Por: Carlos Zacarias, colunista do Esquerda Online
As últimas pesquisas realizadas no Brasil para as eleições presidenciais de 2018, não deixam dúvidas: a candidatura do deputado do PSC-RJ, Jair Bolsonaro, começa a aparecer como alternativa viável. Entretanto, nem era preciso verificar os números através da pesquisa. Para um observador atento, parece se tornar cada vez mais evidente que o nome do deputado, que no ano passado prestou homenagens à memória do torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra na fatídica sessão que votou o impeachment de Dilma Rousseff, cresce entre os setores menos organizados da sociedade. Mas por que o parlamentar conhecido por seu histrionismo e suas diatribes machistas, homofóbicas e racistas tem despontado como alternativa mesmo entre as camadas mais populares? A pergunta deve ser respondida, entre outras coisas, levando-se em consideração o lugar ocupado pela política na vida das pessoas.
Em tempos em que a corrupção associada ao parlamento e ao Executivo se tornaram manchetes diárias nos noticiários dos jornais, a confusão entre aquilo que é epifenomenal e o que é central na atualidade não chega a ser uma surpresa, pois faz parte do pacote ideológico disseminado pela classe dominante. Os brasileiros se acostumaram a odiar os políticos em tempos normais e, paradoxalmente, a idolatrá-los em períodos eleitorais quando são contagiados pela propaganda espetacular transmitida em horário nobre. Nos últimos anos uma avalanche de denúncias e algumas punições de políticos conhecidos, transformaram a frustração e a impotência diante dos políticos, em regozijo e contentamento catártico. O efeito, contudo, pode tornar ainda mais difícil o caminho das esquerdas, haja vista que o ódio aos políticos indistintamente percebidos como iguais e corruptos, converte-se, facilmente, em ódio pela política.
As últimas eleições norte-americanas, vencidas pelo bilionário xenófobo e ultradireitista, Donald Trump, surpreenderam o establishment. Deixando-se de lado o fato de que Trump perdeu no voto popular por uma margem superior a 700 mil votos, surrpreendeu que o eleitorado da potência do norte tenha escolhido um megaempresário histriônico e também machista, racista e homofóbico, como Bolsonaro, para dirigir os rumos da maior economia do planeta. Trump venceu Hilary Clinton obtendo a maioria (270) dos 538 votos no colégio eleitoral, tendo grande quantidade de votos, inclusive, no eleitorado negro, latino, entre as mulheres e a comunidade LGBT. A penetração de Trump nesses setores só foi possível em função do discurso da antipolítica, que penetra bem entre indivíduos atomizados e afastados de qualquer tipo de organização. Anestesiados com a mesmice da política muitos não veem solução para os seus problemas e terminam optando por candidatos que entabulam o discurso mais radical se eles parecem representar alguma perspectiva de ruptura, mesmo que esse discurso parta da direita.
O recente fenômeno da eleição estadunidense já ofereceu lições ao Brasil em passado não muito distante. Em 1989, Fernando Collor surgiu como candidato da antipolítica desbancando Lula que, na época, era a verdadeira novidade. O “Caçador de Marajás” das Alagoas, despontou para o estrelato nas eleições presidenciais após cinco desastrosos anos de governo de José Sarney e saturação da política e dos políticos. Articulando o discurso da anticorrupção e se apresentando não como político, mas como empresário bem sucedido, Collor conseguiu ser bastante mais radical do que Lula, aparecendo para os eleitores como uma efetiva alternativa ao governo Sarney. Por conta disso, o eleitorado identificou no jovem candidato aquele que seria capaz de superar a continuidade e oferecer soluções para os seus problemas.
A lista de exemplos poderia crescer, ainda mais se buscássemos experiências pelo mundo. Todavia os exemplos de Trump nos Estados Unidos em 2016 e de Collor no Brasil em 1989 são suficientes para dizer que quando a esquerda não oferece alternativas de ruptura e de justa radicalidade contra o establishment e o mais do mesmo da política eleitoral, as direitas tendem a fazê-lo e os riscos da antipolítica são o prenúncio do desastre. Em vista disso, o entusiasmo presente em setores da esquerda que viram na ida de Lula e Dilma à Paraíba para inaugurarem uma parte da obra de transposição do São Francisco, constitui-se numa armadilha para quem está enfrentando nas ruas o governo de Michel Temer e que sofre na pele as consequências de mais de uma década de governo de conciliação de classes.
Caso as esquerdas não sejam capazes de apresentar alternativas radicalmente anticapitalistas e continuem insistindo nos velhos e desgastados esquemas de alianças, o abismo pode ser ainda mais fundo do que o experimentado até aqui. Os recentes governos de conciliação de classes foram desastrosos para os trabalhadores e para reverter o retrocesso parece ser necessário recuperar a radicalidade desde já.
Por paradoxal que seja, o discurso anticapitalista no Brasil de 1989 ou nos Estados Unidos de 2016, esteve nas mãos de empresários que expressavam posições liberais e de direita. Nesse sentido, se se pretende recuperar a política como espaço de intervenção consciente e organizada dos setores explorados e oprimidos que constituem a maioria da população, não se pode deixar que candidatos que expressam posições da antipolítica usurpem o lugar que pertence por direito à classe trabalhadora e suas organizações. Se assim for, haverá a possibilidade de os trabalhadores recuperarem a crença em suas próprias forças, dando um passo decisivo para impor derrotas ao governo ilegítimo de Michel Temer ainda 2017, preparando as bases para a formação de uma Frente de Esquerda para as eleições do ano que vem.
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