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TEORIA

Blog Convergência entrevista Gregório Duvivier: “o humor pode ser anárquico e revolucionário”

Na mesma semana de outubro de 2014, na qual foi atacado por um radical de direita no Rio de Janeiro, o artista Gregório Duvivier concedeu uma entrevista exclusiva para o blog Convergência. Nela fala de humor e política, da industria cultural e do conservadorismo na sociedade brasileira. 

Blog Convergência – O “Porta dos fundos” se caracteriza por um humor crítico, muito diferente do que se encontra em outros espaços da indústria cultural brasileira, marcados por um forte preconceito de classe e reprodutores de várias formas de opressão (machismo, homofobia, racismo etc.). Como você enxerga isso?

Gregório Duvivier– Acho que todo humor vem junto com um posicionamento. Você está sempre rindo de algo ou de alguém. Os alvos tradicionais do humor são também os alvos principais da sociedade: mulheres, homossexuais, negros, judeus. É importante sair desse ciclo de repetição e renovar nossas piadas. Os alvos podem ser os mais diversos, a começar pelos poderosos, passando por nós mesmos. A auto-ironia é o primeiro passo para um humor menos preconceituoso, e menos raivoso.

Blog Convergência – Quais as relações entre arte e política na contemporaneidade, em especial no Brasil? É possível pensar ainda a estética surrealista (incorporada pelo “Porta dos fundos”) e o humor político (também presente no programa) como ferramentas de crítica à ordem burguesa?

Gregório Duvivier– Uma piada é uma arma química poderosíssima e, se usada contra a opressão, pode mudar tudo. O humor pode ser anárquico e revolucionário, quando usado de baixo pra cima. Para isso, é importante se desvencilhar dos velhos esquemas de produção. Não dá pra mudar tudo de dentro de uma corporação tão comprometida. Quanto à arte no Brasil, acho que tem de tudo. Muitos artistas evitam se meter com política, o que é compreensível porque a classe política no Brasil é em sua imensa maioria desprezível- mas falta perceber que o posicionamento político é inevitável e não se meter com política é impossível.

Blog Convergência – Como você analisa o atual ambiente cultural brasileiro, em especial no que diz respeito às conexões, outrora tão presentes no país, entre o papel do artista e o do crítico social (vide nomes como Lima Barreto, Graciliano Ramos, Gláuber Rocha, Gianfracesco Guarnieri, Chico Buarque, entre muitos outros). É possível encontrar espaços de produção de uma cultura crítica, antissistêmica, por dentro da “indústria cultural” brasileira?

Gregório Duvivier – Acho que dá para cavar espaços. A indústria é esperta e tem visto que o público não quer mais do mesmo. A internet mostrou para a indústria de entretenimento que o público não está mais interessado nos mesmos velhos produtos repetidos eternamente. A televisão tem duas opções: abrir os olhos e mudar tudo ou tapar os ouvidos e seguir tocando a mesma música, produzindo remakes de novelas dos anos 1970, reciclando piadas da Era do Rádio.

Blog Convergência – Você observa o crescimento do conservadorismo na sociedade brasileira, principalmente entre os setores médios?

Gregório Duvivier – O fato do governo atual estar supostamente mais à esquerda dá a impressão aos conservadores de que existe alguma novidade ou alguma coragem em se dizer de direita. Não há coragem nenhuma em se dizer conservador. O conservador é por definição um medroso. As mudanças que o Brasil está sofrendo, mesmo que muito tardias em relação ao resto do mundo, apavoram muita gente, o mesmo tipo de gente que ficou apavorado com a Lei Áurea e as primeiras legislações trabalhistas. O processo civilizatório no Brasil sempre ocorreu a passos muito lentos, e à revelia de uma classe média ultra-conservadora, ultra-medrosa e com um terrível ódio de classe. Basta lembrar que o golde de 1964 ocorreu com grande aprovação popular.