As eleições regionais de Berlim e a crise política do governo Merkel

Por Victor Wolfgang Kegel Amal, de Florianópolis, SC

As eleições regionais alemãs que ocorreram neste domingo (18), em Berlim, apresentam um interessante panorama da situação política do país. É importante lembrar que o sistema de governo regional da Alemanha tem o formato parlamentar, diferente do Brasil.

Em primeiro lugar nas eleições ficou o Partido Social Democrata (SDP) com 21.6% dos votos. Na segunda posição ficou a União Democrática Cristã (CDU) de Ângela Merkel com 17.5%. Em terceiro lugar ficou o Partido de Esquerda (Die Linke) com 15.7%. E em quarto lugar, o partido de extrema direita Alternativa para Alemanha (AfD). Alguns elementos da conjuntura política do país devem ser destacados diante deste resultado.

Crise da coalizão CDU-SPD
Desde as eleições gerais de 2014, a Alemanha vem sendo governada por uma coalizão entre a Democracia Cristã e a Social Democracia. Um fato que não é nada novo, dado o protagonismo dos socialdemocratas na aplicação do pacote neoliberal pós-reunificação da Alemanha.

Essa coalizão burguesa vinha conseguindo governar o país sucessivamente de forma muito estável ao longo de mais de duas décadas, sem o crescimento de alternativas radicais à esquerda expressivas. Contudo, as estatísticas mostram que desde a abertura relativa das fronteiras alemãs para a vinda de refugiados em 2015, quando adentraram no país cerca de um milhão e meio de imigrantes, a popularidade do governo reduziu-se drasticamente.

De forma inédita desde a derrota do nazismo, manifestações reacionárias contrárias à entrada de refugiados colocaram dezenas de milhares nas ruas para protestar contra o governo Merkel, considerado por eles excessivamente tolerantes quanto à questão migratória.

Apesar de o SPD manter uma representação legislativa suficiente para formar o governo, a CDU perdeu 7% de votos em relação à eleição anterior, o que vai levar a social democracia a exclui-la da coalisão de governo.

A ascensão da extrema direita
A verdade é que a política de Ângela Merkel (CDU) de abrir as fronteiras da Alemanha para a vinda de refugiados foi uma reação democrática frente à imagem autoritária que a primeira ministra passou a transmitir após a humilhação promovida pela Alemanha contra a Grécia, ao impor-lhe um ajuste fiscal criminoso em 2015. E mais, foi por um curto período de tempo.

Houve grande oposição interna no seu próprio partido para que Merkel fosse mais dura com a questão migratória. Os setores radicalizados do CDU a acusam de estar fazendo o jogo dos socialistas, o que vem gerando uma guerra interna no partido.

De qualquer forma, Merkel estabeleceu há dois meses um acordo com a Turquia para que este país impeça a vinda de mais refugiados do Oriente Médio através de suas fronteiras. Esse acordo é o responsável pelo fato de que cada dia mais famílias morram afogadas nas aguas do mediterrâneo.

Apesar de Merkel estar longe de ter uma política minimamente humanitária rem relação aos refugiados, a extrema direita (AfD) vem se aproveitando do crescimento do sentimento xenofóbico e racista na população para aglutinar em torno de seu partido o setor da sociedade que antes votava no CDU e agora procura uma “alternativa” mais a direita. O fato de que a AfD existe há três anos e que agora, na capital Berlin, conseguiu 14% dos votos, é um sinal de alerta.

Este ano, o partido de extrema direita também conseguiu representação parlamentar inédita em dois estados. Em março, ficou em segundo lugar na eleição regional do estado da Saxonia-Anhalt. Há duas semanas, obteve 21% dos votos no estado de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental.

A socialdemocracia e o crescimento de alternativas à esquerda
Apesar de os socialdemocratas terem ficado em primeiro nas eleições regionais de Berlim, diminuíram em 5% em relação à última eleição. Isso se deve ao desgaste do partido com os movimentos sociais de combate a União Europeia e a política xenofóbica de Ângela Merkel com os refugiados. O partido social democrata compõe a coalisão de governo junto a CDU e, portanto, é visto cada vez mais como parte do problema na atual crise política por parte do eleitorado de esquerda.

Nessas eleições, é importante ressaltar o crescimento de um partido à esquerda da social democracia, chamado singularmente de “A Esquerda” (Die Linke). Este partido surge da unificação das ramificações do antigo Partido Único da Alemanha Oriental, com partidos de esquerda moderados e alguns radicais da ex-Alemanha Ocidental.

Hoje funciona como um partido não centralizado de correntes, inclusive com a participação do grupo trotskista “Alternativa Socialista”. Em relação à eleição berlinense anterior, “A Esquerda” cresceu em quatro pontos percentuais, tornando-se a terceira força política da capital, um fato político inédito para o partido.

A radicalização política na Europa
Apesar de haver diferenças na relação de votos entre a esquerda, extrema esquerda, direita, e extrema direita nos diferentes estados da Alemanha, o resultado na eleição berlinense reflete o contexto geral em que vive a Europa: queda de representatividade dos partidos de centro e moderados; o crescimento de alternativas radicais a esquerda e a direita.

Apesar do avanço de uma esquerda mais radical na Alemanha (Die Linke), o fato político que sobressai é o crescimento acelerado da reacionária AfD. Em comparação, lembremos-nos do crescimento dos nazistas gregos do Aurora Dourada que chegaram a mais de 15% dos votos nas eleições de 2015 na Grécia, quando ganhou o Syriza.

Na Franca, a candidata da extrema direita nacionalista, Marine Le-Pen, é a segunda colocada com 30% das intenções de voto. Na Áustria, a extrema direita também é favorita para as eleições presidenciais deste semestre. A Hungria e Polônia já são governadas por países declaradamente nacionalistas e xenofóbicos.

A Europa vive, talvez, um de seus períodos mais turbulentos desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Tudo é possível. As lutas dos trabalhadores gregos, franceses e tantos outros mostram que a resistência e a vitória são possíveis. Mas é preciso estar alerta. A reação, infelizmente, acompanha a revolução. É hora de cerrar fileiras e cortar o mal pela raiz.