condenar simplesmente por que desejam condenar. Como é o caso de Rafael Braga. Condenado sem provas.
Desta forma o Poder Judiciário encontra-se cada vez mais longe de garantir “Justiça”. Sendo mais um dos poderes de um Estado burguês. Tudo isso vai indicando uma inflexão bonapartista do regime democrático burguês. Ou seja, o Poder Judiciário assume um protagonismo no papel de tornar o regime mais rígido. O autoritarismo reveste sua legitimidade em togas. Mas com isso vários direitos coletivos são destruídos. A grande questão passa a ser se o Poder Judiciário está disposto a retirar toda a legitimidade do Estado. Ao permitir que o Estado se torne mais autoritário o Judiciário é conivente com a perda de legitimidade democrática do mesmo Estado. O que fatalmente abre espaço para reações de todos os tipos.
De forma mais direta há uma brutal elevação da exploração da mais-valia, com as reformas trabalhista e da previdência. Entretanto, outros Direitos coletivos também estão sendo cerceados. Tais como o direito à manifestação e direito de greve. Em última análise o próprio direito ao voto foi violado quando assume o governo um governo ilegítimo.
Ainda não estamos numa Ditadura. Entretanto, os movimentos praticados pelo governo e pelo Poder Judiciário tornam a Democracia cada vez menos democrática. Por outro lado, o que realmente pode resgatar a democracia é o povo na rua. Somente a classe trabalhadora em movimento pode defender as conquistas democráticas. Movimentos como a Greve Geral, de 28 de abril de 2017, são passos decisivos. Foi o junho de 2013 que criou as condições para o STF proibir o financiamento eleitoral por empresas. Desta mesma forma apenas grandes lutas podem vir a impedir tais retrocessos.
John Locke no seu Segundo Tratado Sobre os Governos, no parágrafo 220: “(…) os homens jamais estarão ao abrigo da tirania se não tiverem os meios de escapar antes que ela os tenha dominado completamente. Por isso não somente têm o direito de sair dela, mas de impedi-la.” Portanto, na medida em que o governo perde sua legitimidade, na mesma proporção que garantias fundamentais são ameaçadas, toda a resistência popular passa a ser um dever do povo. O Direito de Greve, o direito de manifestação, o direito ao voto, são direitos consagrados nas Leis. Entretanto a Lei só é um pedaço de papel, como diria Lassale. O Judiciário não pode ser conivente com a perda de legitimidade democrática do Estado, sob pena de se tornar conivente com a própria tirania. Cabe ao povo impor, por sua força e legitimidade, a Democracia. O Direito ao Poder é um direito inalienável do povo.
Foto: Carol Burgos | Esquerda Online
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