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EDITORIAL

As primárias da direita francesa e as mudanças no tabuleiro político mundial

Por: Renato Fernandes, de Campinas, SP

Um furacão percorre a ordem neoliberal mundial. A vitória de Donald Trump nas eleições norte-americanas e do Brexit na Inglaterra parece dar sinais de novos caminhos para reorganizar a ordem imperialista. Essas votações demonstraram uma tremenda insatisfação de grandes setores da população desses países com a forma como se organizou essa ordem neoliberal. Sem dúvida alguma, o Brexit e a vitória de Trump reforçam os setores políticos burgueses protecionistas, contrários à União Europeia, e que expressam os setores mais reacionários, anti-imigrantes e conservadores. É no marco desse furacão que ocorrerão as eleições francesas, em maio de 2017.

Nesse momento, na França, os principais partidos estão se organizando para a batalha eleitoral. Tanto na direita, quanto na esquerda governista – o Partido Socialista (PS) –  estão sendo organizadas primárias para escolher os candidatos.

As primárias do centro e da direita
Nos próximos dias 20 e 27 de novembro, os franceses poderão escolher quem será o candidato que representará a direita clássica. Essas primárias são organizadas por Les Républicains (LR), partido que mais governou a França, com figuras como Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy, através do Mouvement Démocrate (MoDem), partido de centro-direita, entre outras forças.

Assim como nos EUA, as primárias francesas da direita tiveram debate ao vivo na televisão e entrevistas nos principais jornais. A disputa entre os sete candidatos será acirrada. Dentre eles, se encontra o ex-presidente Sarkozy e Alain Juppé, prefeito de Bordeaux, ambos de LR.

Segundo uma sondagem recente, Juppé ganharia o primeiro turno com 39%, contra 27% de Sarkozy, enquanto o terceiro, François Fillon (ex-primeiro ministro de Sarkozy) está com 15%. No segundo turno das primárias, Juppé ganharia facilmente de Sarkozy com 61% contra 39%.

Apesar de serem do mesmo partido, a estratégia de fazer uma primária que reúne os partidos de centro e da direita favorece a Juppé, já que Sarkozy ganharia se contasse somente com os votos dos simpatizantes do LR. O líder do MoDem, François Bayrou, já disse que se Sarkozy levar as primárias, ele sairá como candidato às presidenciais. Bayrou foi candidato em 2007 e 2012. Em 2012, teve 9,13% dos votos. Nas sondagens atuais, com Sarkozy candidato por LR, Bayrou teria aproximadamente 12,5%, ficando em 5º lugar. É estimada que a participação será entre 2,6 a 3 milhões de eleitores nas primárias da direita. Isso significa aproximadamente 6 a 7% do número total de eleitores.

As diferenças entre Sarkozy e Juppé, no geral, não são muito grandes em termos de política econômica, política europeia, ou de imigração. A grande diferença, na verdade, é que seus discursos refletem ‘matizes’ diferentes da própria política imperialista francesa. Em certo sentido, o discurso de Sarkozy assume um caráter ‘populista’ de direita, pois ele se coloca como o candidato da “maioria silenciosa”, os “esquecidos pelo poder”, ou dos que recusam o pensamento único e querem debater “os perigos que ameaçam a nação”, como imigração, livre comércio, entre outras coisas.

Se temos em Juppé um candidato da direita clássica, pró-europeia, conservadora, temos nessa ‘reedição’ de Sarkozy um candidato populista, de demagogia nacionalista e com aproximações com a extrema-direita. Essas ‘pequenas’ diferenças se conectam às próprias diferenças que os distintos setores da burguesia parecem estar tomando no terreno internacional, ainda que o próprio discurso demagógico de Sarkozy esteja relacionado ao crescimento e à busca do eleitorado da extrema-direita.

Marine Le Pen, a candidata da extrema-direita
Le Pen é talvez a figura da extrema-direita mais conhecida na Europa. Ela faz parte do Front National (FN), partido de extrema-direita da França que, em 2002, chegou a disputar o segundo turno. Le Pen é uma conservadora em relação a temas como casamento igualitário e imigração. Defende também a saída da França da União Europeia, isto é, um ‘Frexit’.

Em 2012, quando foi candidata, Le Pen ficou em terceiro lugar com 17,9% dos votos. Ficou atrás de Sarkozy (27,18%) e do atual presidente Hollande (28,63%). Desde então, ela adotou uma estratégia de promoção da sua própria imagem frente aos principais conflitos nacionais e internacionais. Foi uma das primeiras a saudar o Brexit e também a saudar a atual vitória de Donald Trump. Em sua estratégia política, racista e xenófoba, essas foram vitórias importantes que fortalecem sua candidatura.

Dependendo de quem for o candidato da direita, Le Pen pode até ganhar o primeiro turno das eleições: contra Sarkozy, ela ganharia de 25% a 23%; contra Juppé, ele ganharia de Le Pen de 35% a 27%. Já no segundo turno, tanto Sarkozy (58% a 42%), quanto Juppé (68% a 32%), ganhariam de Le Pen.

Um quadro de incertezas
O Brexit e a vitória de Trump parecem ser movimentos de reorganização da ordem neoliberal. De toda forma, é muito cedo para predizer qualquer coisa sobre as eleições francesas. É necessário esperar para ver os impactos que essas políticas terão na reorganização da burguesia internacional e os efeitos na consciência das massas francesas. Nunca é demais lembrar que a classe trabalhadora francesa lutou muito contra as políticas neoliberais aplicadas pelo governo Hollande.

O tempo não parece jogar a favor de Sarkozy. As primárias da direita e do centro acontecerão nesse mês. É difícil prever, mas nos parece que os efeitos dessa reorganização burguesa internacional não mudarão as sondagens das primárias. Mas, é bom ter presente que todos aqueles que acreditaram nas sondagens do Brexit e das eleições americanas, afundaram junto com os setores políticos burgueses perdedores.

Marcado como:
frança / le pen