Por: Carine Martins, de Belo Horizonte, MG
Lançado no Brasil em fevereiro deste ano, o livro Histórias de Ninar para Garotas Rebeldes reúne pequenas narrativas na forma de fábulas que descrevem os grandes feitos de 100 mulheres da nossa história. Buscando ser uma obra “antiprincesas” foi escrito pelas italianas Elena Favilli e Francesca Cavallo, contando ainda com a contribuição de 60 mulheres artistas do mundo todo nas ilustrações.
Indicado para várias idades, as narrativas em sua maioria começam com um “Era uma vez uma criança que sonhava em ser…” e finaliza com a grande mulher que essa garotinha se tornou. São mulheres reais que se destacaram no esporte, na arte, na ciência ou na política, nascidas em diversos países de distintas culturas. Mulheres de diferentes épocas que se destacaram desde séculos antes de Cristo como as rainhas do Egito Hatshepsut (1508-1458a.C) e Cleópatra (69-30a.C), às contemporâneas.
Há no livro reconhecimentos importantes como o da pequena Coy Mathis, uma criança transsexual, nascida em 2007 nos EUA, e das irmãs Mirabel que lutaram contra o regime de Trujillo na República Dominicana e acabaram sendo assassinadas em 1960. Ou seja, o livro chama atenção por reconhecer mulheres não só por um cargo de poder alcançado, mas também por existirem, resistirem e lutarem. Mulheres negras também se destacaram no livro. Nanny dos Maroons (século XVII na Jamaica) e Harriet Tubman (século XIX nos EUA) foram reconhecidas pela resistência à escravidão que assolava toda a América. Elas organizaram fugas e foram responsáveis pela libertação de centenas de escravos. Outras foram reconhecidas por alcançarem espaços nunca ocupados pro negras como Mae C. Jemison (primeira mulher afro-americana a viajar para o espaço).
Das referências femininas mais conhecidas estão, Frida Khallo, Rosa Parks, Nina Simone e a brasileira Cora Coralina, além de outras figuras não tão exemplares, como Margaret Thatcher, Evita Peron, Hillary Clinton ou Michelle Obama, que apesar de poderosas, foram oficialmente reprodutoras da política capitalista que intensifica a opressão das mulheres no mundo todo, mas no livro a perspectiva de classes social não foi critério de seleção das mulheres.
Escrito em linguagem simples e bastante resumida é de se esperar que as histórias não consigam detalhar as reais dificuldades enfrentadas por essas mulheres ao longo da vida. Muitas inclusive morreram lutando por seus ideais. O formato de fábula busca deixar lições e estímulo às meninas a correr atrás dos sonhos, rompendo com os contos de fadas ou com o senso comum que estabelece papéis para as mulheres. Mas sabemos que sonhar é só um primeiro passo. Como se não bastasse o machismo, as mulheres enfrentam (ainda nos dias de hoje!) outras barreiras ideológicas como a injusta meritocracia, o mito da democracia racial, a LBTfobia e no caso das mulheres pertencentes a classe trabalhadora, barreiras estruturais que as impedem de desenvolver suas potencialidades.
É inquietante perceber que muitas das mulheres listadas tiveram uma vida anônima ou foram omitidas pela história. A maioria delas foram autodidatas, tendo em vista que ao longo de séculos as mulheres eram proibidas de acessar determinadas profissões. De todo modo, as fábulas deixam três lições: 1) as mulheres sempre resistiram à opressão; 2) provaram historicamente a capacidade para atuar em várias áreas do conhecimento, das artes, da produção, etc e 3) foram (mesmo que em condições desiguais) parte da produção coletiva do conhecimento social, econômico e político do mundo que temos hoje.
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