Por: Carmem Toboso
“Não existe divisão de classes no Brasil,
todos são brasileiros”
(Ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira)
“O governo acaba de ganhar um belíssimo
presente de Natal”
(Presidente Golpista, Michel Temer)
Em 22 de dezembro, o governo Temer assinou duas medidas provisórias e anunciou projeto de lei da reforma trabalhista. Estiveram presentes e discursaram em apoio às medidas quatro centrais sindicais: UGT, CSB, FS e NCST. Também compareceram várias confederações patronais como as que representam os empresários do comércio e da indústria, além da sempre presente FIESP.
As medidas provisórias trataram de dois temas: FGTS e mudanças no Programa de Proteção ao Emprego (PPE). Sobre o FGTS, foi anunciado que os trabalhadores com contas ativas no Fundo, aquelas que recebem depósito por parte do empregador, poderão se beneficiar dos lucros que as aplicações geram. Outro item é o dinheiro de contas inativas até 2015, dessa forma o trabalhador poderá acessar o saldo, se houver, de contratos de trabalho anteriores. A outra medida provisória trata da mudança de nome do Programa de Proteção ao Emprego (PPE) para Segura Emprego e de sua prorrogação por mais dois anos. Esse é o programa que possibilita reduzir salários e jornada.
As medidas mais importantes são aquelas que alteram a CLT e serão enviadas para o Congresso Nacional na forma de projeto de lei. Até o final do dia do anúncio, nem as medidas provisórias, nem o projeto de lei foram divulgados. Ainda assim, não há dúvida alguma sobre o caráter e a direção das medidas.
Trata-se de medidas cujo caráter revelam que são parte dos profundos ataques do governo Temer à classe trabalhadora, e a direção das propostas apresentadas é a da flexibilização e precarização das relações de trabalho. Essa medidas devem ser encaradas tão seriamente quanto foi a PEC 55 (PEC da Morte), ou até mesmo com mais preocupação, pois se a PEC estabeleceu limite de 20 anos para o corte no gasto público com saúde e educação, as mudanças na legislação trabalhista não têm prazo de validade.
As medidas podem ser divididas em três grandes grupos: negociado sobre o legislado, regime de contratação e fiscalização e prazos na justiça do trabalho.
A discussão do negociado sobre o legislado coloca em xeque todo o conteúdo da CLT, modifica profundamente a forma da negociação coletiva ente trabalhadores e patrões e, consequentemente, afeta toda a estrutura de atuação dos sindicatos. Seria excelente que todos esses temas sofressem modificações profundas, porém a correlação de forças nesse momento não está nada favorável para mudanças que beneficiem os que vivem do salário.
Na história recente, a defesa do princípio de fazer valer o resultado de negociações diretas entre sindicatos e patrões sobre a legislação vigente chegou a partir dos próprios trabalhadores. Em 2011, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, lançou a proposta do ACE (Acordo Coletivo Especial). Naquele momento a avaliação desse poderoso sindicato sobre a CLT era idêntica à que foi apresentada hoje pelo governo, empresários e outras entidades sindicais presentes que não a própria CUT.
Afirmava que a CLT: “(…) estabeleceu um excessivo controle do Estado sobre a relação entre capital e trabalho. Tolheu a liberdade sindical e restringiu o campo das negociações coletivas, elementos indispensáveis na vida democrática, que são exigidos nas convenções da Organização Internacional do Trabalho/OIT, das Nações Unidas1” (SMABC, 2011, pg. 13)
Esse setor da CUT fazia ressalvas dizendo que a CLT era uma faca de dois gumes: tanto protegia, quanto “amarrava” o trabalhador. O trecho acima deixa claro que o discurso de ampliar a liberdade de negociação para além da CLT não seduz apenas patrões, seduziu também trabalhadores.
O desenrolar desse tema vai demonstrando que a liberdade de negociação tem sido defendida de forma conjuntural, ou seja, se a conjuntura é mais favorável ao capital, os patrões bradam por negociar diferente do que prevê a CLT, se os trabalhadores entendem que têm poder de barganha, fazem o mesmo.
Mas, nem todos setores da classe compartilham da visão de que o Estado e as leis são neutros, ou que podem até mesmo beneficiar os trabalhadores. Centrais como a CSP-Conlutas e a Intersindical nunca foram convencidas, ao menos desde que foram criadas, que a flexibilização da legislação pode beneficiar o trabalhador. Quaisquer alterações na relação capital-trabalho implicam em ganhos, ou perdas para cada uma das partes, e não seria adequado promover mudanças que possam significar perdas com relação ao que já existe, não se pode arriscar.
Entre os temas que foram anunciados como passíveis de prevalência do negociado sobre o legislado estão:
a) Férias;
b) Banco de horas;
c) Horas itinere;
d) Reduçao do tempo de descanso/almoço.
e) PLR/Prêmio por produtividade
Outro conjunto de mudanças está relacionado ao próprio tipo de contrato de trabalho. Foram anunciadas medidas para estimular a contratação em regime temporário e em regime parcial de trabalho. Atualmente, o contrato temporário prevê o prazo máximo de 90 dias, prorrogável por mais 90, a proposta altera esse prazo para 120 dias de contrato e mais 120 de prorrogação. Os trabalhadores temporários poderão substituir trabalhadores permanentes afastados por motivo previdenciário como, por exemplo, acidente de trabalho.
O incentivo para a contratação em tempo parcial veio na forma de ampliar a jornada máxima de 25 horas para 26 horas semanais com possibilidade de 6 horas extras na semana, ou limite de 30 horas semanais sem possibilidade de realização de horas extras.
Essas medidas foram anunciadas como auxílio na redução do desemprego, o que é completamente falso. A geração de emprego depende da abertura de novas vagas por decisão dos empresários, e esses só fazem isso se têm a perspectiva de vender o que for produzido. Nem o trabalho gratuito seria utilizado se fosse para produzir o que não tem perspectiva de ser vendido. Na conjuntura atual, a única forma dessa medida contribuir para a redução do desemprego é se um trabalhador demitido der lugar a dois contratados nesses regimes diferenciados. Por outro lado, cada trabalhador precisará de, ao menos, dois empregos para sobreviver.
Por fim, um último conjunto de itens dizem respeito à fiscalização e funcionamento da justiça do trabalho. Foi anunciado o aumento das multas para as empresas que forem flagradas com trabalhadores em situação irregular (sem carteira assinada).
Para fins de contagem dos prazos em processos na justiça do trabalho ficarão excluídos os finais de semana e feriados, valendo apenas os dias úteis. Esse último ponto teria atendido uma reivindicação dos advogados trabalhistas.
O maior detalhamento e aprofundamento da análise requer, em primeiro lugar, que essas medidas sejam integralmente publicadas e, em segundo lugar, que sejam exaustivamente discutidas por toda a sociedade.
Dentre as centrais sindicais, não participaram do anúncio e manifestaram críticas ao conteúdo a CSP-Conlutas, Intersindical, CUT e CTB. As demais vergonhosamente apoiaram a precarização, a flexibilização dos direitos do trabalhador.
*Carmem Toboso, [email protected]
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