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BRASIL

Uma primeira opinião sobre o 15 de Março

Por Juary Chagas, de Natal, RN

Creio que o elemento novo mais relevante é o fato de que o 15-M é o primeiro dia nacional de mobilizações desde junho de 2013 que podemos considerar que animou a conjuntura (com uma pauta da classe trabalhadora), ou seja, que coloca a possibilidade de avançar para constituir força social necessária para derrotar uma medida governamental.

Durante ainda o Governo Dilma, as mobilizações contra os efeitos da Copa em 2014, apesar da sua importância e necessidade, apenas marcaram posição.

As mobilizações durante o processo de impeachment de Dilma também em geral bem menores que as mobilizações reacionárias que foram a base do golpe parlamentar. Os atos contra o impeachment na grande maioria tinham um conteúdo pró-governo (o que não unificava o conjunto das organizações e, por isso, foram minguando) e os que se pautaram pelo “Fora todos” foram absolutamente marginais, sua pauta não estava colocada na realidade.

Portanto, o que aconteceu ontem tem muita importância.

Acredito que um dos elementos chave da questão é que, diferentemente dos exemplos anteriores, há uma pauta unitária. E na medida em que estamos numa situação em que nenhuma organização política ou mesmo de frente única da classe trabalhadora consegue representar a maioria dos trabalhadores, penso que um dos elementos que propiciou que as mobilizações de ontem nos encham de esperança é que bem ou mal, com ou sem problemas, foi possível de construir essa unidade.

Mas, a alegria de ter a esperança renovada no dia de ontem deve servir para seguir adiante, não para nos ofuscar. Para derrotar as reformas de Temer vai ser preciso muito mais.

Eles ontem apenas nos observaram e dormiram preocupados. Mas ainda não mostramos força suficiente para obrigá-los a abortar o plano. Para fazer isso os trabalhadores precisam mesmo parar o país.

Por isso, acredito que a aposta que devemos fazer é reforçar a importância da unidade e intensificar as mobilizações. Também é correto exigir das direções (sobretudo as que são majoritárias), mas somente isso não basta.

Porque apesar de haver, evidentemente, acomodação e infelizmente até mesmo uma estratégia de aguardar para que tudo se resolva eleitoralmente, a classe trabalhadora ainda não está a postos. Ela precisa ser mobilizada e ganhar a confiança de que com suas forças pode derrotar os planos desse governo.

Não poderia deixar de falar sobre a presença de Lula nos protestos. Acho que é um fato com o qual não devemos nem comemorar e nem se enraivecer, mas tirar lições.

A primeira lição é que a presença de Lula não mudou o caráter progressivo das manifestações. Foi um dia de luta contra a Reforma da Previdência, contra o Temer e com uma pauta da classe trabalhadora.

É óbvio que é no mínimo uma hipocrisia que o Lula (que fez com suas próprias mãos uma reforma) se apresente como um defensor da Previdência. Mas nós não precisamos concordar com ele, não precisamos utilizar seus argumentos e não só podemos como devemos polemizar sobre a saída que vai garantir derrotar esse ataque: a construção da resistência através da luta e não as esperanças numa alternativa eleitoral e ainda pior se for de conciliação de classes. Ou seja, nossos desacordos estratégicos não devem ser razão para não seguir apostando na unidade, mas, ao contrário, são motivo para seguir disputando os rumos da luta.

A segunda é que muito recentemente vimos muitas dificuldades para realizar ações unitárias ao redor de pontos de consenso. O 8 de março foi um deles. Saiu rachado em várias cidades e os argumentos eram os mesmos: não se pode estar junto com quem faz críticas ou com quem defende alternativas eleitorais para 2018. Mas ontem o Lula (o próprio) estava presente no ato, algo que sequer aconteceu no 8M. E nada impediu de que a luta seguisse sendo feita. Não tomei conhecimento de nenhuma organização que tenha rompido com as mobilizações por esta razão.

A terceira e última é que em meio a tudo isso os projetos políticos em disputa seguirão sendo feitos. Eu, por exemplo, não concordo em nada com o projeto petista de administração do capitalismo. Depois da rasteira que levaram ainda apostam na conciliação de classes não porque “nunca aprendem” (como às vezes escuto de alguns justamente indignados), mas porque esse é o seu projeto. Como não pretendem lutar por um governo dos trabalhadores de fato, apoiado em organizações da classe, mas apenas querem gerenciar via as instituições da democracia burguesa, estão sempre em busca de aliados da burguesia que se “desgarram”.

Como disse, não tenho nenhum acordo com isto, mas os petistas têm o direito de seguir apostando nisso. Assim como nós, os socialistas temos o direito de seguir apostando na construção de uma alternativa independente, de uma saída socialista. Uma Frente de Esquerda Socialista com PSOL, MTST, PSTU, PCB e diversos movimentos sociais. É o que faremos.

Porque é na luta de classes que isso se resolverá. Sem prejuízo ao combate unitário que devemos dar a Temer.

Vamos seguir lutando para que o próximo passo seja superior ao 15-M. E deixe que façam com Lula o que quiserem. A melhor briga contra ele é a briga para ganhar os trabalhadores para o fato de que confiando nas suas próprias forças podem derrotar a Reforma da Previdência e fazer o que mais tiverem vontade.

Foto: Brasil de Fato