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Ir além do lulismo é possível

Valerio Arcary

Professor titular aposentado do IFSP. Doutor em História pela USP. Militante trotskista desde a Revolução dos Cravos. Autor de diversos livros, entre eles Ninguém disse que seria fácil (2022), pela editora Boitempo.

Por: Valerio Arcary, colunista do Esquerda Online

As eleições fortaleceram, evidentemente, o governo Temer.
Nos últimos três dias a Bovespa celebrou a vitória.
A classe dominante comemora com os seus partidos. Devem ter aberto muitas garrafas do melhor champanhe, do whisky mais envelhecido.

A burguesia começou a sonhar alto com 2018, mais confiante de que, quem sabe, mesmo com o ajuste cruel, possa ter partidos viáveis e candidatos competitivos.

Mas, pelo menos temos uma compensação.

Agora já sabemos, também, que é possível para a esquerda socialista ir além do PT e Lulismo. A passagem de Freixo para o segundo turno provou que o PT não tem mais o monopólio da representação da esquerda.

A eleição dos vereadores nas capitais provou também: em Porto Alegre o PT elegeu quatro e o Psol três; em BH o PT elegeu dois e o Psol dois; no Rio o Psol elegeu seis, e o PT dois; em Belém o Psol elegeu três e o PT um; em Salvador o PT elegeu dois e o Psol um; em São Paulo o PT elegeu nove (com Suplicy puxando) e o Psol elegeu dois; e por aí vai nas grandes cidades.

Há um imenso caminho, mas é possível. Há imensa grandeza, e boas razões para aqueles que apoiaram Freixo estarem orgulhosos pela luta travada no Rio de Janeiro. Mas, o caminho ainda é muito grande porque triunfos eleitorais, sem séria implantação estrutural na classe trabalhadora, e nos movimentos de mulheres, negros, juventude, entre outros, o que exige a participação nas lutas, a formação de lideranças, o fortalecimento da organização de base, são somente ilusões, que terão, inevitável e, tragicamente, um final lamentável como o da direção do PT: adaptação.

Não adianta mudar as lideranças e permanecer com a mesma estratégia, e há o peso da inércia.

Não adianta querer ganhar a qualquer preço.

O mais importante até o final do segundo turno é reconquistar para um projeto de esquerda socialista os milhões de votos da classe trabalhadora e do povo que foram para outros candidatos, ou que não foram votar, ou que votaram nulo e branco.

O mais importante é organizar milhares de militantes para as atividades das próximas três semanas. Se o fizermos seremos vitoriosos, mesmo que não seja nas urnas.

Ficou provado no Rio de Janeiro que não era verdade a terrível profecia de que depois do lulismo seria o “abismo”.

Que com a crise do petismo seria tão grande a desmoralização que a esquerda socialista teria que esperar o espaço de uma geração, vinte cinco ou até trinta anos, para sair da marginalidade.

Em São Paulo o PT fez aliança com Maluf em 2012 e com Chalita agora.

No Rio, a campanha de Freixo enfrentou de frente todas as candidaturas da direita: Crivella, Pedro Paulo, Osório, Bolsonaro, entre outros.

Em São Paulo, o PT fez eixo na defesa de uma gestão moderna, técnica, contemporânea, com soluções práticas. Tentou esquecer Junho de 2013, o aumento das passagens, a violência da repressão, a cumplicidade com Alckmin, a incapacidade de organizar alguma iniciativa, quando aos domingos a onda reacionária verde-amarela tomou a Paulista, fingiu que não havia um golpe parlamentar por trás do impeachment de Dilma Rousseff.

E ficou tão acuado que nem levou Lula à TV para se defender, quando tinha tempo de sobra. Na boa, isso não foi muito corajoso. Uma covardia.

No Rio, a campanha da Frente de Esquerda fez comícios de rua espetaculares, como há muitos anos não se via, nacionalizou o debate, celebrou a participação popular, inflamou a militância com a paixão de uma esperança, denunciou o Temer, o golpe parlamentar, as alianças espúrias da maioria da esquerda com Cabral e Pezão.

Em São Paulo, o PT apelou ao voto útil convencido que, mesmo depois de todos os escândalos, depois da recessão imposta por Dima e Levy, depois do desemprego chegar aos doze milhões, o voto operário e popular nas periferias iria permanecer fiel ao apelo contra o mal maior.

No Rio, Freixo não cedeu às pressões de Jandira, e foi para cima de todos os reacionários dizendo com todas as letras que não se pode governar para todos.

E declarou, incontáveis vezes, de que lado estava: do lado dos trabalhadores e do povo. Denunciou as milícias, a violência tanto da PM, como do crime organizado, explicou porque privatizações não resolvem, mas agravam os problemas de gestão, e defendeu a escola, a saúde e os transportes públicos.

A conclusão é simples: ficou provado que é possível para a esquerda socialista ir além do petismo e lulismo. O imenso significado da ida de Freixo para o segundo turno é esse. Quem não compreender a grandeza desta façanha sofre de uma miopia incorrigível.

Foto: Reprodução Facebook