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OPRESSÕES

Um sopro de alívio diante da barbárie que é o feminicídio

Por: Sueny Moura e Gizelle Freitas, de Belém, PA

Em 20 de abril de 2015, mais uma mulher foi brutalmente assassinada no Pará. Uma jovem estudante de nutrição da UFPA teve sua vida ceifada em sua própria casa na região metropolitana de Belém. Ela se chamava Ingred Israel, morta com 20 facadas. Segundo o IML, o corpo apresentava sinais de violência sexual1. O assassino? o ex-namorado, que não aceitava o fim do relacionamento e tinha Ingred como sua propriedade, portanto ele, somente ele, poderia dar um fim ao namoro.

No dia 02 de fevereiro de 2017, quase dois anos depois da morte de Ingred Israel, o seu assassino, Antônio Eduardo Souza Nascimento, foi condenado a 40 anos e 6 meses de prisão, em um julgamento que durou mais de 12 horas2. Este caso foi o primeiro no Estado do Pará a ser enquadrado na lei do feminicídio. Na época, havia um pouco mais de um mês que esta lei tinha entrado em vigor e entrará para a história como o primeiro julgamento em que um homem foi condenado por este crime no Pará.

A lei do feminicídio (13.104/2015) alterou o código penal e tipifica como crime hediondo o homicídio de uma mulher pela sua condição de sexo, em razão de violência doméstica/familiar ou por menosprezo ou discriminação à sua condição de mulher3. Assim como a lei Maria da Penha (11.340/2006), a lei do feminicídio representa um avanço na legislação para coibir a violência contra as mulheres é vitória das mulheres na luta contra o machismo. Mas estas não têm sido suficientes para coibir a violência e o assassinato de mulheres no Brasil, conforme demonstram as estatísticas.

O Brasil apresenta a 5º taxa de homicídio de mulheres em uma tabela composta por 83 países no mundo, 4,8% em um grupo de 100 mil mulheres, o que representa 106.093 mulheres assassinadas entre 1980 a 2013. Em apenas uma década (2003-2013), o feminicídio aumentou 21% no Brasil, passando 3.937 em 2003 para 4.762 em 2013. A partir destes dados, estima-se que 13 mulheres foram assassinadas por dia em 2013. O feminicídio no Brasil apresenta um padrão. Dos 4.762 mulheres assassinadas no ano de 2013, mais da metade foram cometidos por familiares, dentre estes, 33,2% foram praticados pelo companheiro ou ex-companheiro em sua própria residência (27,1%)1. O que deveria ser um espaço protetor e acolhedor, o domicílio de uma mulher, mostra-se, na verdade, um local extremamente perigoso.

Segundo o Mapa da Violência de 2015, o Pará é o 10º estado com mais casos de violência contra a mulher. O índice de feminicídios saltou de 2,9% em 2003 para 5,8% em 2013 em um grupo de 100 mil mulheres, representando um aumento 104,2%2. A Polícia Civil do Estado do Pará registrou 26 ocorrências de feminicídio em 2015 e 21 casos somente nos cinco primeiros meses de 2016, quase cinco mortes entre janeiro a maio deste ano3.

Vivemos momentos mais difíceis para os setores oprimidos no Brasil e no Mundo. No Brasil, o governo Temer e o Congresso de corruptos têm realizado ataques brutais, sem precedentes na história, aos direitos sociais, como as reformas da Previdência e a Trabalhista e a PEC 55 que já foi aprovada. Atingem de forma frontal, principalmente, as mulheres trabalhadoras. A eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos representa o avanço de uma ideologia de ódio sobre os setores oprimidos destilados em seus discursos, e concretizados em suas primeiras medidas de governo, mas também é verdade que nós mulheres não estamos vendo o bonde passar de braços cruzados. No dia da posse de Trump seguiram por diversas cidades do mundo gigantescas marchas em forma de protesto. As mulheres têm protagonizado recorrentes primaveras feministas por nossos direitos e por nossas vidas.

Para nós, mulheres localizadas na região Norte, moradoras do estado do Pará, o julgamento e a condenação do primeiro caso de feminicidio foi um sopro de alívio diante da barbárie que é este crime. Infelizmente, segue a tenebrosa realidade onde centenas de mulheres são assassinadas pela violência machista. Continuaremos lutando diariamente para que não precisemos desse recurso jurídico, para que os homens sejam de fato nossos aliados. Mas, enquanto isso, seguiremos firmes combatendo a ideologia machista.

Foto: Vítima de feminicídio no Pará | Reprodução Facebook