Por Mariana Shinohara Roncato, de Tóquio, Japão
Em Tóquio, para o Dia Internacional do Migrante (18 de dezembro), trabalhadoras (es) imigrantes e pessoas solidárias à causa se reuniram numa atividade-festa. Com a exibição do filme “Occupy Bakery” (The hand that Feeds) que retrata a luta de imigrantes latinos de Nova Iorque em busca de melhores condições de trabalho, o clima era de denúncia, reflexão e reunião de energia para futuras lutas. Organizada pela Solidarity Network with Migrants Japan (Rede Nacional de Solidariedade aos Imigrantes) e com apoio do Labor Net Japan, a atividade contou com a presença de diversas organizações que lutam pela causa do imigrante, sindicatos dos trabalhadores imigrantes, bem como ativistas independentes. Assim como em diversas partes do mundo, os imigrantes do oriente não estão parados!
Mas o que a é causa/temática do imigrante?
Podemos dizer que a (o) trabalhadora (or) imigrante é a figura paradigmática, a cara do capitalismo hoje, pois nela se consubstancia de maneira mais agudizada o que tem de mais perverso; a exploração, o racismo e o machismo. Sua existência é frequentemente invisibilizada pela sociedade, inclusive por parte de movimentos trabalhistas locais. Deste modo, sua causa se traduz na luta por melhores condições de trabalho, denúncia da discriminação e da xenofobia ou apenas a reivindicação do direito de permanecer livremente no país, afinal, nenhum ser humano é ilegal!
O modelo japonês, o imigrante e a mulher
Os problemas enfrentados no Japão não poderiam ser diferentes. A terceira maior economia do mundo enfrenta um longo período de deflação e estagnação econômica, não obstante, sua taxa de desemprego é de apenas 3 %. Por trás deste baixo número se encontra a chamada crise demográfica gerada pelo envelhecimento populacional (pessoas com mais de 65 anos somam 26 % da população) e a baixa taxa de fecundidade de 1,4 filho por mulher. A população como um todo encolhe, assim como sua população economicamente ativa diminuiu mais de 1 milhão de 2014 para 2015. Ou seja, o Japão carece de força de trabalho, mas esta precisa ser barata, disponível e na medida de sua necessidade. Prolifera o trabalho informal, o que faz com que em 2015, 37,4 % dos trabalhadores japoneses não tinham contratos efetivos de trabalho, isto é, sujeitos à informalidade, sendo que destes 68% eram mulheres e 32 % homens. Trabalhos precários de tipo part-time job, terceirizados, arbeit (trabalho de tipo temporário e informal), freeters (jovens que vivem somente de trabalhos informais e temporários) e por fim o trabalho do imigrante não param de crescer.
No ocidente dizia-se que o toyotismo ou o modelo japonês se baseava no emprego vitalício. Porém, como afirmou o jornalista Satoshi Kamata que estudou o Sistema Toyota de Produção, “O sistema de emprego ‘vitalício’ nunca existiu de fato”, pois este sempre excluiu as mulheres, os trabalhadores temporários e os imigrantes. Estando à margem do modelo japonês, grande parte dos mais de 2 milhões de estrangeiros – em sua maioria chineses, coreanos, brasileiros, vietnamitas e filipinos— exerce o trabalho rejeitado pela população local. Estão na indústria como os dekasseguis brasileiros, nos serviços, na indústria do sexo, no trabalho de cuidado e de limpeza. Predominam a informalidade, as longas jornadas de trabalho e os salários mais baixos que o trabalhador japonês, bem como são mais suscetíveis ao desemprego. Se isso não bastasse, a imigrante brasileira, por exemplo, chega a ganhar 20- 30% a menos que seu companheiro homem. Naturalmente estão mais sujeitos ao preconceito racial, étnico e os diversos tipos de discriminação e estigmatização por serem estrangeiros, com especial agravamento para as mulheres imigrantes.
O primeiro-ministro japonês Shinzō Abe tenta alavancar a economia japonesa através dos estímulos econômicos (com os pilares na flexibilização monetária, estímulo fiscal e na infraestrutura) conhecidos como Abenomics. Tramita no Parlamento japonês a revisão de suas leis migratórias, com a possibilidade de atrair o “trabalhador-convidado” imigrante por um período determinado a fim de suprir a carência nos setores de cuidado, enfermagem e construção civil, este último destinado especialmente para os Jogos Olímpicos de 2020. Da parte do trabalhador, porém, apesar da imensa riqueza nacional, o último Censo de 2012, bem como a pesquisa realizada pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) mostraram que 16% da população japonesa poderia ser considerada como pobre, sendo umas das maiores taxas dentre os países do capitalismo central.
Neste cenário, a mulher e o imigrante são os primeiros a sofrerem as mazelas das oscilações econômicas, assim como são o “protótipo do trabalhador flexível” como afirma o sociólogo italiano Pietro Basso. No entanto, como podemos ver no caso japonês, apesar de serem este protótipo, tal condição de trabalho se alastra para o resto da população. Por isso, se de um lado tentam nos separar por raça/etnia e gênero, de outro, as condições de trabalho se convergem.
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