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BRASIL

Brasil: uma conjuntura diferente para os atingidos pela crise

Por: Gibran Jordão*, do Rio de Janeiro, RJ
*Membro da Secr. Executiva da CSP-Conlutas e da Coord. Geral da Fasubra

A crise econômica que explodiu no coração do capitalismo em 2008 vai fazer dez anos ano que vem. De lá para cá, tal crise atravessou o atlântico e atingiu em cheio a América Latina. Quando víamos demissões em massa e corte de salários no serviço público grego, o desemprego em larga escala na Espanha e os ataques à Previdência Social na França, muitos já avisavam que em algum momento tal situação explodiria por aqui.

O capital em crise armou uma ofensiva contra os povos do mundo e a classe trabalhadora europeia começou a perder o seu estado de bem estar social. Diante de uma economia globalizada, por que os trabalhadores latinos estariam protegidos de tal ofensiva?

A crise econômica chegou com força, em especial na principal economia do continente Latino, em 2014, período no qual o imperialismo já estava em franca ofensiva para recuperar fôlego e criar condições de ganhar terreno para investimentos nas mais diversas áreas da economia mundial, destacando o petróleo, construção pesada, armas e veículos de guerra e commodities.

O Brasil é alvo da ofensiva imperialista
O último ciclo de crescimento econômico, que catapultou a economia brasileira que se desenvolveu principalmente no período do governo Lula e também no primeiro mandato de Dilma, deu destaque a empresas como JBS, Odebrecht e Petrobras.

Para o imperialismo, tal espaço conquistado por essas empresas brasileiras é intolerável. Na guerra por mercados escassos o imperialismo quer retomar todo o espaço alcançado pelas grandes empresas brasileiras. Encontrou na Lava Jato um caminho por dentro do regime para operar a destruição da economia brasileira e ocupar esses nichos de mercado.

As práticas de “doping”, combinadas por décadas, acabaram ajudando as investigações legais e ilegais. As relações promíscuas de tais empresas com vários governos, inclusive do PT, tinham profundidade suficiente para uma ampla e farta coleção de provas que estão vindo à luz nesse momento, com as delações dos executivos da Odebrecht.

Foi uma doce ilusão acreditar que era possível fazer crescer a economia do país através de “perfeitos esquemas de corrupção” ligados a um projeto de poder que vendia a ideia de que era possível governar em conciliação capital e trabalho.

Diante da monumental crise econômica que reverbera por todo globo, não há nenhum lugar do mundo que está protegido da ofensiva do imperialismo. E nos parece que o mesmo se utiliza de táticas diferentes para cada região. Na América Latina, joga por dentro do regime, operando através de instituições nas quais possui influência, como o Judiciário, parlamento e grande mídia. Em outras regiões, onde o imperialismo não possui influência política, em situações de regimes impenetráveis por serem “ditaduras delinquentes”, ou por simplesmente não existirem, a intervenção militar é a tática principal. É o que estamos vendo na Síria, Coreia do Norte, Afeganistão e até mesmo no mar do sul da China.

Seja por golpes operados por dentro do regime, seja pela guerra aberta através de ameças e intervenções militares propriamente ditas, ninguém escapa ao olhar da águia que tem fome e está cada vez mais voraz.

A resistência dos atingidos pela crise deu um salto de qualidade no Brasil
Desde que a crise explodiu no país, após o impeachment, nunca vimos um ataque tão profundo e tão aberto contra os trabalhadores. É verdade que Dilma e o PT já aplicavam uma política de austeridade e perderam popularidade por isso, mas mesmo assim, Temer e aliados tucanos organizaram um golpe para tirar Dilma do poder para resolver essencialmente dois problemas:

1. Aprofundar e acelerar os ataques contra direitos sociais para demonstrar que é de inteira confiança ao imperialismo e ao grande capital;

2. Passar a ter controle direto das estruturas do estado para se defender do avanço da Lava Jato contra suas principais figuras históricas.

O imperialismo não confia integralmente nos dirigentes do PMDB e do PSDB, afinal todos estiveram envolvidos em esquemas pesados de corrupção, praticando doping em conluio com empresas brasileiras. Nestes casos, os ianques não estavam fazendo parte. E por isso a espada da Lava Jato está sob a cabeça de todos (PT, PMDB e PSDB), o que explica a pressa de Temer e aliados em aprovar as reformas da Previdência e Trabalhista. Temer sabe que só é possível fazer um acordo com o imperialismo para escapar da Lava Jato, se garantir a aprovação das reformas.

Até agora, mesmo diante de uma forte impopularidade, o governo Temer conseguiu aprovar projetos importantes para o grande capital. A PEC 241, as terceirizações, a venda de terras para estrangeiros e a Reforma do Ensino são vitórias de peso do governo entreguista de Temer e do imperialismo. Mas, tudo isso ainda é insuficiente para o capital, que quer as reformas Trabalhista e da Previdência aprovadas ainda esse ano. Os boatos dentro do Congresso, de que se tais reformas não forem aprovadas, o governo Temer acaba, é a mais pura verdade.

No ano passado o governo encontrou facilidade em aprovar reformas no Congresso Nacional e o movimento dos trabalhadores se encontrava dividido, sem calendário unificado e sem grandes manifestações de rua. A greve geral não estava colocada. Temer e todo o Congresso Nacional comemorou a virada de ano soltando fogos. Avançaram contra os trabalhadores e, de alguma forma, abriram caminho para se localizarem melhor contra a Lava Jato. Ganharam espaço no STF e aprovaram a PEC do fim do mundo.

Esse ano, começou diferente. Os trabalhadores começaram a dar sinal de que a insatisfação se transformava em ação, no Carnaval que ficou conhecido como o Carnaval Fora Temer. Depois, as manifestações que ocorreram no 8 de março, protagonizadas pelo movimento feminista, abriram caminho para as grandes manifestações do dia 15 de março convocada pela frente única formada pelas centrais e que teve adesão dos movimentos populares. E, agora, estamos diante da perspectiva de uma greve geral no dia 28 de abril, mais uma agenda convocada pelas centrais sindicais, com o eixo: “Vamos parar o Brasil, contra as reformas da Previdência, Trabalhista e contra as terceirizações”.

A mudança na conjuntura é que os trabalhadores entraram em cena e isso fez tremer as burocracias sindicais que estão sendo obrigadas a convocar atos unitários e fez dividir o Congresso Nacional, no qual Temer não encontra mais a mesma coesão na base aliada, para aprovar tudo que quer como foi no ano passado. A queda de braço ficou mais dura para o governo Temer, mas não quer dizer que já perderam, vai ser preciso que o dia 28 de abril seja grande, potente e de massas, e que as manifestações sigam com força após a greve geral, durante os meses de maio e junho.

A burguesia já se movimenta para esvaziar o dia 28 de abril, a Rede Globo e as delações da Odebrecht dão destaque às relações promíscuas de dirigentes sindicais da CUT, ao mesmo tempo em que o projeto de Reforma Trabalhista aponta o fim da obrigatoriedade do imposto sindical. São jogadas políticas para trazer as centrais sindicais burocráticas para o campo da negociação. A maioria das burocracias sindicais, nesse momento, estão entre a cruz e a espada. Se fizerem um dia 28 de abril radical, sabem que terão retaliações que ameaçam seus privilégios. Se não jogarem peso na greve geral para negociar as reformas e o imposto sindical, serão julgados pelo movimento de massas que está se colocando de pé. Devemos exigir das direções das centrais, nesse momento, nenhum recuo, nenhuma negociação das reformas e greve geral, já.

Nem Lula, nem a Lava Jato vão salvar o país da crise
A maioria dos ativistas e da esquerda enxergam Lula como uma alternativa política para superar a crise. Recordam do seu governo e das pequenas concessões, que só foram possíveis por conta do crescimento econômico na época, afinal quem ganhou mesmo foram os grandes empresários e os banqueiros. Seja como for, Lula lidera as pesquisas eleitorais. Temer e o Congresso estão picotando todas as concessões, não só as migalhas de Lula, mas também conquistas importantes que estão na Constituição de 1988. Descontentes, os trabalhadores pensam numa alternativa e o que vem à cabeça, de imediato, é Lula. As ilusões ainda são fortes, a maioria dos trabalhadores não viram Lula governar diante de uma crise econômica e a experiência, por conta disso, ainda não se completou. Por isso, a onda Lula 2018 segue crescendo.

Outra parte da população, em especial a classe média que perdeu poder de compra, simpática a qualquer ideia anti-Lula, anti-esquerda, anti-comunista, ovaciona e aplaude Sérgio Moro e a Lava Jato. Iludidos em pensar que a corrupção é o principal problema do país e contentes em ver grandes empresários e políticos sendo investigados e presos, defendem a ideia de que a Lava Jato é um instrumento bom para o país, pois pela primeira vez a corrupção está sendo desvendada e colocada a nu. Não importando se direitos democráticos não estão sendo garantidos, ou se as condenações estão sendo seletivas e espetaculizadas, permitindo manipulação política aberta de todo processo.

O que vem acontecendo é que Sergio Moro e a Lava Jato, através da grande mídia, conseguem pautar, chantagear e influenciar os rumos da política no país. Ter o controle desse processo é uma vantagem imensa para o imperialismo seguir operando politicamente no país. Moro, Janot e Dalagnol vão continuar recebendo prêmios internacionais de revistas e instituições do imperialismo como forma de cooptação e agradecimento pelos serviços prestados.

Lula e o PT não são alternativas e muito menos a salvação para os trabalhadores, pois querem repetir um governo de conciliação de classes que atenda os interesses da burguesia e que salve todos dos escândalos de corrupção. Ao mesmo tempo, a Lava Java Jato e Sergio Moro não passam de instrumentos sofisticados de uma fração do grande capital internacional em crise, que por trás do manto do combate a corrupção, só quer mesmo é ocupar mercados lucrativos na América Latina.

Diante dessa situação difícil, os trabalhadores e a esquerda revolucionária precisam fazer do dia 28 de abril mais um passo para virar de vez essa conjuntura, abrindo as condições para derrubar o governo de Michel Temer e interromper o saque aos direitos dos trabalhadores. As centrais sindicais deram um passo importante na construção da unidade em torno de um calendário unificado. Agora, precisam apontar a derrubada de Temer e do Congresso Nacional como uma tarefa do movimento de massas.

E, por fim, se está colocada como tarefa a derrubada de Michel Temer, será preciso forjar uma alternativa de poder na qual os trabalhadores possam compreender e apoiar, que não seja nenhum nome da direita e que supere o Lulismo. Diante de nossa marginalidade, nunca foi tão importante a unidade da esquerda socialista para apontar esse caminho de poder que crie uma referência política para os trabalhadores, apontando um programa de ruptura com a burguesia. Quem se recusar a essa tarefa, seja por oportunismo, ou por ultra esquerdismo, vai seguir ajudando a fortalecer as ilusões, seja em Lula, seja na direita aliada da Lava Jato.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil