Prendem-se indivíduos, mas empresas corruptoras e fortunas corrompidas continuam intactas

Uma prisão só pode ter sentido se: o acusado representa um risco à sociedade, pode obstaculizar o processo investigativo, ameaçar testemunhas, ou dar fuga ao dinheiro.

Prisão não é vingança nem deveria ser forma de retaliação.

Um corrupto deve acima de tudo devolver o dinheiro roubado e ser impedido de fazer novos roubos.

Entre Marcelo Odebrecht ficar preso alguns anos, ou a sua empresa ser desapropriada pelo interesse público para ressarcir a sociedade e evitar reincidência corruptiva, acho muito melhor a segunda alternativa. Há quem possa achar ambas desejáveis, mas na verdade a primeira opção acaba por encobrir a inexistência de efetivas medidas contra o maior interesse das empresas, o capital.

As empresas corruptoras continuam intactas e até mesmo continuam fazendo negócios com o setor público.

Não é a purgação moral das prisões que vai eliminar a corrupção, mas a desmontagem do esquema de parceria público privada em benefício do lucro.

Eike Batista, Odebrecht, OAS, JBS, só pra falar de algumas empresas, segundo muitas acusações e delações, aparentemente foram sócias em negócios escusos com diferentes governos e partidos ao longo de um esquema de décadas.

Um partido que nasceu se afirmando como “partido sem patrões” ter terminado como o cúmplice traído desses burgueses todos a quem se aliou e beneficiou é o custo final do projeto de conciliação de classes por meio do “desenvolvimentismo” dos campeões nacionais da predação sócio-ambiental.

Faço duas perguntas, no entanto
O que é melhor para a sociedade: a prisão dos proprietários e executivos e políticos envolvidos ou a desapropriação das empresas para o interesse público?

Porque simplesmente não se estabelece a pena de desapropriação para o cometimento de corrupção ativa das empresas?

Dilma começou e Temer aprofunda ainda mais a venda de estatais, especialmente no setor elétrico. Por que não fazer o contrário, e estatizar empresas corruptas?

O punitivismo penal também move um desejo sádico e alimenta uma indústria carcerária. O Brasil tem a terceira população carcerária do mundo num dos piores sistemas penitenciários. A maioria absoluta das mulheres e quase um terço dos homens por crimes ligados a drogas ilícitas. Centenas de milhares permanecem presos sem julgamento. O desrespeito aos direitos mais básicos é a regra de uma sociedade nascida no pelourinho, desenvolvida no pau de arara e aperfeiçoada no tiro de borracha no olho contra manifestantes e na chacina sistemática nas periferias.

O terrível agora é ver a naturalização dessa falta de respeito aos direitos ser usada por alguns como justificativa para apoiar prisões da Lava Jato como a do ex-ministro Mantega.

Ninguém deve ter direitos atacados.

Não havia urgência nesse caso que justificasse alguém ser preso enquanto esperava o resultado de uma cirurgia grave da esposa.

Há evidências enormes dos esquemas de corrupção que alimentaram setores do PT, não tenho dúvida disso. Mas também não resta dúvida do envolvimento de outros partidos.

Prisões midiáticas espetacularizadas de um só dos lados e completa leniência com os Cunhas e Aécios e com toda a lista dos caixas 2 que a base de Temer acabou de tentar anistiar enquanto o sistema de funcionamento das relações das empresas privadas com os estados federal, estaduais e municipais continua sem qualquer alteração são uma atitude política que não visa a corrupção em si, mas apenas uma parte dos envolvidos.

Digamos assim, pra fazer uma analogia final. Se tem dois ou mais grupos de bandidos roubando e rivalizando entre eles e alguém liquida ou põe na cadeia só um dos bandos, pode-se dizer que esse alguém não está pelo fim da bandidagem em geral, mas sim protegendo um dos bandos ao destruir apenas o outro.

Para o fim de todo o esquema de bandidagem contra o dinheiro público deveria haver a denúncia e o indiciamento de todos os bandos e a efetiva punição mais do que qualquer aprisionamento deveria ser a restituição ao interesse social dos capitais envolvidos com a expropriação das empresas e o confisco dos bens de capital e ativos financeiros dos culpados.