Eleições na Espanha: Algumas reflexões sobre a reeleição de Rajoy

André Freire

Historiador e membro da Coordenação Nacional da Resistência/PSOL

Por André Freire, colunista do Esquerda Online

No sábado, dia 29 de outubro, o Parlamento do Estado Espanhol reelegeu Mariano Rajoy como primeiro ministro. Sua reeleição marca uma nova fase na crise política e institucional nesse importante país europeu.

Desde as eleições de 20 de dezembro de 2015, e mesmo com a sua repetição em 26 de junho desse ano, não havia sido possível aos principais partidos, com assento no Parlamento Estatal, chegarem a uma maioria que permitisse a constituição de um novo governo. Foram 315 dias em que Rajoy chefiava apenas um governo interino, na maior crise política da história recente deste país. Vale lembrar que no Estado Espanhol persiste uma Monarquia Constitucional, com um regime parlamentarista.

Mesmo nesta eleição, realizada dentro do Parlamento, Rajoy não obteve maioria. Ele contou com apenas 170 votos dos 350 deputados, a partir de uma coalizão que incluiu o seu próprio partido, o conservador Partido Popular (PP), mais o Cidadãos e a coalizão Canária. Na verdade, se tornou o primeiro-ministro com menor apoio parlamentar desde 1978, quando se instituiu o atual regime político.

Sua eleição só se viabilizou porque a maioria esmagadora dos deputados do Partido Socialista Espanhol (PSOE) votou abstenção na eleição para escolha do Premiê. Dos 85 deputados do PSOE, 68 optaram pela abstenção, o que viabilizou mais um governo do PP, com Rajoy a frente.

Foi uma vergonha e mais uma traição do PSOE. Não bastasse ter chefiado vários governos estatais que aplicaram o mesmo receituário de ajuste econômico sobre os ombros do povo trabalhador, agora, mais uma vez, demonstra sua total adaptação ao regime e sua submissão aos ditames da União Europeia, jogando um papel decisivo para que se viabilizasse um novo governo do PP.

Agora, o Estado Espanhol, com o novo governo Rajoy (PP), buscará intensificar ainda mais a aplicação dos planos de ajuste, ampliando os já terríveis ataques aos direitos da classe trabalhadora e da maioria do povo.

Felizmente, os deputados da Esquerda Unida e do Podemos votaram contra a investidura de Rajoy. E, no mesmo dia, houve um grande protesto na Praça Puerto Del Sol, palco principal dos protestos do movimento dos “Indignados”, demonstrando que haverá uma forte resistência do povo trabalhador a mais este novo governo lacaio da Troika.

Reeleição de Rayoy e as tarefas da esquerda
A reeleição de Rajoy pelo parlamento do Estado Espanhol merece atenção e discussão entre os ativistas de todo o mundo. É mais uma demonstração da necessidade prioritária da construção de uma nova alternativa de esquerda, socialista, do povo trabalhador, da juventude e do conjunto dos explorados e oprimidos. O fracasso dos governos de conciliação de classes do PT no Brasil e o papel mais uma vez nefasto do PSOE no Estado Espanhol são confirmações infalíveis dessa imperiosa necessidade.

Uma nova alternativa que tenha a firme convicção de enfrentar os governos da velha direita, como Rajoy no Estado Espanhol e Temer no Brasil, prioritariamente a partir das lutas de resistência da classe trabalhadora e da juventude, mas que seja também uma ruptura completa e uma superação de uma esquerda vacilante, que optou e opta pelas alianças com setores da grande burguesia e seus representantes na política e pela aplicação de programas, quando estão à frente de governos, que não rompem qualitativamente com os planos de austeridade da burguesia.

Demonstra também como era equivocada a política da direção de Podemos que buscou, durante vários meses, viabilizar um governo em aliança com o PSOE. Afinal, um governo como esse só seria possível com a aplicação de um programa de concessões, que não seria para nada uma ruptura com os planos de austeridade da Troika.

No Brasil, no próximo período, estaremos diante de uma discussão semelhante a essa, que cruzará os debates no interior da esquerda socialista. Nas luta contra os ataques do governo ilegítimo de Temer estaremos, em muitos momentos, ao lado da militância do PT.
É correta a construção de uma ampla unidade de ação para que busquemos derrotar o verdadeiro “pacote de maldades” de Temer. Porém, é um grave erro político estender essa importante unidade na ação para a construção de uma alternativa política de esquerda que inclua dentro dela o PT. Pois, aceitar a proposta da chamada “frente ampla”, defendida por Lula e outros dirigentes petistas, será atrelar o futuro da esquerda socialista aos graves erros das administrações do PT; sua composição com a burguesia e sua política econômica que em nada significou uma ruptura com os interesses das grandes empresas e bancos.

Nesse momento, no qual existe uma ofensiva de ataques dos patrões e seus governos sobre a classe trabalhadora e a juventude, precisamos olhar com atenção o exemplo do Estado Espanhol. O caminho que a esquerda socialista precisa trilhar deve passar bem longe de alianças políticas com partidos como PSOE e PT, que já se adaptaram à ordem vigente.

Nossos esforços devem estar completamente voltados para a construção de uma verdadeira Frente de Esquerda e Socialista, a partir das lutas de resistência do povo trabalhador, e que se constitua como uma nova alternativa política, sem nenhuma aliança com setores da burguesia e com um programa de ruptura com a velha política de governar segundo os interesses dos ricos e poderosos. Vamos à luta!

Foto: Domínio Público