Por: Waldo Mermelstein, de São Paulo, SP
A ofensiva contra o autodenominado Estado Islâmico (EI) que tem como centro a retomada de Mossul, no Iraque, ganhou um novo front de combate direto ontem (6), com o anúncio feito pelas Forças Democráticas da Síria (FDS) de que começariam imediatamente a batalha para retomar Raqqa, na Síria. Esta cidade, de maioria árabe sunita, é o centro do EI na Síria e onde se acredita estarem seus principais quadros e desde onde são planejados seus atentados no Ocidente. A fase que começou, segundo os representantes das FDS seria a do cerco à cidade, que prepararia o assalto a ela em poucas semanas.
O detalhe importante é que dois terços dos combatentes das FDS são curdos organizados nas Unidades de Proteção Popular (YPG, em sua sigla em curdo) que nesta operação recebem o apoio de 300 membros das forças especiais americanas.
As negociações sobre esse tema serão particularmente delicadas, pois o governo da Turquia está envolvido em um duro ataque contra o principal partido representante dos curdos dentro do próprio país, o Partido Democrático dos povos (HDP). Além disso, mantém uma guerra contra as YPG na Síria, inclusive ocupando uma faixa de território sírio desde agosto para evitar qualquer tipo de autonomia dos curdos, além da permanente guerra que trava contra o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) no Iraque. Negociar os termos desse envolvimento curdo parece ter sido a razão de uma reunião neste domingo em Ancara entre o chefe do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA, Joseph Dunford e os generais que comandam o exército turco.
A batalha por Mossul continua
O cerco a Mossul se fechou e as variadas forças que o compõem começaram a entrar nos subúrbios da cidade.
Na semana passada, as forças especiais do exército iraquiano ocuparam o canal de Televisão da cidade e começaram a entrar pelo Sul e pelo Leste. Os combatentes peshmergas curdos o fazem também pelo Norte e pelo Leste e as milícias xiitas rumam em direção a Tal Afar, a Oeste da cidade, para fechar a rota de fuga dos militantes do autodenominado Estado Islâmico (EI) em direção à Síria.
Em geral, as notícias giram em torno dos mapas do avanço de cada uma das forças, mas o grande debate não é se a cidade será tomada, mas quando, como e o que será do Iraque a partir disso.
Há várias questões que estão por se definir
Em primeiro lugar, não está claro que grau de resistência oferecerão as tropas do EI quando os ataques chegaram ao centro da cidade. Ainda mais se suas rotas de fuga forem cortadas, se é que parte da direção e das próprias tropas já não deixou a cidade nos meses que antecederam o ataque amplamente anunciado e previsível. As notícias mais recentes revelam sinais que há resistência importante, rua por rua, inclusive com a utilização de túneis, o que fez com que as tropas do exército iraquiano tivessem que se retirar de Al- Karamah, um subúrbio leste de Mossul.
Por outro lado, e este não é um dado menor, não está clara qual a real dimensão da população civil, em que condições está e como se comportarão as tropas ocupantes com ela. Se o que ocorreu em situações similares em menor escala, como em Falujah, com as execuções e horrores perpetrados pelas milícias xiitas, a tragédia poderá ser multiplicada pelo fato de ser a segunda cidade do país. E as condições para a reconstrução do EI ou de grupos sectários similares serão recriadas.
Já há várias dezenas de milhares de refugiados em precários campos fora da cidade e muitos milhares perambulando pelas estradas em fuga dos povoados em que as batalhas ocorrem e mesmo os que já conseguiram fugir da cidade. Tudo isso será multiplicado consideravelmente quando os combates atingirem a área central de Mossul propriamente dita, que ainda contém pelo menos algumas centenas de milhares de habitantes.
Por último, não está resolvida a disputa interna entre as forças que participam e/ou apoiam o ataque a Mossul, tanto as locais (curdos, milícias xiitas, governo iraquiano e milícias sunitas) como as potências regionais, em particular a Turquia e o Irã, que têm interesses conflitantes e tentam avançar o mais rápido possível para obter as maiores vantagens possíveis no Iraque que resultará desta batalha.
Comentários