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BRASIL

Maconha medicinal: a proibição mata

Rio de Janeiro – Ato em defesa da regulamentação do uso medicinal da maconha, no centro do Rio (Tomaz Silva/Agência Brasil)

Por: Nelson Júnior, de Belo Horizonte, MG e Ítalo Coelho de Alencar, de Fortaleza, CE

Na semana em que se comemora o Dia Nacional pela Legalização da Maconha medicinal, 27 de novembro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou a atualização da lista de substâncias sob controle especial e incluiu medicamentos registrados na Anvisa derivados da Cannabis sativa, popularmente conhecida como maconha, em concentração máxima de 30mg. Um pequeno passo para a Anvisa, mas um avanço enorme para os que lutam pelo fim da estupidez que é a proibição das Drogas no Brasil.

É importante que o movimento pela legalização e descriminalização das drogas comemore, pois é um avanço fundamental para que possamos iniciar outro debate sobre a situação de drogas prescritas e proscritas no Brasil. Na Europa e em outros lugares do mundo, medicamentos à base das substâncias canabidiol (CBD) e tetrahidrocannabinol (THC) presentes na maconha já são comercializados e ajudam no tratamento de muitos pacientes, apresentando resultados com significância clínica e melhoras na vida dessas pessoas.

Apesar de ter sido uma importante conquista, no que se refere ao tema da legalização das drogas e sua relação com a saúde, o que motivou a permissão do registro no Brasil foi a fase final de registro do Mevatyl ®. Este medicamento está indicado para o tratamento de sintomas de pacientes adultos com espasticidade moderada a grave devido à esclerose múltipla e será comercializado conforme regras para medicamentos entorpecentes e psicotrópicos, conforme site da Agência.

Ou seja, além da demanda por tratamentos a determinados casos onde as substâncias presentes na maconha demonstraram importância para os tratamentos, existe uma pressão importante das indústrias farmacêuticas querendo abarcar mais um mercado. Isso é tão verdade que pouco tempo após a Anvisa noticiar a permissão de registro, mais 11 produtos à base de canabidiol e outros derivados da Cannabis sativa podem ser importados de forma mais ágil e serão anexados à RDC 17/2015.

Nesta mesma semana, a juíza Lídia Maria Sodré de Moraes, do 1º Juizado Especial Criminal do Rio de Janeiro, concedeu habeas corpus para evitar que um casal seja preso por cultivar maconha em sua residência na capital fluminense. A planta é usada no tratamento médico da filha do casal, que possui Síndrome de Rett, condição que causa problemas neurológicos, principalmente nas funções motora e intelectual e acomete principalmente crianças do sexo feminino na proporção de 1 a cada 15 mil nascimentos. A síndrome é considerada um dos tipos mais graves de autismo. Esta decisão é uma prova de que é necessária a legalização de toda a cadeia de produção da Maconha, para que, a depender da necessidade de cada pessoa ou grupo familiar, possa ter a planta em seu quintal, de maneira barata e natural, sem ser vítima da sanha de lucros da indústria farmacêutica.

Manifestação pela legalização medicinal da maconha, no Rio de Janeiro, RJ Foto: Facebook Renato Cinco
Manifestação pela legalização medicinal da maconha, no Rio de Janeiro, RJ Foto: Facebook Renato Cinco

O registro, a quebra de patentes e a produção estatal de Maconha, em casos em que o cultivo caseiro ou cooperativas de cultivo (exemplo do Uruguai) não dã conta da demanda, para o consumo in natura ou medicamentos à base do THC, CBD ou qualquer outro dos mais de 400 componentes desta planta, seriam passos importantes para que o Brasil assumisse de fato o tratamento de epilepsias de difícil controle, esclerose múltipla, espasticidade, dor neuropática, depressão, ansiedade, esquizofrenia e outras diversas condições.

A proibição do consumo de Maconha é uma medida que tem origem racista, na década de 1830, no Rio de Janeiro, visto que seu intuito era proibir os hábitos dos negros filhos de escravos, como a capoeira, o samba e o ‘pito do pango’ (fumar maconha), para que o Estado tivesse um controle eficaz sobre os mesmos. Tal medida tem como resultado um aumento do encarceramento em massa destas populações, ao passo que só gerou mais violência e, ao contrário do que se pensa, não diminuiu o consumo. Sem falar do atraso científico e industrial, além de pesquisas com esta planta que tem tantas potencialidades.

Tramita no Supremo Tribunal Federal um recurso que pode descriminalizar o porte de Maconha. O processo está suspenso, depois do pedido de vista do Ministro Teori Zavascki, mas já tem três votos favoráveis. Em seu voto o Ministro Luis Barroso se pronunciou no sentido de permitir o cultivo de seis pés da planta fêmea. Cabe ao Supremo fazer este processo andar para que tenhamos mais este avanço.

É fundamental que os movimentos sociais e as pessoas favoráveis à legalização da Maconha medicinal ‘saiam do armário’, como estão fazendo as mães e pais de crianças portadoras de diversas doenças seríssimas que têm apenas nesta planta a esperança de uma vida digna e feliz. As Marchas da Maconha estão aumentando a cada dia, mas não basta. É preciso levar este debate aos locais de trabalho, estudo. É a vida das pessoas que está em jogo. Com isto, não se brinca!