Do Blog de Michael Roberts
Tradução de Wilma Olmo Corrêa
A vitória de Benoit Hamon como o novo líder do Partido Socialista na França prepara o cenário para um resultado imprevisível a partir da próxima eleição presidencial em abril-maio.
Hamon é um líder de esquerda do tipo Corbyn-Sanders que derrotou o candidato da direita Blairite-Clinton na primária socialista que viu quase 2 milhões de votos. Ele defende a redução da jornada de trabalho, o aumento do salário mínimo e a reversão de várias medidas neoliberais introduzidas pelo presidente “socialista” Hollande, que é tão impopular (com 4% de aprovação) que decidiu não voltar a concorrer.
Hamon começa muito atrás nas pesquisas de opinião pública, com cerca de 15% dos votantes que provavelmente irão apoiá-lo, mas está à frente do candidato de extrema esquerda Jean-Luc Melenchon que tem 10%. A líder é Marie Le Pen, líder da Frente Nacional – FN (antes abertamente fascista), anti-imigrante, anti-UE, que está com cerca de 25% nas pesquisas de voto. O principal partido capitalista neoliberal, de centro-direita, os Republicanos, escolheu Francois Fillon, que quer aumentar a jornada de trabalho semanal, privatizar mais e cortar funcionários públicos e serviços de forma drástica. Fillon, que foi apanhado em um escândalo por pagar à sua esposa 800 mil euros como sua “secretária”, usando fundos públicos, e sem exercer nenhuma atividade, conta com cerca de 22% nas pesquisas de votos. Em seguida, há o chamado candidato do centro, um ex-ministro socialista de direita, Emmanuel Macron, que é pró-UE, quer mais políticas neoliberais, etc. Ele conta com cerca de 21% nas pesquisas de voto.
Sendo assim tudo está bem aberto. Como a eleição presidencial francesa acontece em mais de duas rodadas, com os dois primeiros colocados na primeira rodada e em seguida havendo uma nova rodada, o resultado mais provável é que Le Pen possa chegar ao segundo turno, mas sendo em seguida derrotada por um dos outros (em uma segunda rodada qualquer um dos outros estará à frente contra Le Pen em cerca de 60-40). Assim, é improvável que a França vote em um presidente racista e Eurocético.
Mas isso não exclui um novo presidente de direita que vai tentar aumentar a lucratividade em detrimento do trabalho, elevando a jornada de trabalho semanal, impondo leis trabalhistas rigorosas, cortes em serviços públicos, pensões e mais privatizações. Isso porque o capital francês precisa agir, uma vez que ele está ficando para trás em relação ao seu principal parceiro na Europa, a capital alemã.
A economia francesa se recuperou no último trimestre de 2016, mas foi uma recuperação muito modesta. A economia francesa cresceu 1,1% em todo o ano de 2016, contra 3,2% na Espanha e 1,9% na Alemanha. A taxa de desemprego permanece fixa, perto de 10%, em comparação com apenas 3,9% na Alemanha.
A realidade é que o capital francês tem estado em apuros já há algum tempo. A melhor estimativa de rentabilidade do capital francês nos últimos 50 anos mostra que, depois da queda de lucratividade dos anos 60, que foi experimentada por todas as grandes economias capitalistas, o capital francês conseguiu apenas uma recuperação limitada na chamada era neoliberal.
Isso se deveu em parte ao fracasso da indústria francesa em investir e competir nos mercados mundiais e, por fim, na zona do euro, em comparação com a Alemanha. E também em parte devido à obstinada militância dos trabalhadores franceses em não permitir cortes nos salários e nas condições de trabalho e preservar os serviços públicos e benefícios – a França tem o melhor serviço nacional de saúde no mundo e ainda relativamente bons benefícios sociais e pensões (embora estes tenham sido corroídos). E a França tem uma jornada semanal oficial de trabalho de 35 horas que é imposta pelo movimento operário.
No final do século 20, a rentabilidade atingiu o seu pico e começou a cair novamente. Está agora em uma baixa de pós-guerra. Como resultado, o capital francês está lutando para competir. Na verdade, desde que o euro começou em 1999, a rentabilidade do capital francês caiu 27% em comparação com um aumento de 21% na Alemanha. A lucratividade ainda está baixa, um cambaleante 22% desde o pico imediatamente antes do crash financeiro global em 2007 – que é muito mais do que o declínio na Alemanha ou a média da área do Euro.
Como resultado, o investimento, especialmente o investimento empresarial, está estagnado na “recuperação” desde 2009.
Como o investimento tem sido muito pobre, o crescimento da produtividade tem sido baixo (como em muitas outras economias capitalistas).
Os níveis de produtividade franceses (PIB por hora trabalhada) parecem superiores aos do G7 e do Reino Unido. Mas isso é parcialmente uma ilusão porque a taxa de desemprego é de cerca de 10% ou o dobro do Reino Unido e Alemanha. Quando você leva isso em consideração, a produtividade francesa não é muito maior do que a do Reino Unido.
Portanto, esta próxima eleição é importante. O capital francês quer um presidente eleito que introduzirá políticas projetadas para reverter o declínio secular em longo prazo na rentabilidade do capital e colocar as regras trabalhistas francesas em seu devido lugar. Para isso, eles olham para Fillon ou Macron – qualquer um o fará. Mas os votos nem sempre funcionam como os estrategistas querem ou esperam – como vimos no Reino Unido com o Brexit e Trump nos EUA.
Ainda é improvável que Le Pen entre no Palácio do Eliseu ou que Hamon ou Melenchon se combinem para capacitar um candidato esquerdista a entrar na segunda rodada e derrotar Le Pen. Mas é possível. Mas seja qual for o resultado, o próximo presidente francês enfrentará grandes desafios com uma economia que tem crescimento e investimento lentos, alto nível de desemprego e crescentes divisões étnicas. E isso sem sequer considerar a probabilidade de que haverá uma nova crise global durante a próxima presidência.
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