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MOVIMENTO

15 de Março: Metroviários reconquistam o instrumento da greve e o apoio da população

Por Eli Moraes, São Paulo, SP

Como parte das mobilizações nacionais do 15 de Março, os metroviários de São Paulo deflagaram uma greve de 24h, que fortaleceu a mobilização na maior capital do país. Com paralisações e manifestações, a data teve como centro a oposição à reforma da previdência e das leis trabalhistas do governo ilegítimo de Michel Temer (PMDB). Tais projetos terão como resultado, na prática, o fim do direito à aposentadoria (ao exigir uma idade mínima de 65 anos, e um tempo de contribuição à previdência de 49 anos), e a perda da maioria dos direitos trabalhistas ainda garantidos pela CLT.

Desde a greve de 2014, a apreensão tomava conta da categoria metroviária. As conhecidas práticas antissindicais da empresa e do governo tucano de Alckmin (PSDB) são o principal motivo para o receio de retomar o instrumento da greve. Como é conhecido, na última da greve da categoria, apesar das vitórias econômicas conquistadas, a repressão do governo veio na forma de prisões, seguidas de processo criminal e demissões de ativistas e dirigentes sindicais. Também em 2007, ano em que a categoria protagonizou duas greves (uma contra a Emenda 3, do governo Lula, e outra pela garantia do direito à PLR dos metroviários) o governo respondeu com demissões e retaliações, algumas das quais foram revertidas.

O dia 14 de março, quando ocorreu a assembleia que definiria a posição da categoria, foi de reflexão. Ainda pela manhã, poucos acreditavam na possibilidade real de uma greve. O clima foi virando ao longo do dia, com as notícias de que o 15 de Março seria marcado por uma grande luta, com diversas categorias em unidade contra as medidas impopulares de Temer. Ao longo do dia, os trabalhadores e trabalhadoras debateram nos locais de trabalho, nos grupos de aplicativos de celular e na própria assembleia. Em geral, estava presente o acordo de que não se podia aceitar as medidas do governo e algo precisava ser feito.

Ao fim da noite, a assembleia do Sindicato dos Metroviários tomou a decisão pela paralisação de 24 horas. A partir daí, o ativismo se jogou na organização da greve. Concentrações foram realizadas em áreas estratégicas de trabalho: os pátios de manutenção e as bases do tráfego. Mas o principal termômetro foi a adesão da própria categoria à decisão. Mesmo os que estiveram em dúvida durante o dia, buscaram legitimar a assembleia, pelo acordo com a pauta e pela força do movimento nacional. A maior parte da categoria se recusou a trabalhar neste dia 15 de Março. E dentre a minoria que furou a greve já muitos se declaram arrependidos.

Os metroviários e metroviárias deram um passo para retomar sua autoconfiança. E demonstraram a força de mobilização que têm. Até as 9h da manhã do dia 15 de Março, o Metrô de São Paulo ficou completamente paralisado. A partir deste horário, a empresa colocou em ação um plano de contingência utilizando os trabalhadores que furaram greve e a chefia para rodar trens e estações. Uma prática que, além de antissindical, coloca em risco a vida dos passageiros, pois operam-se trens e estação com funcionários sem o devido treinamento e experiência, além de, em geral, não haver manutenção dos equipamentos nos dias de greve, devido à grande adesão desta área ao movimento. Ainda assim, as notícias até o momento demonstram que o plano de contingência não conseguiu garantir sequer 15% do funcionamento comum da empresa. A linha 1-Azul, por exemplo, que em um dia normal tem 50 trens circulando, funcionou com apenas 6, pelas informações que temos.

Mesmo com o funcionamento parcial da empresa, e com a greve ter, aparentemente, demonstrado uma radicalidade menor do que em 2014, o fato é a categoria retomou seu clássico instrumento de luta, surpreendendo a empresa, o governo, e a si própria em alguma medida. E isto foi feito em uma greve em unidade com muitas outras paralisações no país, com uma pauta política de enfrentamento ao governo. A adesão deve ter chegado a algo entre 85% e 90% dos trabalhadores e trabalhadoras. De tal forma, que não há notícias de enfrentamentos durante a greve, pois na maior parte dos locais de trabalho, apenas a chefia, desmoralizada, apareceu para bater o ponto. Mesmo um setor muito precarizado da categoria, os jovens aprendizes (trabalhadores de 17 a 21 anos que recebem salários muito abaixo do piso da empresa) paralisaram em grande medida. Talvez a maior dificuldade encontrada tenha sido no envolvimento dos terceirizados, sendo que nos pátios de manutenção acabaram entrando para trabalhar, por exemplo, os trabalhadores dos refeitórios, limpeza e guarda patrimonial.

De qualquer forma, o principal motivo de tão alta adesão entre os metroviários é a unidade que se construiu em torno da data, além do próprio repúdio às reformas. Esta unidade se expressou no interior da categoria com uma defesa conjunta dos setores da diretoria do sindicato e do ativismo em torno da paralisação. Houve uma polêmica se ela deveria durar 12 horas ou 24 horas, decidindo-se pela última, por envolver o conjunto da categoria.

No entanto, foi mais importante a unidade construída externamente à categoria, entre as centrais sindicais, movimentos sociais e partidos políticos de oposição. Os metroviários encorajaram-se a aderir à greve na medida em que viram que outras categorias seguiriam o movimento e esperavam ansiosamente pela greve do Metrô. Neste sentido, paralisaram também os metrôs de Belo Horizonte e Recife. Condutores de ônibus de várias cidades, incluindo São Paulo, também participaram do movimento. O setor dos transportes, portanto, foi um grande peso neste 15 de Março. E a unidade de ação entre os setores de oposição ao governo foi a principal base da confiança dos trabalhadores em sua capacidade de luta e suas possibilidades de vitória.

Outra marca da paralisação foi o apoio majoritário da população ao movimento e à categoria. Ainda na manhã do dia 14 de março foi organizada a tradicional distribuição de Carta Aberta à População do Sindicato dos Metroviários. A carta desta vez alertava a população sobre a possibilidade de greve e seus motivos. Já aí foi possível sentir o apoio popular. Alguns passageiros perguntavam o local do ato no dia 15, e declaravam apoio à mobilização nacional contra a reforma.

Mas a profundidade do apoio à greve do dia 15 impressionou a todos. Logo após sua deflagração a empresa lançou uma postagem nas redes sociais em que afirmava que a população seria a principal prejudicada e ameaçava diversas retaliações à categoria. O resultado foi uma avalanche de comentários achincalhando a Companhia, denunciando sua prática assediadora e declarando oposição às medidas de Temer. Os internautas também demonstravam seu repúdio à decisão judicial que exigia 100% de funcionamento em um dia de greve. O mesmo aconteceu, por exemplo, em uma postagem do MBL contra as greves do dia 15.

Ao longo do dia, no entanto, o apoio foi crescendo e passou a furar o bloqueio da mídia. Inúmeros portais anunciaram manchetes em que os metroviários eram aplaudidos pela população nas portas das estações fechadas. Mesmo sem conseguir chegar a seus locais de trabalho, a população majoritariamente declarou apoio. Curiosamente a maior parte das reclamações populares se deu devido ao fato de o metrô funcionar parcialmente por conta do plano de contingência da empresa. Seu desejo era que “tinha que parar tudo”!

No coroamento do dia, um ato de cerca de 200 mil pessoas na Avenida Paulista, o clima na coluna organizada pelo Sindicato dos Metroviários era de alegria, moralização e dever cumprido. Os grevistas, diretores sindicais e ativistas de base presentes demonstravam o alívio com a grande adesão da categoria e felicidade com o sucesso da paralisação. O instrumento da greve foi recuperado ao repertório de mobilização dos metroviários. A prova disso, a principal palavra de ordem gritada na coluna, em referência a 2014, e dessa vez dirigida a Temer, além de Alckmin. Mais uma vez, os metroviários demonstraram:

Não tem arrego”!