Por: Zuleide Queiroz, do Cariri, CE
Nosso ponto de partida foram os últimos acontecimentos ocorridos no Ceará. Em especial na região do Cariri, a morte da juventude. Sim, juventude negra e pobre.
Após realizarmos 16 dias de ativismo contra a morte de mulheres, constatamos que a maioria são jovens e negras. Atualmente, amargamos o número de 25 mulheres mortas brutalmente e o desaparecimento de duas jovens no Cariri, Sul do Ceará. Vivenciamos, ainda, a triste realidade de jovens mortos no último final de semana, deixando a população pobre, da periferia, com medo de sair de casa e mães com medo dos seus filhos andarem pelas ruas.
Por que estamos falando da juventude, neste trágico balanço de tanta violência? Porque sabemos da dura realidade que vive parte desta. Não podemos negar o que tempos atrás nos alertou Pierre Bourdieu, quando falava da existência de duas juventudes: “A experimentada pelos filhos da burguesia e outra, bastante restrita e quase ausente, vivenciada pelos filhos dos operários. Ignorar tais diferenças de classes no estudo da juventude significa contribuir para a ideologia dominante de reprodução de privilégios”, apontou Raquel Lima.
O que estamos vivenciando no Cariri nada mais é do que um recorte da terrível situação que vive o Brasil. Quando olhamos os números de óbitos por arma de fogo no Brasil, a partir do “Mapa da Violência 2015 | Mortes Matadas por Armas de Fogo”, nos últimos anos, encontramos 815 mortes em 2002, passando para 3.161, em 2012.
O crescimento das mortes no Ceará foi tão grande que sua posição no Mapa passou de 20º lugar em 2002, para 3º em 2012. Deste alarmante crescimento, vamos encontrar a população jovem cearense. Os dados do Ceará acerca da morte por arma de fogo, de jovens, no ano de 2002 foi 459, saltando em 2012 para 2.037 jovens.
No contexto do debate sobre as diferenças entre ser jovem com condições financeiras e ser jovem pobre no Ceará, imediatamente chegamos à constatação de que as principais vítimas são negros e pobres.
Nos dados de 2012, as Armas de Fogo “vitimaram 10.632 brancos e 28.946 negros, o que representa 11,8 óbitos para cada 100 mil brancos e 28,5 para cada 100 mil negros”. Na verdade “morreram, proporcionalmente, e por arma de fogo, 142% mais negros do que brancos: duas vezes e meia mais”, aponta estudo.
No Ceará, o número e taxas de homicídios (por 100 mil) com arma de fogo, segundo cor e UF/Região, em 2003, foi de 92 mortes de pessoas brancas e 189 pessoas negras. Em 2012, foram mortos 382 jovens brancos e 1.499 jovens negros. Diante desta realidade cruel, precisamos entender que a violência no Brasil e no Ceará tem lugar, tem cor e tem gênero.
O que aconteceu no Cariri cearense, com 17 assassinatos em Juazeiro do Norte, Crato e Barbalha, até o momento, no período de 16 a 18 de dezembro, de acordo com a SSPDS, vem a ser caracterizado como “extermínio da juventude pobre e negra”. Estas mortes da juventude superaram, no mesmo período, o número de mortos na capital Fortaleza, com 15 homicídios no mesmo período.
O que podemos apontar?
Precisamos reconhecer esta situação, e diante da indignação, transformá-la em luta e, de forma organizada, em 2017, continuar a luta pela manutenção das políticas públicas e contra a PEC 55.
A população do Ceará e do Cariri precisa ver estes números com indignação porque eles falam da sua juventude, da sua população, das famílias e das mães que perderam seus filhos e, neste sentido, também são vítimas de violência.
Foto: Jonathan Lins (G1)
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