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A História absolve quem resiste

18/10/2016- São Paulo- SP, Brasil- O ex-presidenre Lula conversa com o governador do Acre, Tião Viana (PT-AC) e Joao Paulo, dirigente do MST. Foto: Ricardo Stuckert

Matheus Gomes

Deputado estadual pelo PSOL no Rio Grande do Sul, Matheus Gomes é historiador, servidor do IBGE e ativista do movimento social há mais de 10 anos. Sua coluna mostra a visão de um jovem negro e marxista sobre temas da política nacional e internacional, especialmente dos povos da diáspora africana.

Por: Matheus Gomes, colunista do Esquerda Online

Lula escreveu um artigo na Folha de São Paulo intitulado “Por que querem me condenar”. Na minha humilde opinião, são linhas que atestam a derrota, ‘pelo que diz e não diz’.

O ex-presidente pede a absolvição da História, remetendo ao discurso de Fidel Castro. Este incentivou, desde a prisão em 1953, um intenso movimento popular que foi o responsável pela sua libertação e depois veio a alçá-lo como líder da primeira revolução socialista vitoriosa da América Latina. Seu discurso consagrado foi impresso clandestinamente e virou leitura obrigatória daqueles que almejavam derrotar o regime de Fulgêncio Batista.

Ao que tudo indica, pela ferocidade da empreitada burguesa, Lula está na iminência de ser preso. Entretanto, nas linhas publicadas pela FSP, prefere pedir indulgência, clamando sua inocência da mesma forma que governou, sem convocar a mobilização e a organização popular.

É fato que milhares de ativistas comovem-se com suas palavras. Seja pela história como líder operário, ou pela lembrança do período de crescimento econômico, o lulismo ainda tem peso. Já o petismo, que é bem diferente do “ismo” anterior, também não está morto. O partido ainda tem base social, estrutura de quadros, aparato e influência nos movimentos sociais, mesmo que esteja diante de um declínio histórico irreversível. Mas, Lula quer apenas comoção, não parece ter interesse que este sentimento transforme-se em pertubação à ordem. E a direção do PT, fiel ao líder, segue o mesmo caminho.

O discurso de Lula, que sempre se apresentará como liderança dos trabalhadores, não tem relação com as necessidades da classe e me parece ser incapaz de recompor sua antiga base social. Vejamos o cenário: Temer e seus aliados avançam esfomeados pelos nossos direitos, com a PEC 241, privatização do pré-sal, MP do Ensino Médio, Reforma Trabalhista e Previdenciária, militarização nas favelas, entre outros. Já o PT amarga uma intensa derrota eleitoral, caiu de 72 para 39 prefeituras, para ficarmos apenas num dado, o que demonstra a ampliação da fragilidade em seu terreno estratégico.

Só que a carta não contém uma linha de autocrítica. O PT não fez nada de errado em 13 anos de governo? Aliar-se aos seus algozes não deixou uma lição sequer? Repetir a fórmula já aplicada é a estratégia?

Por isso, a situação interna do PT é cada vez mais insustentável, como mostra a disputa duríssima em torno da realização, ou não, de um Congresso com poderes amplos para reorganizar direção e programa, que pode levar ao racha do partido nos próximos meses. Raul Pont (Democracia Socialista/Mensagem ao Partido) já afirmou que uma saída organizada pode ser o caminho.Valter Pomar (Articulação de Esquerda), afirma que é mudar o PT, ou ser destruído pela direita, não vê perspectivas fora da organização e sugere que tais mudanças internas poderiam ser feitas no decorrer de outro momento histórico e por outra geração que adentrar as fileiras do partido. Trata-se do debate público entre lideranças históricas da ala-esquerda do partido, não é um embate qualquer.

Creio que para enfrentar as arbitrariedades jurídicas que atingem não apenas Lula, mas o conjunto dos movimentos sociais, aliás, é parte de uma ofensiva existente desde Junho de 2013 sob o comando de José Eduardo Cardozo, e a retirada dos nossos direitos históricos que desestruturarão os pilares da Constituição de 1988, as nossas estratégia e táticas devem ser opostas pelo vértice às que o PT estabeleceu nos últimos anos.

Diferente do que Lula afirmou num discurso anterior, não desejo que a nossa geração pense ser possível mudar o Brasil, país marcado estruturalmente por 388 anos de escravidão e colonialismo, sem transformações revolucionárias e a subversão da ordem capitalista. Entendo que a resistência passa por radicalizar as ações, o programa e construir relações políticas sólidas com o povo negro, jovem e trabalhador, prezando firmemente pela nossa independência.

Precisamos saber quem são os nossos verdadeiros aliados. Caso contrário, a História será implacável e os retrocessos que agora se apresentam serão só o começo.

Foto: Ex-presidenre Lula conversa com o governador do Acre, Tião Viana (PT-AC) e Joao Paulo, dirigente do MST | Ricardo Stuckert