Por Joallan Rocha, Salvador(BA)
Senão o mundo, pelo menos a América Latina aguardava com expectativa a realização do plebiscito na Colômbia sobre o Acordo de Paz entre as FARC-EP e o governo. Após 52 anos de conflitos e 4 anos de negociações, ambos os lados chegaram a uma proposta final no dia 23 de agosto de 2016.
O “Acordo Final para o Término do Conflito e a Construção de uma Paz Estável e Duradoura” assinado em uma cerimônia oficial na cidade de Cartagena, em 26 de setembro, obteve o respaldo de vários chefes de Estado e da comunidade internacional, inclusive dos EUA, do FMI, da União Europeia e do Banco Mundial.
No entanto, contrariando todas as pesquisas, o inesperado aconteceu. A vitória do “NÃO”, com uma margem estreita de votos, está provocando um verdadeiro terremoto na situação política do país.
Compareceram às urnas aproximadamente 13 milhões de colombianos, ultrapassando o quórum mínimo de 4,5 milhões de votantes (13% dos eleitores). A abstenção foi de 62%. Mesmo para um país com pouca tradição de participação eleitoral – nas últimas eleições a abstenção alcançou 50% – ela pode ser considerada alta. Foi a maior em 22 anos.
O “NÃO” obteve a vitória com 50,21% (6.426.615) contra 49,78% (6.359.643), uma diferença de apenas 55 mil votos. Mesmo 19 dos 32 estados tendo apoiado o Acordo de Paz, o “NÃO” conseguiu obter a vitória na maioria dos grandes centros urbanos. Entre as principais cidades, apenas em Cali e Bogotá (a capital da Colômbia) o “SIM” obteve a maioria, com 54,27% e 56,07% respectivamente. Nas regiões mais afetadas pelo conflito, venceu o “SIM” ao Acordo de Paz.
Derrotado, governo tenta salvar o Acordo
O atual presidente Juan Manuel Santos foi o grande derrotado nesta jornada. Pretendia com a ratificação do Acordo de Paz recuperar o apoio entre os colombianos. Assim, abriu-se uma séria crise política. O representante do governo nas negociações com as FARC-EP, Humberto de la Calle, colocou seu cargo à disposição e assumiu a responsabilidade pela derrota, em uma clara tentativa de blindar o presidente.
Logo após o anuncio oficial dos resultados, Santos fez um pronunciamento garantindo a continuidade do cessar fogo. Em caráter de emergência convocou um encontro nacional “a todas as forças políticas, em particular as que se manifestaram pelo ‘Não’, para escutá-las e abrir espaços de diálogo para determinar o caminho a seguir” […] vamos decidir entre todos qual é o caminho que devemos tomar para que essa paz seja possível […].Dei instruções ao chefe negociador (Humberto de la Calle) e ao Comissionado de Paz (Sergio Jaramillo) para que viajem amanhã mesmo (segunda-feira) à Havana para manter informados aos negociadores das Farc sobre os resultados deste diálogo político”, afirmou o presidente Santos.
O chamado ao pacto político foi apoiado pelas FARC-EP: “é necessário um pacto político na Colômbia […] nunca mais a utilização das armas na guerra”, afirmou o principal líder da organização, Tymochenko. No entanto, o principal dirigente da oposição, Alvaro Uribe, anunciou que não participará da reunião.
O fortalecimento da ultradireita dirigida por Alvaro Uribe
Sem dúvida, o grande vitorioso nesta jornada eleitoral foi o ex-presidente Alvaro Uribe, atual senador e líder do partido Centro Democrático. Uribe impulsionou a campanha pelo “NÃO” com um discurso anti-FARC denunciando os principais pontos do Acordo de Paz. O ex-presidente, vinculado aos grupos paramilitares e ao narcotráfico, propõe uma renegociação do Acordo de Paz.
Segundo o jornal colombiano El Tiempo, “entre os temas que os uribistas pedem para revisar se encontram a elegibilidade política para os assinalados delitos atrozes”. Quer dizer que os líderes das Farc, alguns dos quais tem processos na jurisdição ordinária por estas faltas, não possam postular-se a cargos de eleição popular, já seja a Presidência, o Congresso, os governos estaduais, as prefeituras, as assembleias estaduais ou as Câmara de vereadores.
A estratégia é a de evitar que as FARC se transformem em partido político e os seus principais dirigentes sejam presos.
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