Pular para o conteúdo
BRASIL

O que é a Lei de Responsabilidade Fiscal e a quem ela serve, afinal?

Por: Mayara Conti, São Paulo, SP

Em tempos de crise econômica, muito se ouve falar na tal Lei de Responsabilidade Fiscal. Um nome bonito, pomposo, que dá impressão de comprometimento e seriedade nas ações do governo. Mas, afinal, de onde ela surgiu e a quem ela serve?

Primeiro, é preciso falar da dívida pública…

Outro termo bastante utilizado ultimamente é o superávit primário, uma espécie de “economia” que o governo faz para conseguir pagar a dívida pública. Ou seja, o governo deixa de investir em áreas sociais elementares, como saúde e educação, para “economizar” e pagar essa dívida.

À primeira vista pode parecer uma atitude bastante plausível: se devemos, precisamos pagar, certo? Mas, será que essa dívida é legítima e realmente precisa ser paga às nossas custas?

Vejamos…

1) A atual dívida pública tem sérios indícios de ilegalidade e é resultado de inúmeras renegociações baseada na aplicação de juros flutuantes. A partir de 1979, as taxas cresceram astronomicamente, passando de seis para 20,5% ao ano.

Além disso, a dívida pública foi largamente ampliada durante os anos de ditadura militar no Brasil, ou seja, por governos completamente ilegítimos.

2) Não pensem que essa dívida foi contraída pelos governos para que pudessem investir em melhorias nas condições de vida do povo. Pelo contrário, parte significativa dessa dívida foi contraída por empresas privadas, e o governo, através do Banco Central, transformou-se em seu principal devedor. Ou seja, assumiu o compromisso de pagador no lugar dessas empresas.

3) A mesma dívida está sendo operada há anos numa espécie de esquema de agiotagem, onde cobra-se juros sobre juros e, consequentemente, ao invés de diminuir com o tempo, só aumenta!

Para se ter uma ideia, o montante da dívida “pública” atualmente gira em torno de R$ 3 trilhões. Ao mesmo tempo em que cerca de 47% do orçamento nacional é “reservado” para o pagamento dessa mesma dívida. Pagamos muito caro, anos a fio e ela parece nunca ter fim!

4) Esse ciclo vicioso da dívida obrigou o Brasil a assumir uma série de compromissos com o FMI e o Banco Mundial, no sentido de cortar gastos públicos para ter dinheiro para seguir pagando os juros da dívida.

E quem recebe todo esse dinheiro? Bancos internacionais são os principais credores da dívida pública brasileira.

Em resumo: O povo brasileiro não contraiu dívida alguma, não teve benefício algum em contrapartida pela dívida e mesmo assim já pagou por ela inúmeras vezes. E segue pagando, pois está refém de uma série de acordos que impedem que o governo gaste com aquilo que realmente importa.

É aí que entra o famigerado Superávit Primário e também a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Agora vamos à Lei de Responsabilidade Fiscal…

À atual política econômica (que surge nos anos FHC e segue praticamente inalterada nos governos petistas, privilegiando o superávit primário e o pagamento da dívida) se soma a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), aprovada em 2000.

Este é mais um instrumento utilizado como limitador dos investimentos sociais no Brasil, talvez o principal deles.

Somente neste ano, a aplicação da tal Lei de Responsabilidade Fiscal foi a grande “desculpa” utilizada para inúmeros ataques que vieram dos estados e municípios brasileiros, bem como do próprio governo federal e do congresso nacional.

No Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, recentemente, assistimos à desproporcional repressão desferida sobre os servidores públicos, simplesmente porque exigiam o pagamento do salário em dia e o não aumento do desconto previdenciário nos seus já achatados rendimentos.

Na ALERJ, deputados “mascarados” (Para não sentir o efeito do gás de pimenta que eles mesmos ordenaram que a PM despejasse sobre os manifestantes do lado de fora) votavam o “pacote de maldades” apoiado na LRF.

A LRF foi criada se apoiando na falsa ideia de que o problema das contas do país é porque o governo gasta muito e que é preciso controlar esses gastos. Mas gasta muito onde, cara pálida? Com que?

Se não tem saúde pública de qualidade e as pessoas estão morrendo nas filas dos hospitais no país inteiro? Se não tem vagas para as crianças nas creches e nem para os jovens nas universidades? E ainda assim as vagas que existem no ensino fundamental e médio são super precarizadas. Se não tem moradia popular paro povo viver em paz, nem saneamento básico?

Não tem, “falta”, “não há verbas” são as frases mais ouvidas pelo povo diariamente!

O governo gasta muito sim, mas não com povo. Prefere gastar com os banqueiros credores da dívida pública da qual falamos anteriormente. Esse sim é um gasto que precisa ser revisto e imediatamente cortado!

O dinheiro está sendo tirado do povo, e das suas necessidades mais básicas, para ser “economizado” e entregue de mão beijada aos grandes bancos internacionais! E quando o povo se revolta com essa situação, ainda é vítima de repressão!

Isso sem falar na Reforma da Previdência, Reforma Trabalhista e na PEC do Fim do Mundo, que merecem um capítulo à parte nessa história toda.

Isso tudo faz sentido? Vamos refletir um pouco mais…

O governo corta gastos das áreas sociais, não investe em educação de boa qualidade, nem em saúde ou moradia e deixa livre um amplo mercado que pode ser explorado pelas empresas privadas!

Claro, até porque quantos governantes não são eles próprios donos dessas empresas? E ainda guardam um montão de dinheiro para pagar a “dívida pública” e ficar bem na fita com os banqueiros internacionais e com o FMI.

A dívida pública nada mais é do que um instrumento econômico de dominação do capital estrangeiro e das grandes empresas. E ideológico também de certa forma, se pensarmos que somos levados a acreditar que o governo está sendo “responsável” e fazendo o certo, quando “corta gastos”. Basta assistir meia hora de rede Globo para acreditar que a culpa da crise é nossa.

Essa é a “lógica” do capitalismo. Esse é o sentido que tem a Lei de Responsabilidade Fiscal nisso tudo. Ou seja, para nós não faz sentido algum. Estamos simplesmente sendo enganados.