Perseguição a secundarista em Sorocaba: As instituições como instrumento político

Por: Ítalo Rosendo, Advogado militante de Sorocaba, SP

Na última quinta-feira (05), Lucas Dantas, estudante e engajado ativista foi arbitrariamente conduzido por forças policiais para “prestar esclarecimento”. A motivação alegada seria acerca do ato realizado em frente à delegacia de ensino da região.

Nesta ocasião, manifestantes colocaram simbolicamente fogo em apostilas antigas ­- e próprias – em denúncia as políticas e reformas impostas pelo Governo Federal, como a PEC 55 e reforma do ensino médio.

Policiais apareceram às 09h da manhã em viaturas da polícia civil, dentre eles do GARRA – Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos, com agentes armados na residência do Lucas (menor de idade), como se fosse um criminoso de alta periculosidade, para cumprir determinação de “busca e apreensão”.

Na delegacia seccional, acompanhado por advogado, o que se vislumbrou foi uma sequência de atos que deixou flagrante a intenção de criminalizar militantes e movimentos sociais através da intimidação institucional.

O delegado responsável, Alexandre Cassola, criou todo tipo de embaraço para a vista dos documentos que deram origem a busca e apreensão. O mandado de busca era genérico e abstrato: “buscar objetos ilícitos relacionados ao caso”.

Mesmo tendo sido negado acesso a documentação completa sobre o caso, e mesmo com a presença do advogado, só nos foi possível ler brevemente a solicitação da busca e apreensão.

O Estado, através de seu delegado, se deu ao trabalho de redigir cerca de 3 páginas dissertando sobre o estudante, destacando que, como liderança, estava presente nas ocupações das escolas estaduais e que era necessário tomar “providências”.

Não foi apontado, além do histórico de militância, qualquer crime ou contravenção. Ainda assim foi autorizado pelo judiciário.

Foram apreendidos na casa do estudante livros, tênis e camisetas. O delegado se recusou a devolver os objetos porquê eles passariam por perícia. Houve muita irritação quando apontado o absurdo da conduta de se apreender um tênis.

Quando questionado sobre o que afinal seria a perícia, os ânimos se exaltaram ainda mais. O delegado disse ainda em tom de deboche que se fosse o único tênis dele, que andasse descalço.

Ao ser apontado mais arbitrariedades sem qualquer respaldo em lei ou princípio, o delegado teve a coragem de ameaçar o advogado, o estudante e o pai do mesmo por “desacato” – para tanto, aumentou o tom de voz, acusando os demais de se exaltar.

Destacou que possuía testemunhas: Sua escrivã e o agente policial responsável pela realização da busca e apreensão. E ainda achou por bem chamar outro delegado, não identificado para acompanhar a procedimento, acusando as partes de fazer tumulto.

Foi recusado a entrega de qualquer cópia de documento, segunda via ou fotos da diligência e demais documentos objetos da busca. O delegado destacou ironicamente que iria dificultar, e seria necessário fazer um requerimento por escrito para ter acesso a qualquer documento, contrariando o mínimo de prerrogativas do defensor – requerimento esse que será feito, acompanhado de demais medidas administrativas e judiciais, tal como medidas a serem adotados por parlamentares e demais organizações do município.

A conclusão do episódio de hoje em Sorocaba serve para escancarar o que já se sabe. Que é certo – e é o momento de todos perceberem e não mais ignorar – que o Estado está monitorando a todos e irá criar todo tipo de embaraço para desmobilizar, desmotivar e causar algum tipo de medo àqueles que estão engajados na militância por uma sociedade voltada aos interesses do povo.

Foi flagrante a irritação da autoridade de se ter ali presente um advogado para contrapor de algum modo a estratégia de intimidação feita na surdina, de forma covarde e desproporcional. Foi mais do que nítido a despreocupação da autoridade quanto a observância dos princípios constitucionais que regulam o tema.

Afinal, se dar ao trabalho de fazer busca e apreensão de tênis, de surpresa, levando a família para a delegacia pela manhã, sem haver indicação de qualquer crime, é o que, se não intimidação para coagir ativistas engajados na mobilização social?

Ficou evidente que só a união que nos fortalece contra as instituições que tem como função, nada mais do que reprimir movimentos sociais e políticos para emancipação da humanidade. Contavam com a resignação, o medo. Tiverem o oposto.

Se as teses e linhas teóricas nos dividem, na delegacia com o delegado gritando e ameaçando pai, advogado e estudante, somos igualados. Mas juntos mostramos nossa resistência a qualquer conduta tirânica. Que resolvamos com maturidade nossas diferenças internamente e que na ação e resistência estejamos unidos. É com racionalidade que se luta.

A abordagem violenta, a condução abusiva, a busca e apreensão [de tênis e apostilas próprias] sem fundamento. A irritação com questionamentos e presença de advogado, a recusa do fornecimento de qualquer documento sobre o caso é de extrema gravidade.

Não se pode permitir que o Estado satisfaça caprichos junto a máquina pública para reprimir e perseguir militantes e ativistas. Todos os setores da sociedade devem se unir contra a criminalização dos movimentos sociais – lutar não é crime, resistir é direito.

O ano começou e estamos sendo atacados. Resistiremos e lutaremos unidos. E a vitória sempre nos pertencerá!

Foto: Victor Casale