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BRASIL

Demissões e desespero de professores na volta às aulas em São Paulo

São os primeiros resultados do ajuste fiscal e da unidade entre Temer e Alckmin contra os direitos sociais dos trabalhadores

Por: Richard Araújo e Eliana Nunes, de São Paulo, SP

No dia 23 de janeiro deu-se início à atribuição de aulas da rede estadual de Ensino do Estado de São Paulo. Este processo, que tem por objetivo distribuir as turmas e aulas para os professores e professoras de acordo com a série, classe ou disciplina, é feito uma semana antes do início do ano letivo.

O resultado da atribuição de 2017 é aterrador. Milhares de desempregados e subempregados de Norte, Sul e Leste a Oeste do estado, muitos destes recém aprovados em concurso público, ou na fase de pré-aposentadoria, profissionais entre vinte a trinta anos no magistério. Os números ainda não estão tabulados, porque as diretorias de ensino se negam a publicizar tais dados ao movimento, mas é possível chegarmos a algumas conclusões do que assistimos em todas as regiões.

No primeiro dia, muitos concursados já tiveram dificuldade de estabelecer suas jornadas de trabalho nas escolas onde estão lotados em seus cargos devido ao fechamento de salas. Isso os obrigou a terem que buscar aulas em outras unidades escolares. Há professores efetivos com aulas em mais de três escolas, situação que provocou um verdadeiro “efeito dominó” na rede.

Apesar da desigualdade de situações em todo o Estado, o caos foi generalizado. Isso significa que milhares de temporários, ou até mesmo profissionais com suposta estabilidade ficaram desempregados, ou em situação de subemprego, na condição de substitutos (“eventuais”), a depender das ausências e afastamentos dos colegas que têm aulas atribuídas para sobreviver. O salário de um estável em aulas de permanência é inferior ao salário mínimo.

O ajuste fiscal de Temer e Alckmin e os impactos na vida dos trabalhadores e trabalhadoras
Os governos do PSDB no estado de São Paulo têm preparado o terreno para as reformas estruturais da economia não é de agora. A mudança na forma de contratação de servidores, prevendo a contratação precária, sem direitos, foi o caminho aberto em 2009, quando o governo do PSDB criou a categoria “O”. Assim, no momento que quisesse demitir, teria as mãos livres para isso, sem o ônus de pagar nenhum direito trabalhista. Tais profissionais são contratados através de processos seletivos sem os direitos estabelecidos aos concursados, ou mesmo pela CLT.

Já em 2015, após a mais longa greve de nossa história, 92 dias, Alckmin contava com a derrota da greve para fazer a reorganização da rede estadual de ensino e fechar um terço da estrutura das escolas e do quadro de funcionários da rede, o que significaria fechar completamente milhares de escolas. No entanto, um levante estudantil terminou aquele ano com Alckmin parcialmente derrotado devido às ocupações de escolas, com um apoio significativo da população que se posicionou contrária a mais este ataque ao direito da juventude negra e periférica, em sua maioria, de ter acesso a uma educação pública, gratuita e de qualidade.

2016: cortes de verbas e fechamento de salas
Já no ano passado, foi possível sentir o impacto do corte de verbas na educação paulista promovido por Alckmin, e também por Dilma, que cortou mais de R$ 14 bi entre e 2015 e 2016. Como resultado, salas fechadas, corte de verbas para manutenção e até papel higiênico e impressoras faltam nas escolas. Isso sem falar no desemprego e arrocho salarial, que atingiu de forma brutal a categoria. Dá para imaginar a situação das escolas com a aprovação da PEC 55, que congela por vinte anos as verbas para a educação?

2017: a reorganização silenciosa, passo para a demissão
A partir de dezembro de 2016, a Secretaria da Educação, junto com as Diretorias Regionais de Ensino, aproveitaram o recesso e as férias docentes para fechar um enorme número de salas. Exterminaram boa parte do ensino noturno e a oferta de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Transferiram muitos alunos para as redes municipais e, em diversos casos, avançaram para as matrículas longes das moradias, ou locais de trabalho dos estudantes da rede estadual.

Não contentes, reduziram o quadro de apoio escolar, cessando a designação de centenas de professores mediadores  – profissionais que atuam na resolução de conflitos, ou problemas de ordem comportamental nas escolas – , professores coordenadores pedagógicos – responsáveis pelo diálogo entre os diversos profissionais de educação para execução do projeto pedagógico das unidades escolares -, e vice-diretores – responsáveis pelo auxílio às demandas administrativas e pedagógicas das escolas. Devolveram-os para as salas de aula, aumentando, assim, a disputa das poucas aulas que sobraram para a distribuição, devido às milhares de salas fechadas no conjunto da rede estadual.

Impressionou o número de professores com mais de 20 anos de magistério, na faixa etária entre 40 e 60 anos, na fase de atribuição dos categoria “F”, considerados estáveis e que recebem por 12 horas-aula semanais. Em diretorias como as de Guarulhos, Zona Sul, Lapa, São Miguel Paulista, Ribeirão Preto, entre outras, poucos conseguiram aulas e ficaram, às vésperas da aposentadoria, com a condição de subempregados. Olhavam perplexos os saldos de disciplinas sendo zerados e os anúncios dos supervisores que vinham aos microfones dispensar os inscritos desta, ou daquela disciplina, com a perspectiva de que voltarão para suas escolas e dependerão dos atrasos ou dos afastamentos médicos, temporários, para ganhar um pouco mais. A sensação era de descrença. Como assim? Ser descartado após anos de dedicação ao magistério?

Estes profissionais que estariam na reta final para se aposentar  – caso escapem da famigerada Reforma da Previdência -, dependem de pegar o maior número possível de aulas para se aposentarem com o salário integral. O cálculo é feito a partir do salário dos últimos 60 meses de contribuição. O chão se abriu sob seus pés. Além da situação de praticamente extinção da “categoria O”, profissionais precários.

O retrato da Atribuição foi a desolação, o desemprego, salas fechadas, e a perspectiva da precarização ainda maior das condições de trabalho, seja com as salas superlotadas, ou com a falta de recursos e condições de trabalho adequadas.

O que aconteceu em São Paulo é a adequação “da casa” aos projetos em curso, ou em nível nacional, o chamado “ajuste fiscal”, terreno pronto para avançar com a Reforma do Ensino Médio, que significará esvaziamento do conteúdo do currículo desta etapa de ensino, além de abrir as portas para a desprofissionalização da categoria, o que agravará a já sucateada situação da escola pública que, há décadas, sofre com cortes no já baixo investimento no setor.

O plano dos poderosos, de Alckmin com a parceria de Temer, é destruir os direitos históricos dos trabalhadores e avançar com a privatização dos serviços públicos. Para o plano dar certo é preciso fazer primeiro uma grande propaganda para ganhar os corações e mentes do povo e tentar desmontar qualquer resistência dos trabalhadores.

Precisamos parar a Reforma da Previdência e derrotar os ataques aos nossos direitos trabalhistas, desenvolver a luta contra o ajuste fiscal a serviço dos interesses dos grandes empresários e banqueiros para defender a educação e demais serviços públicos. Também, organizar desde a base e sindicatos o calendário de greve nacional da educação, rumo à construção da greve geral para derrotar os governos Alckmin e Temer e seus ataques. Para isso, é necessária a mais ampla unidade da categoria com os estudantes e a comunidade escolar, pois todos somos vítimas e sentiremos as consequências do ataque ao direito ao futuro de toda uma geração.

Foto: Blog Humberto Tobé