Petrobras detalha como pretende entregar a produção de combustíveis às multinacionais

Por Pedro Augusto, ABC Paulista

A diretoria da Petrobras esteve em peso na Rio Oil & Gas, feira da indústria de petróleo que acontece no Rio de Janeiro desde segunda-feira (24) e termina nesta quinta-feira (27). A Petrobras foi a grande atração do evento, mas não da forma como ficou conhecida ao longo, pelo menos, dos últimos 30 anos.

No último período, o grande destaque da Petrobras foi o aprimoramento de suas tecnologias de exploração em águas profundas, especialmente desde a descoberta do Campo de Marlim na Bacia de Campos, em 1985. O destaque da Petrobras dessa vez foi de outro tipo. Esteve como uma mercadoria posta à venda.

Os diretores da estatal apresentaram detalhes do Plano de Negócios 2017-2021, que coloca US$ 19,5 Bilhões em ativos da Petrobras à venda até 2018. Esse valor soma-se aos US$ 15,6 Bi que o plano anterior pretendia vender até o final deste ano de 2016.

Venda casada de refinarias e estrutura logística
A grande novidade foi a informação divulgada pelo Diretor de Refino e Gás, Jorge Celestino, de que a Petrobras pretende incluir ativos de logística na venda de participações nas refinarias, a partir do ano que vem. Segundo o diretor, em palestra nesta segunda-feira (24), a ideia é criar uma empresa que controle as refinarias e a logística, e vender parte dela às empresas privadas.

O pulo do gato, entretanto, está no modelo de negócio que a Petrobras pretende oferecer ao seu futuro sócio: a possibilidade deste controlar desde o fornecimento de petróleo até o destino dos derivados produzidos. Nas palavras de Celestino: “É um modelo que dá ao investidor gestão sobre as suas margens”.

Esse modelo, caso seja realmente implementado, muda completamente a forma de atuação da Petrobras no abastecimento de derivados para o Brasil. Até então, o abastecimento de combustíveis para o país era a premissa básica da produção das refinarias da Petrobras. Através das parcerias, abre-se a possibilidade de um bloco formado por uma refinaria e seu suporte logístico integrado atuar como uma espécie de enclave no Brasil. Ou seja, numa situação extrema, pode importar todo o petróleo, produzir explorando recursos humanos, naturais e materiais brasileiros, e exportar todo o combustível produzido. E isso independentemente da demanda de combustíveis do país, o que pode levar a um encarecimento ainda maior do preço dos derivados de petróleo, sem contar o risco de desabastecimento.

A ANP (Agência Nacional de Petróleo) estima que, caso o Brasil deixe de construir refinarias, como prevê o plano de negócios 2017-2021, aprovado pelo Conselho de Administração em setembro último, a demanda por importação de combustíveis pode subir de 401 mil barris por dia (2015) para 1,1 milhões de barris (2030). Isso considerando que a decisão do suposto futuro sócio da Petrobras seja vender os derivados no mercado brasileiro.

O comentário de Jorge Celestino sobre o impacto para o Brasil do novo modelo de negócio proposto para a área de Refino e Gás da Petrobras foi emblemático: “Para o país, talvez não seja a melhor solução. Mas é a melhor solução para a Petrobras”.

Resta saber o que a atual cúpula da companhia entende por Petrobras. O que se pode afirmar é que, certamente, não a entende como uma peça estratégica para a soberania energética do país, motivo pelo qual o povo brasileiro saiu às ruas na década de 1950, conquistando como resultado a criação da Petrobras.

Parceria com a francesa Total na Exploração e Produção deve se expandir
Ainda nesta egunda-feira, na mesma Rio Oil & Gas, a Petrobras e a petroleira francesa Total assinaram um memorando expandindo a parceria que já existe na Exploração e Produção de Petróleo, mas também adentrando a área de Refino e Gás. Em entrevista coletiva à imprensa, Pedro Parente, presidente da Petrobras, afirmou: “Não é estritamente uma cooperação transacional, o objetivo aqui é dividir riscos e reduzir a necessidade de recursos da empresa. Além disso, nesse momento tão importante trocamos tecnologia, como no caso de Libra”.

Considerando os riscos já assumidos pela Petrobras na exploração do pré-sal e o fato de seu corpo técnico ter desenvolvido a tecnologia mais avançada de exploração em águas profundas e ultra profundas, tudo indica que a intenção de Pedro Parente e a sua equipe é principalmente dividir o lucro dessas operações.

Citando uma vez mais Jorge Celestino, “não pode um país ter uma empresa com 100% do mercado”. Essa frase faria mais sentido se não fosse o próprio Estado o sócio majoritário dessa empresa. Parece que esse é o centro do debate em torno da Petrobras sob o governo Temer: não pode o Estado brasileiro ser o principal beneficiário da renda nacional do petróleo para poder investir em saúde, educação e serviços públicos de qualidade. É preciso dividir com as multinacionais.