Pular para o conteúdo

François Hollande não será candidato à reeleição

Por: Renato Fernandes, de Campinas, SP 

Em maio de 2012, depois de 5 anos de governo conservador de Nicolas Sarkozy, uma parte da população francesa comemorava a vitória de François Hollande do Partido Socialista nas eleições presidenciais. Ele foi o segundo presidente socialista, chegando ao poder executivo após 17 anos desde que François Mitterrand encerrou um longo período em que esteve à frente do governo França (1981-1995) aplicando uma política neoliberal. Não por acaso, os gritos populares que mais ecoaram com a volta dos socialistas ao governo eram os que enfatizavam muito mais a rejeição a Sarkozy do que a esperança em um novo governo socialista com Hollande. Esse sentimento de desesperança foi confirmado pelo próprio mandato de Hollande, marcado por novos ataques ao nível de vida dos trabalhadores franceses. Sem dúvida, a falta de apoio popular é o que explica sua decisão, inédita na França, de renunciar a concorrer à reeleição.

 

Um governo neoliberal

 

Um dos principais motivos da eleição de Hollande havia sido a rejeição ao programa neoliberal que Sarkozy havia aplicado. As mobilizações de 2010 contra a reforma da previdência, que chegaram a reunir mais de 3 milhões de trabalhadores paralisados, demonstravam um caminho contrário ao desmonte do Estado de bem-estar social que havia sido construído no pós-guerra. Se havia um pouco de esperança em Hollande, esta acabou rapidamente.

A crise de 2008/9 afetou bastante a França, ainda que não no mesmo grau das economias do sul europeu, como Portugal e Espanha, principalmente em relação ao nível de emprego. Hollande fez uma campanha centrada na retomada da economia e do emprego. Entretanto, durante seu governo a retomada da economia foi mínima.

O crescimento francês está estagnado desde 2012, variando entre trimestres de recessão e crescimento bem baixo. O crescimento do PIB em 2015 foi de 1,2% e a previsão de crescimento em 2016 é de 1,3%. Nesses dois anos, a média de crescimento mundial, segundo o FMI, será acima de 3%. A média de crescimento previsto para a França está também abaixo do crescimento projetado para a própria União Europeia.

O desemprego atual é de 10,5% (agosto de 2016), acima do nível de maio de 2012 (9,8%). Soma-se a isso uma grande diferença: os empregos são mais precários e com menos direitos. Para se ter uma ideia, 12,3% dos empregos são em contratos com duração determinada, de aprendizes, estagiários, entre outros tipos de trabalho precários. Antes do período neoliberal, esse tipo de emprego representava 5,3% (1982). Com isso, podemos afirmar que os benefícios sociais dos trabalhadores estão em queda, enquanto que os lucros patronais se aproveitam do crescimento econômico.

O governo de François Hollande foi recheado de ataques sociais com o objetivo de reduzir o déficit fiscal e se adequar às medidas da União Europeia. Entre eles, o aumento dos impostos para o consumo, o que gerou uma alta no custo de vida para a maior parte dos trabalhadores e leis que beneficiaram o patronato como a proposta de redução da contribuição dos patrões para os fundos sociais, a reforma educacional e a reforma trabalhista. Todas elas tiveram um só objetivo: reduzir os “custos” atacando direitos dos trabalhadores com o objetivo de aumentar a lucratividade das empresas.

 

Um Estado policial

 

Combinado a esses ataques aos direitos sociais, o governo do presidente Hollande e do primeiro ministro Manuel Valls utilizaram o estado de emergência para reprimir qualquer resistência aos projetos neoliberais do governo.

Desde os atentados de 13 de novembro de 2015, a França encontra-se em estado de emergência, o que permite ao governo operações especiais contra “possíveis suspeitos” de terrorismo. Esse estado de emergência foi utilizado para reprimir as manifestações contra a reforma trabalhista e gerar um verdadeiro “Estado policial” como denunciam os movimentos sociais.

 

As primárias socialistas

 

Um dos principais motivos de Hollande não disputar as primárias do PS é sua baixa popularidade. Para se ter uma ideia disso, basta dizer que a confiança no presidente francês despencou de 55% em junho de 2012 para 13% em dezembro de 2016. Todas essas medidas neoliberais, a manutenção do desemprego com aumento da precariedade e também a continuação da crise de 2008/9 são a base material para explicar essa renúncia.

O problema do PS é que a rejeição não é apenas a Hollande, mas a todo o partido. Não é à toa que a tendência das pesquisas é colocar os possíveis candidatos do PS em 5º lugar na disputa presidencial: atrás do candidato da direita François Fillon dos Les Républicans, de Marine Le Pen da extrema-direita (Front National), do ex-ministro neoliberal Emmanuel Macron (En Marche) e de Jean-Luc Mélénchon (Parti de Gauche). O declínio do PS, pilar do bipartidarismo francês, parece cada vez mais consolidado.

Será nesse cenário que ocorrerão as primárias socialistas, em janeiro de 2017, que definirão o candidato do partido. Os dois principais candidatos serão o ex-primeiro ministro Manuel Valls (clara continuidade conservadora de Hollande) e o ex-ministro da economia, que se demitiu do governo por divergências, Arnaud Montebourg (com um programa mais próximo ao desenvolvimentismo). Mas, ao que parece, nenhum dos candidatos parecem recolocar o PS como um partido importante nas próximas eleições.

Marcado como:
frança / hollande