O tema racial não é um ‘recorte’

Por: Gleide Davis, colunista do Esquerda Online

Quando pensamos no programa e nas práticas socialistas dentro das organizações da esquerda revolucionária, vemos em mente o debate que a priori deve se ater às teorias dos grande sociólogos marxistas e de como devemos interligar estas teorias com a realidade concreta e conjuntura atual da nossa sociedade.

Na prática, as organizações de esquerda tem como debate inicial, o tema de classes e de como a realidade econômica do indivíduo interfere nas suas atitudes, é a classe social quem determina o seu nível educacional, o seu conceito de moral e valores, e o modo como você vai ser visto e respeitado socialmente via de regras. Entretanto, devemos pensar que a luta de classes nos países colonizados começa a partir de um olhar negro, começa portanto, a partir da escravidão e por conseguinte do racismo.

Primeiramente, é necessário que façamos a separação do que é o racismo hoje e que não foi o racismo o propulsor da escravidão, mas o oposto. A escravidão é uma forma antiga de se criar monopólios, e sim, em África também existiu escravidão, porém, ao contrário do que ocorrera no Brasil, Estados Unidos e afins, a escravidão em África não gerava lucratividade e nem era um meio de produção, e a condição humana dos escravizados não lhes eram negados. A escravidão começa a priori por xenofobia, o eurocentrismo acreditava portanto que aqueles seres não eram civilizados, pois a sua cultura, suas vestes e a sua comunicação eram tipicamente “animalescas”. Uma das principais características do escravismo brasileiro, era a rebeldia de seus escravizados, mulheres matavam seus filhos, abortavam quando podiam, se suicidavam, alguns matavam seus senhores, se rebelavam e por fim, se organizavam em quilombos. Portanto, podemos afirmar categoricamente que as organizações escravocratas eram sem sombra de dúvidas, movimentações “trabalhistas”, mesmo que a estes nenhum direito de trabalho, nem mesmo pagamento fosse concedido.

Hoje, a mão de obra que mais trabalha e que é menos remunerada, é a negra. Qualquer estatística de mercado confirma que existe uma hierarquia de gênero e raça no Brasil no que diz respeito à salários e qualidade de vida, tendo as mulheres negras em último lugar em ambos aspectos e sendo em sua grande maioria, chefes das famílias mais pobres da sociedade. As mulheres e homens negros ainda estão alocados nas grandes periferias urbanas, com péssimas condições de moradia e estando em grandes números nos dados de desemprego, as mulheres negras que quando mães estão em maior número nos dados de mãe solteira, não conseguem sustentar a rotina de trabalho e estudo por falta de amparo estatal para uma educação integral de seus filhos, e entre desistir de estudar e/ou trabalhar, os sustento sempre falará mais alto, fazendo com que essas mulheres não consigam realizar seus estudos ou demorem muitos mais anos para isso.

Temos portanto, que absolver a ideia de que falar de classe é intrinsecamente falar de raça, é impossível realizar a separação de temas ou tratar a questão racial como recorte, não existe a possibilidade de anexarmos a questão de raça na luta de classes, porque a luta de classes no Brasil começa pela luta da libertação de negras e negros, pela luta das primeiras organizações de trabalhadores que exigiam ser tratados como gente, que exigiam que fossem construídos direitos para aqueles que enriqueciam o que era portanto a primeira classe burguesa do país.

A classe trabalhadora é negra, e essa é a que mais tem resistido desde o início da colonização do pais, não há como discordar quando dizemos que “A revolução socialista será negra ou não será”