Por: Adriele Albuquerque, de Porto Alegre, RS.
Soy América Latina: un pueblo sin piernas, pero que camina. (Calle 13)
Nesta semana, o governo federal, na pessoa do Ministro da Educação Mendonça Filho (DEM), nomeado pelo presidente ilegítimo Michel Temer, anunciou uma Medida Provisória (MP) para uma “reforma” no Ensino Médio.
Dentre as modificações que a MP propõe, está a não mais obrigatoriedade do ensino de espanhol nas escolas, o que significa, na prática, a exclusão gradual dessa disciplina dos currículos escolares, e o retorno do ensino de inglês como único – e mais importante.
Para muitos, tal medida pode parecer interessante num primeiro momento. Ora, não é o inglês a língua mais falada no mundo? Não seria ela o suficiente? A essas perguntas, respondemos sem medo: “no” – ou “não”, como queiram.
Qualquer modificação curricular na educação pública pressupõe motivações ideológicas, valores, intencionalidades e relações de poder. Para a área de Linguagens e suas Tecnologias, a relação de ensino e aprendizagem de espanhol tem muito a contribuir.
O espanhol, em sala de aula – ou também fora dela, para além-muros – tem um grande potencial emancipador. A cada gênero textual estudado em uma sala de aula, nasce a possibilidade de fomentar o potencial crítico e interpretativo em nossos alunos, não apenas em língua materna, mas também em estrangeira. A cada aluno que tem contato com o espanhol, língua tão latina quanto a sua, abre-se uma janela para a união da nossa América, a começar pelo despertar do sentimento de ser latinoamericano.
Mas isso faz a Casa Grande temer, não?
Se nossas crianças aprendem a interpretar, é perigoso. Se elas descobrem que podem falar espanhol, já é demais. Mas, se elas descobrem que são latinoamericanas, tendo a possibilidade de se unir a outras crianças também latinoamericanas – tão exploradas e oprimidas quanto elas -, aí a situação fica insustentável para aqueles que necessitam manter a ordem.
A MP do Ensino Médio é aliada do projeto Escola Sem Partido. Afinal, não basta impor sobre os trabalhadores de nosso país um ajuste fiscal monstruoso. É preciso também destruí-los ideologicamente. Se querem nos explorar mais, precisam nos apassivar. Para isso, a escola precisa, necessariamente, perder qualquer potencial crítico que ainda tenha. Nesse caso, o espanhol, enquanto língua estratégica para transformações sociais, é inimigo dos que querem que trabalhemos até morrer.
Sim, o inglês é a língua mais falada no mundo. Sim, queremos que nossas crianças também falem inglês. Mais: o inglês também é uma língua estratégica para grandes lutas internacionais. Mas é perceptível que, atualmente, instrumentalize-se essa língua para a simples tarefa de “conseguir um bom emprego”.
É isso que queremos ensinar em nossas escolas?
Ou ainda: queremos que nossas crianças tenham sua cultura jogada na lata do lixo da história para se tornarem meras reprodutoras da cultura alheia ou global? Queremos submetê-las a eventos como o Helloween norteamericano, vazio de sentido para o nosso povo?
Para nossa emancipação, devemos, ao contrário, valorizar a cultura brasileira; mirar e ver a cultural de nossos irmãos latino-americanos – tão parecida com a nossa – e descobrir festividades indígenas como, por exemplo, o “Día de los muertos” (“Dia dos Mortos”); olhar para a África, e entender que lá também se fala espanhol e inglês.
Mas isso eles não querem. Os herdeiros de Hernán Cortez certamente querem que nos ajoelhemos para o colonizador. A escola deles é aquela que transforma nossos cérebros em salsichas.
Achamos o ensino de inglês importante. Se for emancipador, estamos do mesmo lado. Mas, há que se pesar: se, em poucas horas, estando no Rio Grande do Sul, posso encontrar irmãos argentinos; ou, estando no Acre, num passo, chego ao Peru, ainda mais, queremos o espanhol nas escolas.
Deixem nossas crianças falarem espanhol. Deixem nossas crianças serem latinas.
Foto: Cesar Ogata / SECOM
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