Sobre vaias, Caetano e Lavillenie

Por: Mateus Ribeiro, de Macaé, RJ

Em 1967 Caetano começava a apresentação de ‘Alegria, Alegria’ sob as vaias de uma parte furiosa da plateia. O ano era de polarização. Tensão no ar. Menos de um minuto e a apresentação do baiano já ganhava a massa que cantava junto com ele sobre casamento e Brigitte Bardot. As vaias na ocasião eram movidas por um sentimento anti-estrangeiro, anti-imperialista. Na confusão e tensão daquela época, identificavam qualquer manifestação cultural estrangeira como expressão do imperialismo. A coitada da guitarra elétrica estava sendo apedrejada. As vaias eram injustas. Sob a regência do maestro, logo se transformaram em aplausos. Uma parte do público gritava “Primeiro lugar” para a canção que havia ficado em quarto no festival.

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No vídeo, Caetano Veloso apresenta ‘Alegria, Algria’, em 1967

Renaud Lavillenie, do atletismo Francês manteve um ar prepotente e arrogante desde o início da competição que consagrou um brasileiro, Thiago Braz, como medalhista de ouro. O semblante parecia expressar um incômodo gigantesco por estar num ambiente frequentado por pessoas para ele “Não dignas de um Estádio Olímpico”, conforme disse em declaração à imprensa, após a prova. Sob condições muito menos adversas que Caetano, deu uma de Sérgio Ricardo. As declarações pós-derrota são carregadas da hipocrisia meritocrática, mascarada de argumentos técnicos. Segundo ele, os atletas não seriam capazes de demonstrar plenamente as habilidades, pois estariam sob condições de pressão por uma plateia indigna.

Não sou nenhum estudioso do atletismo brasileiro e mundial. Mas, não precisa ser um especialista para saber que os países desenvolvidos do capitalismo estimulam e desenvolvem desde a infância e juventude a prática dos mais variados esportes entre a população. Os destacados contam desde cedo com os mais diversos incentivos e patrocínios públicos e privados. Muito diferente das condições tupiniquins.

16/08/16 - Entrevista coletiva de Thiago Braz, medalhista de ouro no salto em altura. Foto: Francisco Medeiros /ME
Thiago Braz questionou vaias ao atleta Francês, mas torcida não perdoou Foto: Francisco Medeiros /ME

Lavillenie usou os recursos que tinha. Thiago usou os dele. É bem possível que a vaia não tenha tido qualquer influência sob o resultado. Thiago Braz já era tido como revelação. Sinceramente, não importa se tiveram qualquer relação. Só o que me importa é que foram justas. Seja para aterrorizar os adversários usando parte dos escassos recursos brasileiros, seja como resposta ao ar de prepotência e arrogância da “finesse” europeia.

Vaias não são corretas ou erradas em si mesmo. Dependem das condições em que são dadas. As desta semana foram mais do que corretas. Foram inevitáveis.

Foto: Augustas Didzgalvis