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EDITORIAL

Corbyn e a política britânica

Por Bruno de Matos Sá, de São Paulo, SP

Jeremy Corbyn, um dos poucos parlamentares trabalhistas que se opôs à invasão anglo-americana no Iraque, conseguiu, graças a uma articulação inédita da extrema-esquerda britânica na internet, se eleger, no dia 10 de setembro de 2015, líder do mais antigo partido social-democrata do mundo, o Labour Party (Partido Trabalhista).

Após um ano de consolidação do reformismo radicalizado de Corbyn na base do Labour, a bancada parlamentar, utilizando-se da crise politica aberta pelo Brexit, tenta derrubá-lo.

Sentido seu projeto partidário ameaçado pelas propostas do parlamentar radical, que incluem a estatizações dos trens, do sistema de saúde, o fim das dívidas de estudantes com educação, além de desarmar nuclearmente o Reino Unido de forma unilateral, o aparato do trabalhismo está em crise. A ala direita, que representa o grosso da bancada parlamentar, pode estar prestes a rachar o partido.

Novo momento na política britânica
Segundo o sistema eleitoral britânico, o presidente do partido é, ao mesmo tempo, líder partidário no parlamento e seu futuro candidato à chefia do governo. Em outras palavras, Corbyn acumula muito poder, podendo mudar os rumos concretos do partido trabalhista caso de fato ocorra uma ruptura.

Parlamentar cujo mandato esteve sempre ligado às questões anti-coloniais, como a luta pela libertação dos presos políticos do IRA ou pela vitória da causa Palestina, Corbyn, que nos anos 80 propôs uma moção para que o parlamento britânico reconhecesse o valor histórico e moral de Leon Trotsky, defende que seu partido seja menos institucionalizado, tornando-se em um “movimento social”.

Não por acaso, a bancada parlamentar está em pânico com seu poder partidário. Entre outras medidas, eles organizaram um plebiscito interno no qual cerca de 80% dos parlamentares votaram que não confiam na atual direção. Desde então, os deputados têm tentado derrubar Corbyn por manobras políticas e jurídicas. Todas, até agora, mal sucedidas. A última delas é a realização de uma nova eleição interna no partido, com regras mais restritivas para votação via internet, que se encerrará dia 21 de Setembro.

Corbyn e os trotskistas
Na tentativa de empurrar o partido trabalhista à direita, a burocracia partidária do Labour abriu o processo de seleção interna da direção para todos cidadãos britânicos interessados pela internet, desde que pagassem 3 libras (cerca de 15 reais). Quando viram que havia uma maré de jovens se filiando online para votar no candidato de extrema esquerda, a burocracia entrou em pânico.

Desde então, Tom Watson, um dos parlamentares que ocupa um cargo institucional de coliderança da bancada parlamentar, tem afirmado que seu partido é objeto de uma campanha de entrismo trotskista. Na primeira quinzena d agosto, ele distribuiu um dossiê para a imprensa com acusações contra grupos como o SWP britânico, o Socialist Party e o Workers Power, afirmado que estes partidos estariam, entre outras coisas, organizando “cursos de infiltração para entrar no Labour”, “se juntando à campanha de Corbyn como voluntários” e “se organizando nos núcleos do Momentum para influenciar o trabalhismo”.

Momentum, o grupo surgido em 2015 que organiza o setor Corbynista do partido, tem sido alvo de duros ataques. A raiva à organização tem fundamento político. Mês passado, o grupo conseguiu reunir, apenas em Liverpool, mais de 10.000 pessoas nas ruas para uma atividade de campanha para as novas eleições internas.

A campanha contra o Momentum e os trotskistas, que tem ganhado ares sinistros por conta do apoio da grande imprensa, tem dado errado. Mesmo com regras eleitorais mais restritivas, Corbyn, segundo os resultados das novas primárias do partido, está bem à frente de seu concorrente, Owen Smith.

Momento decisivo 

Inicialmente, a burocracia do aparato trabalhista queria que Corbyn fosse substituído da direção partidária pela parlamentar Angela Eagle, da ala direita do partido. Mas ela foi tão mal na campanha que a direita mudou de estratégia. Frente à avalanche de apoio à esquerda, estão agora propondo Owen Smith, um jovem parlamentar, ex-lobista da indústria farmacêutica, para dirigir o partido.

Smith, por ter se oposto à guerra no Iraque, se apresenta muito mais à esquerda no processo. Porém,  o jovem parlamentar participou da tentativa da bancada parlamentar para derrubar Corbyn. No tema central do desarmamento nuclear, o auto-intitulado “socialista”,  segue a linha histórica social-imperialista de seu partido, que é de apoio à corrida armamentista. Dia 21 de setembro se saberá se Smith, ou Corbyn, irá dirigir o partido.