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EDITORIAL

O Trotskismo Operário e Internacionalista na Argentina

Em razão dos 30 anos da morte de Nahuel Moreno, publicamos, com tradução livre do Esquerda Online, a Apresentação do Tomo 1 do livro O Trotskismo Operário e Internacionalista na Argentina. O livro, dividido em IV tomos, foi publicado originalmente em 1994 e analisa cinco décadas de tradição partidária trotskista no país latino. Ao final da Apresentação, disponibilizamos os links das obras para que os leitores que queiram aprofundar a leitura possam fazê-la. Boa leitura!

 

O pensamento revolucionário não tem nada em comum com a adoração de ídolos. Os programas e os prognósticos se colocam à  prova e se corrigem a luz da experiência, que o critério supremo da razão humana.

Leon Trotsky.

Este trabalho é uma tentativa de narrar o caminho da corrente trotskista de Nahuel Moreno e um punhado de militantes, que se iniciou há mais de cinquenta anos na Argentina. Surgiu entre 1943 e 1944, como Grupo Marxista dos Trabalhadores, e atualmente continua, após várias denominações, com o nome do Movimento ao Socialismo – MAS, sessão que adere à Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional – LIT.

Nosso objetivo não foi o de agir como  observadores “não comprometidos” com esses cinquenta anos de experiência. Pelo contrário, os autores deste trabalho se identificam com a corrente política que estão narrando. Daí constantemente dizemos “nós”, “nosso partido” como  referência às posições e ações da corrente. Isto não deve levar à uma confusão: esta não é uma “história oficial” ou uma apologia. Como marxistas, acreditamos que a ciência da história não está sujeita à votação de qualquer organismo, mas à investigação crítica e a sua comprovação científica.

Acreditamos que hoje é mais necessário do que nunca um estudo da nossa tradição partidária. Em toda a esquerda, está colocado os debates e a reformulação do programa e das diretrizes. A queda dos regimes stalinistas, os processos de restauração capitalista nos estados dominados pela burocracia, o fim da “ordem mundial” estabelecida no período do pós-guerra, envolvem necessariamente reelaborações. A isto se acrescenta o fato da burguesia de todo o mundo impulsionar sua propaganda anunciando a “morte do socialismo” e, até mesmo, o fim da luta de classes. Enfrentar esta campanha de confusão e desmoralização lançada sobre as massas e a vanguarda, requer a máxima seriedade, saber de onde viemos e entender onde estamos. Para não perder a bússola, é essencial analisar as nossas origens e aprender com os sucessos e erros do passado: como o partido se construiu em diferentes períodos, avançando ou retrocedendo nas várias situações que se apresentaram.

Além disso, esta investigação não está voltada apenas aos militantes do partido e da Internacional. Acreditamos que esta experiência também pode ser útil para todos os trabalhadores e estudantes de vanguarda que procuram um ponto de referência histórico frente às mudanças mundiais a que nos referimos.

Quando nos propusemos investigar a tradição do partido não o fizemos para buscar uma justificativa moral no passado. Longe disso, a intenção era saber a história do partido, como foram as experiências vividas, as lições que elas nos deixaram em cada momento da luta dos trabalhadores; buscamos objetivos que permitem uma melhor compreensão do presente.

Faz um século e meio que o proletariado começou a dar suas primeiras batalhas para se organizar, desenvolver programas, submetê-los à crítica implacável da prática. Faz mais de um século que Marx e Engels formularam as bases científicas do socialismo, não “tirou-as da cabeça”, mas de todas essas experiências da classe trabalhadora. Faz mais de sete décadas que se buscou realizar esses princípios com o leninismo na Revolução Russa, e passou mais de meio século desde que Trotsky e seus seguidores continuaram erguendo a bandeira do marxismo contra a degeneração stalinista.

Toda esta experiência se traduz em princípios, métodos e critérios comprovados no único laboratório válido para a formulação de teorias políticas: a luta de classes. É esta tradição do pensamento revolucionário que reivindicamos. Uma tradição que, como disse Trotsky, “não tem nada em comum com a adoração de ídolos” e, sim, com trabalhadores de carne e osso que aprendem atuando na realidade, e a partir de seus acertos e erros reformulam seus planos e sua orientação para retornar mais bem preparados e continuar a lutar nessa realidade. Nós acreditamos que é essencial conhecer esta tradição para poder atuar hoje.

Um dos riscos habituais é, em momentos críticos, renunciar ao passado, condená-lo em bloco como inutilizável. O outro, simétrico, é idolatrá-lo como se tivesse sido uma “idade de ouro”, livre de erros. Se para alguma coisa queremos que sirva este trabalho é para mostrar como a construção de um partido revolucionário nunca foi, nem pode ser um processo linear. E não pode sê-lo, porque a luta de classes não é.

Este processo, de certa forma, se reflete nas mudanças de nome da nossa corrente. Grupo Marxista dos Trabalhadores – GOM, entre 1943 e 1948; Partido Operário Revolucionário, de 1948 até 1956 e – publicamente- Federation Bonaerense do Partido Socialista (Revolução Nacional), entre 1954 e 1955; Movimento de Agrupações Operárias entre 1956 e 1957. Sua presença também foi conhecida entre 1957-1965, com o nome de seu jornal: “Palabra Obrera”; como Partido Revolucionário dos Trabalhadores a partir de 1965, e PRT (La Verdad) depois da ruptura da organização em 1968. Por fim, se chamou Partido Socialista dos Trabalhadores – PST, entre 1972 e 1982; e Movimento ao Socialismo – MAS, até a data de hoje. Cada uma dessas mudanças respondeu à diferentes situações da luta de classes e à orientação e táticas que foram consideradas mais adequados para o momento. Existe, deste modo, uma linha de continuidade expressa por quadros da organização e pela perspectiva de construção de um partido revolucionário, operário e internacionalista.

No mesmo sentido, quando se refere à trajetória da nossa corrente, Nahuel Moreno se acostumava à dizer que “a história do partido é a história de nossos erros”. Os grandes acertos que o partido efetivamente teve, vieram, em quase todos os casos, de termos reelaborado ou precisados, de uma orientação depois de analisar os erros cometidos.

Um exemplo disso foi que, durante os seus primeiros anos de existência, a nossa atual corrente teve uma interpretação errada, sectária, do peronismo. Basicamente, nós enxergamos um único aspecto: o peronismo representava a velha estrutura do país, ligada à produção agrícola e sua dependência do imperialismo britânico. O peronismo em 1945, como direção burguesa, efetivamente representava isso. Mas nós não compreendemos que por esta mesma razão, ele ofereceu uma relativa resistência à interferência do imperialismo norte americano na época, e que este elemento foi decisivo. Apenas a partir da ligação efetiva com a Quarta Internacional, adquirimos uma visão internacionalista, que nos permitiu começar a corrigir o erro, baseando a análise do nosso país na situação mundial e, assim, reorientar a política. Este processo de reelaboração para entender o peronismo, que começou em 1948, só foi concluído em 1954.

É importante levar em conta este exemplo. É talvez o mais grave erro que o partido cometeu em sua história. Se não tivéssemos descoberto e corrigido, poderíamos ter negado o conjunto das nossas caracterizações e caído no oportunismo de Posadas e de Jorge A. Ramos, que idealizaram o peronismo como “revolucionário”. Ou poderíamos ter caído em cepticismo e na desmoralização, dissolvendo o partido. O método seguido foi estudar seriamente a realidade, fazer uma profunda autocrítica das posições e, consequentemente, redirecionar nossa política.

Não foi, nem será, o único erro. Em cada um dos fenômenos da luta de classes no país e no mundo,  se produzem equívocos e correções, acertos e reelaborações, que analisamos ao longo deste trabalho. Ao narrá-los, tentamos manter a mais alta fidelidade, não só em relação aos documentos partidários (públicas e internas), mas especialmente o contexto histórico em que foram escritos. Nenhum deles veio sem discussão, sem crítica e desenvolvimento coletivo.  Todos estavam diretamente relacionadas com processos em curso sobre os quais se atuava ou se tentava atuar. Se este trabalho conseguir mostrar essa dinâmica, de como um partido revolucionário elabora e reelabora suas posições, não desde um “laboratório”, mas através da sua participação na luta, este trabalho será em boa medida justificado.

Para compreender essa a dinâmica real de desenvolvimento político, é imprescindível levar em consideração em cada período ou situação, as condições reais, incluindo o grau de informação, de liberdade de ação e as possibilidades materiais em que estava a militância. É muito comum, infelizmente, que aqueles que estudam as posições de qualquer grupo no passado esquecem as condições reais em que foram levantadas. Esses autores tendem a citar, muitas vezes intencionalmente, trechos de documentos e artigos para “provar” os erros cometidos. Este “método”, que pode servir muito bem para debatedores de café que buscam “ganhar o debate” em vez de investigar a realidade, é o caminho garantido para que nunca se saiba as causas reais dos equívocos, impedindo o combate aos erros atuais e também que se possa corrigir no futuro. Por outro lado, localizar os êxitos e erros em seu contexto histórico, investigar as situações em que ocorreram, permite que a história possa dar conta desta “grande professora” que é a experiência.

Em muitos casos, ao longo desses cinquenta anos, linhas e orientações de militância que permitiram um grande progresso para o partido surgiram, direta ou indiretamente, com a experiência dos militantes mais intimamente ligados à base do movimento operário. Como foi, por exemplo, a adequação da linha das “oposições sindicais” na década de 1950; a primeira ocupação de fábrica com reféns na década de 1960; ou as “peinadas” na zona norte da Grande Buenos Aires, quer dizer a corrida às fábricas buscando contactar ativistas no transcurso desses anos. Aqui estão alguns exemplos significativos da natureza coletiva da formulação de políticas no partido, a partir da iniciativa de todos os militantes.

Isso nos leva a outro princípio da nossa construção do partido: o centralismo democrático. É o único método que pode fomentar a iniciativa dos militantes, fundamental para a elaboração coletiva, e que permite ao partido, uma vez tomada a decisão: “golpear com um só punho”. As relações entre os militantes se baseiam unicamente na confiança completa. Centralismo democrático significa impulsionar a mais ampla democracia nas discussões e decisões a tomar, e respeitar as resoluções dos organismos tomadas em base a este funcionamento.

Nossa corrente foi defensora deste método no partido Argentino e na Internacional. Nosso respeito pelas decisões dos organismos foi demonstrado, por exemplo, quando, em 1951, o III Congresso da Quarta Internacional impôs à nossa tendência sua dissolução e a entrada no grupo liderado por Posadas. O partido cumpriu as resoluções, apesar de ser contra, e fez tudo que estivesse em seu alcance para se cumprisse. Mas o centralismo só é possível se for baseado na democracia. E, por isso, demos a batalha contra métodos burocráticos do pablismo e do mandelismo na Quarta Internacional; e também dentro do próprio partido, como em todo processo que culminou na fratura PRT entre 1967 e 1968.

O GOM, fundado por meia dúzia de jovens, em 1943, se propôs a um objetivo primordial: a construção de um partido revolucionário na classe operária, participando de suas lutas diárias, quebrando a boêmia intelectual que caracterizam os grupos que se autodenominam trotskista.

A partir disso, e até agora, não nos desprendemos deste princípio de construção do partido. Desde o processo de reorganização sindical, em meados da década de 40, passando pela resistência às ditaduras da Libertadora, até a luta contra a privatização e as flexibilizações de Alfonsín e Menem.

Da mesma forma, participamos dos processos nos quais surgiram novas camadas de ativistas nas lutas na classe operária. Desde a década de 1950, intervimos nas primeiras chapas sindicais da oposição à velha burocracia sindical peronista de têxteis e metalúrgicos. Também participamos da criação das 62 Organizações, do classismo dos anos 60 e 70, da formação de coordenações inter fabris, da coordenação entre 1975 e 1976 e dos processos de oposição à burocracia em quase todos os sindicatos nos últimos anos. Boa parte da militância do partido surgiu deste ativismo; os que se incorporavam de  outros setores sociais se juntavam para trabalhar em fábricas, oficinas e escritórios. Quando afirmamos que nossa corrente é uma organização de trabalhadores, o fazemos tanto pelo seu programa, quanto pelo fato de que ao longo de sua trajetória nos construímos dentro da classe trabalhadora e de suas lutas.

Nas lutas dos trabalhadores, buscamos construir uma direção revolucionária autêntica e tivemos como um de nossos eixos fundamentais a democracia operária. Ao longo desta obra, fica explícito o confronto permanente contra a burocracia e o burocratismo nos sindicatos e organizações dos trabalhadores.  Uma batalha que travamos tanto a nível sindical como político, contra a direção peronista e contra as distintas variantes opositoras mas igualmente burocráticas que foram surgindo.

Desde este caráter proletário da nossa organização, iniciamos nos anos 50, nossa militância no movimento estudantil. Nele, sempre buscamos construir uma tendência revolucionária, superando o tradicional gorilismoe antiobreirismo, ligando-o à classe trabalhadora e compreendendo que suas lutas estão intrinsecamente ligadas. A unidade operária-estudantil foi uma das bandeiras nos anos 60 e 70, e teve suas primeiras expressões concretas a partir de 1957, quando a nossa tendência estudantil juntou-se às recém-criadas 62 organizações.

No entanto, nossa corrente não apenas se caracterizou por sua ação entre os trabalhadores, mas também por sua prática internacionalista e sua intervenção na construção da Quarta Internacional.

A organização sempre considerou que a sua participação nas lutas no país estava intrinsecamente ligada à luta mundial do proletariado. Não apenas manteve um internacionalismo teórico, mas encarou que a sua própria construção como partido só poderia ser feita como parte nacional de um partido mundial centralizado, a Quarta Internacional. Estivemos ligados à IV organicamente a partir de seu Segundo Congresso Mundial em 1948. Desde então deu-se permanentemente uma dupla batalha. De um lado, a necessidade de orientar-se a partir dos princípios do marxismo revolucionário para entender os novos processos que foram transformando a situação mundial durante mais de cinqüenta anos: a ascensão e queda dos trabalhadores nos estados da Europa Oriental, Revoluções Chinesa, Boliviana, Cubana, entre outros. Estes processos levaram às definições e posicionamentos que nos forçaram a confrontar aqueles que, impactados por estes processos, como Michel Pablo e Ernest Mandel, por exemplo, foram cedendo às direções destes processos (o stalinismo, o castrismo, o sandinismo), caindo no revisionismo e no oportunismo. Também nos enfrentamos com aqueles que, como Pierre Lambert e Gerry Healy, no início de 1960, se recusaram a compreender novos fenômenos, fechando-se em um sectarismo suicida.

Simultaneamente, demos a batalha para que a Quarta atuasse como um partido com centralismo democrático. Enfrentamos os métodos burocráticos de Pablo e Mandel; e também o outro lado, os que pretendiam que a Internacional funcionasse apenas como um “comitê de ligação” entre os diferentes partidos nacionais, como fazia o SWP americano.

Estas batalhas não se limitaram ao campo da discussão teórica e política. O papel desempenhado pelos trotskistas, orientados por Pablo e Posadas na Revolução Boliviana de 1952, a intervenção da corrente conduzida por Moreno na revolução agrária no Peru entre 1959 e 1963, a participação na Revolução Nicaragüense de 1979 com a criação da Brigada Simón Bolívar que lutou contra Somoza, a formação do Secretariado Latino-americano do Trotskismo Ortodoxo (SLATO) na década de 50, a fundação da Liga Internacional dos Trabalhadores – LIT em 1982 são exemplos de que o compromisso com o desenvolvimento de um programa e um regime apropriado para Internacional teve expressão concreta na participação na luta de classes internacional e na construção da Internacional.

Portanto, ao longo desta obra, fazemos referência constante, ainda  que seja sinteticamente, aos grandes processos internacionais. E, embora não temos a intenção de escrever a história da Internacional como um todo, a construção do partido mundial é um ponto central e permanente em cada um dos períodos estudados.

O projeto de escrever a história da nossa corrente não é recente e tampouco os autores pretendem “partir do zero” para enfrentá-lo. Nossos antecedentes são os cursos ministrados por Moreno e outros camaradas desde a década de 1960, e algumas obras dedicadas às questões da história do movimento operário que abordavam parcialmente aspectos da história de nossa organização.

No entanto, estes trabalhos não foram sistematizadas. Por ocasião do falecimento de Rita Galub, em 1974, uma das fundadoras do partido e companheira de Nahuel Moreno, o PST advertiu o atraso com que vínhamos encarando a valorização da nossa tradição e o escasso conhecimento que os novos militantes tinham dela. Decidiu-se, então, enfrentar o projeto de escrever a parte da nossa história. Para isso foram feitas entrevistas com companheiros da velha guarda, fez-se uma periodização e um esquema geral e do trabalho. Como parte deste projeto, foram publicado uma série de artigos que o nosso colega Aníbal Tesoro escreveu para a Avançada Socialista, o jornal do PST.

Mas o trabalho, árduo e lento, não pode ter continuidade. A ação da “Aliança Argentina Anticomunista” e do Governo Isabelita primeiro, e o genocídio conduzido pela ditadura militar, depois, que envolveu a morte de dezenas de militantes do PST, impediram objetivamente a realização da tarefa pela imposição de condições de sigilo e segurança, quando era impensável a pesquisa em arquivos e a realização de entrevistas.

A queda da ditadura, o regime democrático burguês e nossa legalidade, desde 1983, permitiram retomar o projeto. Mas a organização repetiu velhos erros, e a tarefa de escrever um estudo da história da organização cochilou na sombra de desenvolvimento impetuoso do MAS.

Ainda que tenha sido sempre uma tarefa necessária, hoje é em maior medida, por várias razões. Em primeiro lugar, como já exposto, pela necessidade de saber como foi a construção de uma partido operário revolucionário, de conhecer essa experiência. Em segundo lugar, pela morte, em 1987, do principal dirigente e construtor da nossa corrente, Nahuel Moreno, que se concentra quase meio século desta experiência, que era o dirigente mais representativo desta tradição. Apenas um estudo apaixonado, mas verdadeiro de nosso passado pode nos fazer tentar superar o vácuo político causado pela sua morte. Em terceiro lugar, mas não menos importante, pelos novos desafios colocados pela situação mundial, que começou com a queda dos regimes stalinistas desde 1989. Não será possível nenhum reformulação da nossa teoria e do nosso programa se não somos capazes de compreender de que ponto partimos, com qual capital teórico e político contamos historicamente, e qual foi o processo em que esta teoria, programa e organização foram construídos.

Por todas estas razões este trabalho surge hoje. É um produto coletivo de mais de dois anos de esforços, que exigirá ainda mais até a sua conclusão. Reconhecemos em todas as tentativas anteriores os frutos que renderam: testemunhos, coleções, análises, observações. A partir daí, de nossa parte, conduzimos uma investigação completa no arquivo do partido, analisando centenas de documentos, publicações, folhetos, livros. Consultamos obras sobre a história do movimento operário no nosso país e no mundo, bem como jornais e outras publicações. Foram realizadas dezenas de entrevistas, tanto com militantes e ex-militantes da corrente, quanto com ativistas e líderes que nunca pertenceram a ela, mas que forneceram precisões sobre eventos específicos das lutas dos trabalhadores ou da história do trotskismo. Nesta tarefa, tivemos a cooperação tanto de companheiros que recorreram à bibliotecas e arquivos de jornais a nosso pedido, quanto dos que se dispuseram a dedicar parte do seu tempo (que no caso dos militantes é escasso) para responder a entrevistas e consultas.

Com relação às entrevistas é preciso registrar que tivemos testemunhos de colegas que viveram e atuaram nos acontecimentos narrados. Fizemos isso por duas razões. Nós pensamos que as entrevistas fornecem elementos para a compreensão dos fatos e situações que se perdem muitas vezes na história baseada exclusivamente em registros textuais. Estudos de ações e organizações políticas baseados apenas em citações de jornais e documentos omitem os protagonistas: os militantes. No nosso caso, em particular, acreditamos que estes relatos em primeira mão vivenciados mostram o que, a cada dia, significa a luta de classes; as condições reais em que o partido orientou-se perante este ou aquele fato e encarar a sua ação viva. Mas também acreditamos que é uma contribuição para melhorar a compreensão, com os ativistas de carne e osso falando por si mesmos, do que significa a militância e um partido revolucionário no dia a dia. Essas experiências pessoais, que podem nos ensinar mais do que uma lição sobre como se tira uma linha política, como se batalha pelos princípios ou se corrige erros, são parte fundamental da experiência e da tradição partidária.

Além disso, em cada capítulo e seção, os dados foram discutidos e avaliados com uma elaboração coletiva que levou mais tempo, mas isso permitiu-nos corrigir erros. Sabemos que nem todos. Você pode discutir os resultados e as conclusões deste trabalho, mas não o seu esforço para manter a precisão histórica e a busca franca da verdade, o levantamento de toda a documentação e eventual testemunho, sem exercer qualquer manipulação intencional sobre eles.

Nesse sentido, acreditamos que este trabalho pode ser útil para quem quer entender a história da classe trabalhadora na Argentina nas últimas cinco décadas, uma vez que o nosso partido foi parte dessa história. Além disso, é analisada a partir de um ângulo de abordagem do ativismo operário. Assim, também, nós quebramos as orientações gerais da historiografia tradicional, que tende a concentrar-se nas ações dos dirigentes sindicais, de maneira intencional, para  confundir o movimento operário com a burocracia sindical. Sem pretender encerrar a questão com esta pesquisa, acreditamos que é uma contribuição para o futuro.

Além disso, este trabalho está estruturado, primeiramente, colocando cada período da vida do partido dentro da situação nacional e internacional do quadro histórico correspondente, centrando-se nos aspectos fundamentais destes processos.

Embora a história da corrente comece em 1943, resulta inevitável iniciar, ainda que seja de maneira sintética, desde o surgimento do trotskismo como uma corrente distinta. Os fundadores da GOM não surgiram do nada. Portanto, começamos com o que poderia ser considerado a nossa “pré-história”: o desenvolvimento da Oposição de Esquerda Internacional, a fundação da Quarta Internacional e a atividade dos primeiros grupos trotskistas na Argentina.

Nós tentamos ser concisos ao expor a história da organização. No entanto, estamos conscientes de que este é uma obra extensa. É inevitável que o seja, porque não buscamos fazer um resumo, mas mostrar a trajetória partidária em todos os seus avanços e retrocessos, em seus acertos e erros. Nós preferimos nos estender para tentar mostrar a dinâmica real desses processos, muitas vezes contraditórios, com mudanças de rota, nos preocupar que perigo da síntese excessiva nos levasse a crer em um movimento linear, sem contradições.

Finalmente, queremos reiterar que esta não é uma história oficial”, nem buscamos fazer um balanço da nossa história, nem dar respostas às necessidades imediatas da luta de classes. Nossa intenção é apresentar a trajetória da organização para que o partido se conheça. Identificar-se com a sua tradição foi a maneira pela qual o partido conseguiu, mais de uma vez, superar as crises que o ameaçavam. Ser fiéis à nossa história também pode nos permitir redescobrir as forças para continuarmos nos desenvolvendo.

Se este trabalho consegue mostrar como o partido enfrentou situações mais adversas do que as atuais, superando o ceticismo e desânimo que dominou a vanguarda na difícil tarefa de construir a organização revolucionária, os nossos objetivos estarão mais do que satisfeitos.

Acesse os cinco volumes completos:

Tomo I: Del GOM a la Federacion Bonaerense del PSRN (1943-1955)

Tomo II: Palabra Obrera y la Resistencia (1955-1959)

Tomo III, Volumen 1: Palabra Obrera, el PRT y la Revolucion Cubana (1959-1963)

Tomo III, Volumen 2: Palabra Obrera, el PRT y la Revolucion Cubana (1963-1969)

Tomo IV, Volumen 1: El PRT La Verdad, ante el Cordobazo y el clasismo (1969-1971)

Todos os tomos foram editados pela Fundação Pluma.

Foto: montagem com imagens da capa dos 5 topos.