Pular para o conteúdo
BRASIL

Militares deveriam ficar contra a Reforma da Previdência, junto com o povo

Por: Sargento Amauri Soares, ex-deputado estadual e membro do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes*

Em um debate de praças via rede social, sobre a conjuntura de ataque aos direitos da classe trabalhadora e do povo pobre em geral, um companheiro postulou a seguinte questão: “Qual a saída?” Deste debate, resultou o texto abaixo, que complementei para tornar público:

Saiba-se que estava mais fácil do que se possa imaginar, derrotar a PEC da previdência e seu autor, o temeroso.
Bastava o Bolsonaro não ter negociado com o Temer, negociação que envolveu o voto favorável do referido deputado na PEC 241 para os militares federais ficarem fora dos ataques à previdência.

Depois disso, esta semana, bastava os militares estaduais não estarem correndo atrás dos governistas para negociar alguma aliviada para o lado do militares estaduais, e terem mantido posição radicalmente contrária à PEC da previdência (287), que o governo perderia.

Militares federais e militares estaduais, dos quais alguns se apavonam para dizer que são o braço armado da sociedade, abandonaram o povo à própria sorte, e reiteraram a defesa dos interesses financeiros dos poderosos. O “braço armado da sociedade” abandonou a sociedade aos lobos, para se salvar sozinho.

Também compactuo com a crítica a 90℅ dos sindicalistas, ou mais. Mas, as entidades representativas de militares estaduais, os comandantes gerais, seguindo a pressão de mais de 90℅ da sua base, agiram tal qual o sindicalismo mais amarelo, mais flácido.

Em discursos na Câmara Federal e em vídeos pelas redes sociais, falaram em greve, em guerra, em desmilitarizar, em matar. Mas, foi só o governo tirar os 65 anos de idade para os militares estaduais se aposentarem, mesmo que tenha deixado todas as outras medidas nefastas também para os militares estaduais, e os valentes de antes de 6 de dezembro se recolheram no dia 7 de dezembro.

Daria pra derrubar essa PEC, e também esse governo usurpador e sem legitimidade nenhuma, um capacho completo das corporações monopolistas, os maiores parasitas da humanidade, que são os operadores do sistema financeiro atuando na previdência privada. Eles e todos os grandes empresários, que nunca cumpriram suas obrigações constitucionais com a previdência, e só por isso dizem que é deficitária, porque eles próprios a boicotaram desrespeitando a Constituição, e ainda boicotam, ao dizer, mentirosamente, que é deficitária.

Se as entidades de militares estaduais, oficiais e praças, se os comandantes gerais dissessem que não iria haver repressão contra quem protestasse contra a aprovação da PEC 55 e da PEC 287, Temer, Renan e toda a ratatuia de Brasília, de todos os poderes, teria que fugir às pressas para longe do Brasil. Alguém tem dúvida disso?

Mas, sempre foi mais fácil para os capitães do mato castigarem o seu igual em troca de um casco de pão do que ajudar a derrotar o opressor e acabar com a opressão. A cena de um policial do Choque do Rio de Janeiro usando a janela da torre de uma igreja para atirar contra servidores e servidoras é ilustrativa da barbárie que nossas instituições estão ajudando a construir, ou seja, a barbárie que estamos fazendo com nossas próprias mãos.

Esta cena só deixa ainda mais inexplicável a violência desmedida que a PM do DF praticou no dia 29 de novembro, a de Santa Catarina no final de agosto, a do Rio Grande noutro dia desses, e outros e outros episódios por aí afora, sempre lamentáveis.

E é ilusório tentar salvar a pele de uma ou outra categoria, pois o mesmo governo que aniquila os direitos de todos os civis agora, já avisa que vai tratar do ajuste da previdência dos militares em um segundo momento. Ou seja, o governo está dizendo que vai poupar os militares agora, mantendo coesa a força para massacrar o conjunto do povo, e que, “num segundo momento”, vai fazer o mesmo (ou coisa parecida) também com os militares. Mas, muitos insistem em não ver isso.

A situação ficará insustentável. Depois de aprovada esta PEC da destruição da previdência, a “solução final” contra a Constituição de 1988, não haverá sentido lógico argumentar em defesa da aposentadoria (reserva remunerada) de qualquer militar com menos de 50 anos de idade. Isso levaria muitos militares a alcançarem o direito à aposentadoria antes que seu próprio pai, ou sua própria mãe. É até indigno pensar numa hipótese destas, mas acontecerá, se a PEC 287 for aprovada e se a previdência dos militares continuar como é hoje. Indigno não é o direito do militar, e sim o fato de este naturalizar e se conformar com a extinção do direito de todas as outras pessoas.

E chega de eufemismo! A PEC 287 estabelece que a idade mínima para pedir a aposentadoria será de 65 anos de idade, mas este direito só existirá se houver ao mesmo tempo a contribuição (carteira assinada, ou outra forma de contribuição) por no mínimo 25 anos, e isso só lhe daria uma proporção do valor da remuneração, pois, para receber integral, teria que ter contribuído por 49 anos.

Agricultores e agricultoras, “donas de casa”, domésticas, pescadores, informais, a maioria dos trabalhadores da construção civil, enfim, uma parcela enorme da classe trabalhadora não tem 25 anos de contribuição, e não terá aos 65 anos de idade, nem aos 75 anos de idade, quanto mais 49 anos de contribuição.

E quem vai dar emprego para alguém com mais de 70 anos? Resumindo, uma multidão de pessoas terá trabalhado a vida inteira, por 50 ou 60 anos, e não terá aposentadoria. No máximo, uma proporção do salário mínimo, para os que não morrerem antes, também pela extinção dos serviços públicos de saúde através da PEC 55. A dignidade e mesmo a vida de milhões de pessoas está sendo cruelmente aniquilada pela PEC 287.

Do que vale o militar se livrar, total ou parcialmente, deste drama, se na sua própria família terá uma maioria de desamparados de tudo? Acaso não vai recair sobre sua própria responsabilidade (ou peso na consciência) a sobrevivência de pais, mães, cônjuges, irmãos e irmãs? Sem falar no drama social, que vai se aprofundar, aumentando os índices barbárie e violência.

Repito que seria plenamente possível mudar esse quadro. Bastaria que militares estaduais e federais mantivessem a firme posição de não aceitar a PEC 287, contra nenhuma pessoa! Aliás, o mesmo vale para a PEC 55 e para toda a pauta de regressão social que está sendo imposta. Sim, está sendo imposta, sem ter sido aprovada e nem avaliada pela sociedade em nenhum processo eleitoral, plebiscito ou referendum.

Este pacote de maldades jamais seria aprovado em qualquer consulta à população. Está sendo imposto por um Governo e um Congresso profundamente corrupto e com o uso da força por parte dos militares. Força ilegítima, porque é derivada dos interesses na minoria contra os direitos elementares da maioria.

Para enfrentar esta situação, seria preciso um projeto de sociedade para o país, o que, no momento, nem as organizações populares e nem nossas entidades representativas gerais têm. Aliás, projeto de país? Nem passa pela cabeça das entidades representativas de militares estaduais discutir isso. Está em curso o projeto de aniquilação do nosso país, e causa profundo mal estar aos militares que têm consciência social o fato de que os militares estão sendo usados como força bruta para garantir isso, mesmo sabendo que o projeto é maléfico e ilegítimo.

Este projeto não é necessário! Trata-se de uma imposição do capitalismo em crise, tirando do couro dos povos do mundo a manutenção das taxas de lucro do capital produtivo e um volume ainda maior de espoliação dos povos em benefício do capital parasitário.

Então não é atoa que a solução está difícil, pois a maioria dos mais fortes do nosso campo (servidores bem remunerados, com carreira sólida, com acesso ao conhecimento e à informação, que detém e manejam as armas) só pensam em salvar a própria pele, e nunca se propuseram a discutir um projeto de sociedade para o país. Aí ficam se vendendo até para políticos venais, feito o Temer.

Pobre Povo, que pagou a vida toda, e paga ainda, para ter instituições públicas que não têm nem vergonha de traí-lo da forma mais descarada.

Mas dá para mudar esse quadro, embora isso possa demorar. O povo brasileiro vai ter que fazer uma Constituição nova quando tiver força para isso (e devemos “militar” desde agora para que isso ocorra no menor tempo possível), pois a de 1988, os abutres e canalhas estão desmontando, com a ajuda em armas dos militares.

Uma Saudação a todos os companheiros e companheiras que não concordam com a traição ao povo trabalhador deste imenso e generoso país, país que haveremos de recuperar do abismo de ignomínia no qual está sendo empurrado pela corja sórdida, covarde e mesquinha que nos governa, em todos os poderes.

*Amauri Soares é membro do Polo Comunista Luiz Carlos Prestes. Policial Militar da Reserva