Por: Hyago Brayan, de Brasília
Brasília, 27 de Março de 2017. Caía uma tempestade na Marte do cerrado quando essa beesha que vos fala terminou de ler “Rita Lee: uma autobiografia”. Depois de ler o livro laranjinha da rainha do rock eu fui imediatamente para a minha varanda tomar um banho de chuva e fumar um paiol de mama cadela, bem loca, bem Lee. Tinha que fazer isso. Pirar depois de ler o livro dessa alien ruiva paulista é um dever. Li o livro em uma semana em que eu me permiti fazer tudo.
Decidi que quando eu começasse a ler essa bíblia da autoentitulada hippie-comunista eu iria ler tendo experiências surtadinhas. Então teve de tudo: li o livro na beira do lago, teve pedido de namoro (que eu já queria fazer há algum tempo) e de quebra barraco em uma festa com um machista escroto (chuva de barracos depois de um pedido de namoro romântico, insane is my new name). Bem, tendo feito tudo isso e um pouco mais que não posso falar aqui, acho que Mama Lee falaria para esse medíocre leitor: não fez mais do que sua obrigação, bitch!
A obra lançada há pouco tempo não é uma história de uma sobrevivente arrependida. É a história de uma mulher que decidiu que luta a todo custo para viver uma vida intensa em todos os sentidos que todas as línguas podem trazer para esse signo. A caçula da família Jones não deixou nada fora do tapete e já no início da sua obra faz uma revelação bombástica: ela sofreu abuso sexual quando criança. Essa história inédita (pelo menos para mim) é trazida no livro, pois, segundo a autora, a tragédia se tornou o motivo para a família aceitar o espírito vanguardista da mulher que mais vendeu discos na terra Brasilis.
Ler essa autobiografia é essencial para entendermos uma das artistas que participaram de movimentos vanguardistas importantes em um tempo em que as fronteiras entre a arte e a política se confundiam por conta de uma única ordem: seja vanguarda, mude a roda, seja diferente, seja marginal, seja herói ou não seja nada. Dona de uma extensa produção cultural, ler e ver/ouvir cada empreitada artística de Rita Lee é uma tarefa prazerosa nesses tempos nos quais a obra da ruivona está disponível na internet com uma facilidade muito maior. Bem diferente dos tempos em que, para ouvir um álbum, tinha de se esperar em longas filas em lojas de LP.
A única contraindicação do livro é: leia e cuidado com o que você vai fazer da sua vida daqui para frente. Não tem como terminar essa leitura e não chegar à mesma conclusão da autora: a humanidade foi uma invenção que não deu certo. Ao ler os lacres da juventude de Rita Lee, eu cheguei à conclusão de que a minha geração não soube aprender a viver a vida, pois nos prendemos na Matrix. E bem, para fechar esse texto, pois quero voltar a tomar banho de chuva, termino com uma frase (minha) e um poema presente no livro: Rita Lee lançou o On The Road brasileiro. Hippies comunas da contemporaneidade: saiam da internet e vão viver a vida!
Eu sou do tempo da onça
De quando os bichos falavam
Pela Rádio Nacional
Das marchinhas de carnaval
Dos concursos de miss
Ah, eu era feliz…
Do tempo da Guanabara
Da nova bossa da Nara
Dos tropicalistas
Dos hippes comunistas
Da voz da Elis
Ah, eu era feliz…
Sou daquele tempo
Quando rock era tabu
Do “Let me sing” do Raul
Do cogumelo de zebu
Dos desacatos da Leila Diniz
Ah, eu era feliz
Eu sou do velho novo tempo
Do fim do vinil
Do boom da Madonna
Da zona no Brasil
Do caos do país
Ah, eu era feliz
Sou do tempo do tempo
Do exato momento
Em que o mundo explodiu
Foi bom que existiu
A Brasília da utopia
Ah, eu era feliz
Eu era feliz… e sabia.
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