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EDITORIAL

Ajuste ou desajuste entre os de cima?

A semana foi marcada por enorme crise entre os poderes no Brasil. O Judiciário, fortalecido pela Lava Jato e apoiado pela opinião pública, quer mais poderes, mais autonomia, mais liberdade para investigar e prender. O Congresso Nacional, desmoralizado pelos escândalos de corrupção, tenta salvar a própria pele em manobras impressionantes.

Na mesma noite da aprovação da Pec 55, a Câmara aprovou o texto base do projeto “10 medidas contra a corrupção“. Entretanto, ao mesmo tempo, foram aprovadas 12 emendas que desfiguraram o projeto. Foi a verdadeira revanche dos corruptos: aprovaram que os juízes e integrantes do Ministério Público (MP) respondem por crime de abuso de autoridade quando atuarem com conduta incompatível com o cargo. A proposta de emenda foi do Deputado Weverton Rocha, do PDT. O projeto agora vai para apreciação no Senado. O objetivo da medida é ter uma moeda de troca. Assim, o Congresso teria um poder de barganha contra os juízes e promotores, podendo criminalizar sua atuação.
 
Há um forte desajuste institucional. As crises estouram todos os dias. A cúpula do PMDB, incluindo Temer, sabe que a delação de Cunha e da Odebrecht deve ter produzido provas mais do que contundentes para derrubar todos eles. As espetaculares prisões do Rio de Janeiro, comemoradas pela população, foram uma mostra do poder e do apoio que o juiz Sérgio Moro e a operação Lava Jato tem na grande maioria da população.
 
O medo tomou conta do Planalto. Temer sabe que governa um país muito instável. O presidente tem baixa popularidade, não foi sequer eleito. Não há margem de manobra, a crise econômica é forte. A força de Temer, no entanto, vem da expressiva maioria no Congresso Nacional e da disposição de aplicar um ajuste feroz contra os trabalhadores e os serviços públicos. O presidente Temer sabe que é mantido pelos ‘de cima’ e não pelos ‘de baixo’.
 
O golpe institucional que levou Temer ao poder foi articulado por uma aliança poderosa: o capital financeiro internacional, a maioria da burguesia nacional, a maioria da classe média, a grande mídia, o bloco de partidos que tem mais de dois terços do Congresso Nacional e o poder Judiciário.
 
Nesse momento, contudo, há uma evidente crise entre eles. Temer e a cúpula do PMDB causam mal estar na classe média. Nas camadas médias, o ódio ao PT é muito maior do que o amor a Temer. Fernando Henrique Cardoso chegou a falar para imprensa: “ele não é uma ponte, é uma pinguela. É frágil, mas é o que tem.”
 
Até a nova direita se estremeceu. Parece haver divergências entre o MBL e o Vem pra Rua. O primeiro quer manter a mira no Congresso Nacional, enquanto o “Vem pra Rua” parece estar disposto a atacar Temer. Será que veremos um “Fora Temer” pela direita? Nada está descartado na crise política brasileira.
 
Estamos contra o Congresso dos corruptos e também o autoritarismo dos Juízes
De um lado, Renan Calheiros lidera a tropa de defesa dos corruptos. As 15 emendas sobre o “projeto 10 medidas contra a corrupção” são um show de horrores. Não é possível apoiar uma emenda contrária ao fim da prescrição dos crimes relacionados aos desvios de recursos públicos. Apoiar essa medida seria o livre conduto para o roubo, a conivência total com os crimes de colarinho branco. Neste sentido, a bancada do PSOL se posicionou corretamente ao votar contra. Importante registrar que apenas outros 3 partidos foram contra: PV, PPS e Rede.
 
Entretanto, o extremo oposto também é um erro total. Apoiar a Lava Jato, posicionar-se favorável ao projeto de lei do Juiz Moro, é perder por completo a referência de classe. Sabemos que o projeto é popular, mas não vale tudo para ganhar votos. A tarefa da esquerda socialista é propor outras 10 medidas que combatam a corrupção, cobrem a fatura das empresas corruptas e corruptoras, e mudem radicalmente o financiamento de campanha, que é comprovadamente fonte de negociações ilícitas.  
 
Não se pode apoiar um projeto que autoriza o judiciário a produzir provas ilícitas, amplia os poderes de uma instituição que é comprovadamente seletiva e reacionária. Um sistema penal mais punitivo não prejudica igualmente as duas classes sociais. O Estado tem um caráter de classe e é por isso que os negros e pobres são a ampla maioria dos presos brasileiros. A esquerda não pode ficar refém das medidas dos procuradores e do Juiz Sério Moro. Neste caso o melhor caminho seria construir outro projeto de lei.
 
Estamos contra o congresso de corruptos e também contra os juízes, não há um lado “menos pior”. Um dado interessante para ver a parcialidade do poder judiciário é o debate sobre os supersalários. Entre juízes e promotores, muitos, possivelmente a maioria, recebem acima do teto constitucional. Ou seja, recebem acima de R$ 33.736 reais. É um escândalo. O Esquerda Online já publicou uma matéria que denuncia de como o CNJ usou o auxílio moradia para burlar o teto constitucional. Como estes senhores que recebem salários 20 vezes maiores que a média do trabalhador brasileiro podem ser os melhores para julgar e aplicar a lei?
A disputa atual é uma luta corporativista de poder, em que a classe trabalhadora não tem vez. De um lado, corporativismo do Ministério Público e do judiciário pra não serem afetados por abuso de autoridade; do outro, a vergonhosa auto anistia dos parlamentares, que estão com medo da Lava Jato.
 Eles estão todos juntos em defesa do ajuste fiscal
É preciso uma avaliação sóbria da crise política atual. Por um lado, é verdade que existe muita crise entre os de cima. Por outro, é um fato que todos eles estão unificados no projeto de ajuste fiscal e de ataque aos direitos sociais no Brasil. A PEC 55 foi aprovada em tempo recorde. Neste aspecto o governo Temer se mostrou muito útil para os articuladores do golpe.
 
O ataque à classe trabalhadora é o ponto que unifica o congresso, o executivo e o poder judiciário. Os três poderes da república estão comprometidos e alinhados com um remédio amargo para a grande maioria da população. O ajuste vai trazer mais recessão. Os números indicam que não há espaço para o otimismo, no terceiro trimestre de 2016 a retração do PIB foi de 0,8. Conseguiram frear o ritmo da queda, mas o país continua caindo.
 
Até agora as grandes crises institucionais não foram expressões distorcidas entre os interesses da classe trabalhadora por um lado e da burguesia por outro. Os conflitos têm sido, ora entre frações burguesas, ora entre instituições de República. Os de cima estão todos juntos na defesa do ajuste fiscal e da retirada de direitos. Por isso, a PEC 55 foi aprovada com tanta facilidade e a grande imprensa exige todos os dias a reforma trabalhista e previdenciária.
 
 Mais do que nunca a tarefa é organizar a resistência da classe trabalhadora. O dia 29 de novembro não pode ser um ponto final. As ocupações da educação precisam ganhar as ruas e construir mais e mais força social contra o ajuste. A vitória dos servidores do Rio contra o pacote de Pezão mostrou que é possível ter vitórias. Temer não terá um dia de sossego. Fora Temer. Eleições Gerais já.
Foto: Geraldo Magela / Agência Senado.
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crise política